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14 DE NOVEMBRO DE 1990 309

O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Reitores, Srs. Membros do Governo, Srs. Professores e Estudantes, Srs. Deputados: Muitos parabéns! Em nome do Grupo Parlamentar Socialista, apresento votos de feliz aniversário, não só a todos os universitários, como também a todos os portugueses, pelas universidades que são as suas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A bela idade de 700 anos bem merece esta cerimónia, que não é mais do que devida. Creio que esta Assembleia, na legislatura em curso, já se desobrigou de um dever próprio dos aniversários; o presente de anos do Parlamento foi a Lei da Autonomia Universitária.
Ainda em fase de aplicação prática, à espera dos seus primeiros frutos, certamente com erros e insuficiências e a precisar de ulteriores ajustamentos, essa lei transformar-se-á - assim o cremos - numa carta da Universidade moderna.
Habituados à liberdade, nem sempre temos memória de momentos obscuros do passado. Mas, para termos apenas uma ideia aproximada do que eram dias de dependência, basta recordar que há tão pouco tempo como 30 anos, em pleno regime autoritário, um reitor ousava referir, em letra de forma, sa autonomia que um dia roubaram à Universidade e nunca mais lhe restituíram».
Eis o que hoje está feito, a restituição da autonomia, quase sinónimo de liberdade. Sem vaidade, esta Assembleia orgulha-se de o ter feito.
Felicitemo-nos ainda e felicitemos as universidades pelo clima de cooperação e lealdade em que decorrem as comemorações deste aniversário. Este júbilo parece formal, de circunstância - garanto-vos que não o é! Há 30 anos eram de borrasca as relações entre as universidades. Ainda hoje recordo o momento em que cheguei à Faculdade e uma ridícula polémica ocupava as principais instituições universitárias. Esta cerimónia seria então impensável. Hoje, as guerras de campanário, que não ilustraram a Universidade, estão ultrapassadas. É consolador que o entendimento tenha sido conseguido em regime democrático.
Uma vez mais: feliz aniversário!
Srs. Deputados, não é fácil comemorar sete centenários. Uma história destas recomenda-nos contenção, tanto no elogio como na crítica. Mas, sendo esta uma assembleia política, é de política que devemos falar, resistindo à tentação académica, que é grande, e não dando ouvidos à musa celebrativa, que é estéril.
Ao contrário do que se diz, com a autonomia universitária as responsabilidades dos poderes públicos, nomeadamente as do Governo, não diminuíram; mudaram de natureza e talvez sejam mais graves. O planeamento a longo prazo, a regularidade do financiamento, a avaliação continuada, o acesso socialmente justo, a fiscalização rigorosa das instituições e a definição da natureza dos vínculos dos docentes ao Estado, eis algumas das principais missões do Governo, às quais também o Parlamento não pode ficar alheio.
A autonomia universitária não pode ser a lei dos braços caídos dos governos. E acrescento - estas obrigações do Estado são extensíveis, em grande parte, às organizações universitárias privadas, aliás reconhecidas e apadrinhadas pelos governos em circunstâncias estranhas, às quais não faltou a leviandade.
Vivemos um momento crucial da vida da Universidade e o Governo tem a estrita obrigação de avaliar, planear e desenvolver. Existem recursos e a oportunidade é de ouro. O Governo deve agir com excepcional rigor, mas também com uma visão larga e inteligente, como deve perder as ilusões do lucro político fácil.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As universidades ganham-se e perdem-se em gerações - as necessárias para formar cientistas e professores - e não se submetem a uma espécie de «mercearia anual».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Durante os últimos 20 anos verificou-se um formidável crescimento do número de universidades e de escolas, de docentes e de estudantes. Foi de tal modo galopante que, pelo caminho, ficaram, por vezes, critérios de qualidade. Nas universidades, sem meios nem capacidade de previsão, estritamente tuteladas e dependentes, ainda por cima respondendo a solicitações exteriores, instalaram-se a sobrelotação, o improviso na organização e até a precipitação no recrutamento. Não aprofundo a análise, mas sabemos que está chegado o momento de proceder a uma reorientação.
Não quero com isto dizer que haja crise nas universidades - ou, antes, que haja uma nova crise. Com efeito, a ideia de crise está, para o melhor e o pior, ligada à universidade. É sinal de que está viva, permanentemente em questão e sempre em jogo com a sociedade. Repare-se nas últimas décadas, em que sempre esteve a Universidade em situação crítica. Momentos houve em que a palavra esteve proibida; falava-se então em «problemas» ou em «problemática» da Universidade, assuntos sobre os quais se escreveram, aliás, algumas das melhores páginas de política social do pós-guerra. Em tempos livres, as ideias de «mal-estar» ou de «crise» vêm imediatamente ao espírito e são publicamente expressas.
Não me entendam mal; não quero com isto dizer que, de tanta crise, crise não haja. Antes, pretendo que a crise é, em cada momento, renovada e deve, em cada momento, ser pensada em conformidade com as expectativas e as necessidades da sociedade, por um lado, e com as exigências do desenvolvimento da ciência, por outro.
Na verdade, esta Universidade Portuguesa, que tem sete séculos, é a mesma e é sempre diferente. Com os tempos vão mudando os seus problemas, tal como as solicitações da sociedade. O que na realidade está sempre em causa são as funções da Universidade, tanto as permanentes como as da circunstância histórica. Vejamos as principais.
A função cultural é medianamente desempenhada entre nós; a função científica é a principal vítima ao longo dos tempos; a função técnica e profissional tem tido o indiscutível predomínio; a função social, de reprodução das classes dirigentes, é cumprida a preceito; a função, também social, de promoção dos economicamente desfavorecidos, mas merecedores pelo mérito, é muito insatisfatoriamente desempenhada.
Entre estas funções, mesmo havendo vocações salientes, deve existir um relativo equilíbrio - só assim estaremos a falar de uma verdadeira Universidade -, e é esse equilíbrio que, em Portugal, está, actualmente, longe de ser atingido.
Neste desequilíbrio estará talvez a raiz das principais questões actuais da Universidade, que já não tem meios,