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17 DE OUTUBRO DE 1990 15

Alberto Martins, gostaria de insistir nela, uma vez que o Sr. Deputado evitou-a, ou melhor, ladeou-a e fugiu-lhe frontalmente.

De facto, o que é que o Sr. Deputado pensa das «queixas» apresentadas pelo Sr. Presidente da República, que se manifestou no sentido de que deveria ser consultado em matéria de política externa e de defesa nacional?

É claro que não podemos esquecer a prática constitucional anterior, segundo a qual o Presidente da República intervinha nestas matérias, certamente com uma palavra muito decisiva.

Assim, o que é que o Sr. Deputado Duarte Lima pensa da prática do Governo neste sentido e como é que avalia as queixas formuladas pelo Sr. Presidente da República e pelo candidato Mário Soares em duas conferências de imprensa que já produziu exactamente sobre essa matéria?

Quanto à questão do valor da estabilidade, devo dizer que, de facto, a estabilidade não é tudo. Sei que o senhor pensa desta maneira, ou seja, em seu entender, a estabilidade não é tudo,...

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - É preciso estabilidade e bom governo.

O Orador: -... até porque tivemos já grandes estabilidades sobre o País, contra o País e contra a vontade nacional. Portanto, não é tudo!

Mas falando de estabilidade e partindo desse princípio, concordo com o Sr. Deputado quando diz que a estabilidade não é tudo e que há outros valores, mas então pergunto se em democracia uma das principais estabilidades que se deve procurar não é a estabilidade constitucional. Não se deve, então, pelo menos nos períodos que vão de uma revisão à outra revisão da Constituição, procurar evitar-se que a Constituição seja posta em causa?

Neste sentido, e a esta luz, como é que o Sr. Deputado explica as propostas do Sr. Primeiro-Ministro relativamente à legislação autárquica, que, como bem sabe, estiveram em discussão na última revisão da Constituição, sendo uma parte delas só dirimíveis em sede de revisão constitucional, que só ocorrerá daqui por quatro anos? Como é que explica que em relação a uma matéria que não é urgente-porque só haverá novas eleições para as autarquias locais daqui por três anos - o Governo tenha resolvido, a menos de um ano da entrada em vigor da actual Constituição, lançar um processo que é claramente de desestabilização constitucional?

Portanto, onde é que está esse valor da estabilidade? Será que ele só existe quando serve o interesse do PSD, ou é realmente um valor?

Creio que esta iniciativa do Governo, como outras, aliás, desmentem essa crença tão grande na estabilidade.

Vozes do PCP:-Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, agradecer as questões que me colocaram, que são, em grande parte, sobretudo no que toca às presidenciais, comuns.

Começo pela observação feita pelo Sr. Deputado Alberto Martins, relativa ao facto de eu desconhecer aquela panóplia de ideias, de projectos, de dinamismos e de capacidade de acção que tem o Dr. Jorge Sampaio. Bom, se tem, não se está a ver!

Efectivamente, o Dr. Jorge Sampaio parece ter muitas ideias mas guarda-as, entesoura-as; tem muita capacidade de decisão mas guarda-a, entesoura-a - Eça de Queiroz classificava um seu personagem de vara intelectual porque se encontrava numa situação semelhante à que o Dr. Jorge Sampaio se encontra hoje.

Se o Sr. Dr. Jorge Sampaio tem tudo isto, não o vemos, mas estamos à espera de ver. A única coisa que vemos todos os dias, relativamente à Câmara Municipal de Lisboa, é que o caos urbanístico continua e o único risco que o Sr. Presidente da Câmara Municipal corre neste momento é o de tropeçar nessas imensas bichas que vemos por toda a cidade.

Quanto às presidenciais, o Sr. Deputado Alberto Martins diz que passei ao lado do tema. Não, Sr. Deputado, não passei ao lado do tema, aliás abordei-o expressamente.

Conheço a questão das competências presidenciais, das competências constitucionais do Presidente, como V. Ex.a, e esta resposta serve também para o Sr. Deputado Carlos Brito.

As competências do Sr. Presidente da República, como de resto as dos outros órgãos de soberania, estão traçadas na Constituição com muita clareza. É sabido por todos que houve em duas matérias relevantes, como são a política externa, e a de defesa nacional, alterações qualitativas em alguns domínios, em 1982, particularmente na política externa em que o Presidente deixou de ter competência para, por exemplo, assinar convenções internacionais. Em 1982, um conjunto de domínios foram claramente retirados daquilo que era o acervo de poderes do Presidente da República - e isto, lembro, com o apoio do Partido Socialista - e hoje temos de fazer a interpretação dos poderes presidenciais à luz dessa revisão.

Obviamente, aquilo que o Sr. Presidente disse foi muito claro. Disse: «O quadro de referências em que vou actuar, se for eleito, é o quadro constitucional; os poderes que tenho chegam-me, bastam-me. Agora, desejava mais isto...». Sr. Deputado, é um desejo do Sr. Presidente da República! Quer V. Ex.a, Sr. Deputado Alberto Martins, que o Sr. Presidente da República não tenha desejos!? Por amor de Deus!... Nada temos a obstar a que o Sr. Presidente da República tenha desejos, mas, como sabe, em matéria de competência constitucional, aquilo a que estamos obrigados não é aos desejos de quem quer que seja, de nenhum agente político, mas à força da Constituição. E lembro que a Constituição tem uma força normativa específica, própria, força normativa essa que impede, como ensinam o Dr. Vital Moreira e o Prof. Gomes Canotilho, que em Portugal se possa fazer uma interpretação ou uma extensão dos poderes, mais correctamente, um aumento ou um desenvolvimento dos poderes do Presidente da República por via interpretativa, de resto, como existe e como é possível na doutrina constitucional americana. Assim, não é possível entender a teoria dos poderes inerentes como é entendida no direito americano e interpretá-la à luz da nossa Constituição, que tem uma força normativa especial...

O Sr. Alberto Martins (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Só um momento, Sr. Deputado. Deixe--me só concluir o meu raciocínio.