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310 I SÉRIE - NÚMERO 11

nem dimensão, nem sequer lugares - imagine-se! -, para responder ao que se lhe pede. A Universidade poderá partilhar as responsabilidades dos seus próprios defeitos, mas não receio considerar os poderes públicos como as suas principais causas últimas.
Voltemos à discussão das funções e da natureza da Universidade, o que talvez nos permita iluminar a via para as soluções práticas. Tudo já se disse sobre esta magnífica instituição e, em particular, sobre o «que fazer». Como em tudo na vida, também neste domínio se criaram modas que rapidamente se estabelecem como verdades indiscutíveis. E, no entanto... no entanto, são frequentes as falsas verdades e as verdades fáceis sobre as universidades. Examinemos sumariamente algumas, contrariando-as de imediato.
Mais do que preservar a identidade nacional, que não corre perigos, mas que é muitas vezes invocada com disfarçado utilitarismo, a Universidade precisa de contactos internacionais, de intercâmbio e de alargamento de experiências, tanto no seu interesse como para proveito dos Portugueses.
Mais do que virar-se para o exterior e ligar-se às empresas, a Universidade necessita de reforçar o seu carácter de comunidade académica, condição essencial para o desenvolvimento do saber.
Mais do que formar profissionais e técnicos - o que, aliás, nunca deixou de ser feito -, a Universidade deve reorientar as suas actividades futuras, dando um lugar cada vez maior à ciência, à investigação e aos estudos avançados, com o que, não duvidemos, acabará por contribuir melhor, a prazo, para o desenvolvimento da sociedade.
Ao contrário do que parece obrigatório dizer-se e repetir-se, são as universidades que dependem do crescimento económico, e não a inversa. A prazo, como disse, as universidades pagam com juros, mas não vale a pena acreditar que o ensino superior, por si só, graças ao «capital humano», como está na moda dizer-se, promove o desenvolvimento. Deste deve, isso sim, ser retirado um autêntico imposto de ciência e de docência para as universidades e os politécnicos.
Mais do que persistir na barateza e na gratuitidade dos estudos, na ilusão de que assim se democratiza o acesso, a Universidade precisa de um sistema de financiamento que assegure, por um lado, regularidade e lealdade dos poderes públicos e, por outro, mais justiça social, fazendo pagar quem deve e ajudando quem não pode.
Mais do que crescer desmesuradamente, na falsa esperança de que a quantidade acabará por gerar a qualidade, a Universidade necessita de uma pausa para cuidar do mérito, apurar uma selecção mais rigorosa dos seus professores e cientistas e zelar pelo reforço da disciplina académica e científica, que tanto se aplica a estudantes como a professores.
Mais do que multiplicar os contratos com as empresas e os fundos - doce cupidez dos tempos recentes -, a Universidade precisa de grandes investimentos, sobretudo públicos, que garantam o seu desenvolvimento e combatam o espírito mercantil que tem alastrado em muitas escolas. É do interesse nacional e da ciência impedir que as universidades se transformem em supermercados.
Mais do que uma conversão ideológica ao sucesso empresarial e à vistosa iniciativa comercial, a Universidade Portuguesa necessita - isso sim! - da serenidade exigida pela actividade científica e que só o empenhamento público pode garantir.
Mais do que do desdobramento ubíquo dos professores e dos assistentes, frenética tendência tanto em moda, a Universidade precisa da dedicação exclusiva bem recompensada e da acumulação severamente penalizada, únicas maneiras de salvaguardar o espírito científico e de construir uma comunidade académica.
Mais do que da uniformidade nacional e da regulamentação universal, mais até do que da coordenação, as universidades têm tudo a beneficiar da concorrência pela qualidade e da emulação entre elas.
Mais do que de uma pletora de assistentes, rapidamente encarregados de todas as tarefas da docência, do que as universidades necessitam é de estudantes de pós-graduação e de doutoramentos, a fim de combater, com mérito e trabalho, o monopólio catedrático, ainda excessivamente presente.
Finalmente, ao invés de um direito de todos os Portugueses, a Universidade é um direito dos que têm mérito, dos que trabalharam para lá chegar ou dos que se preparam para dedicar à ciência o melhor da sua vida. Não me choca que não estejam na Universidade todos os portugueses e que nem todos possam ser admitidos. O odioso do sistema é que muitos que merecem nunca lá chegarão, enquanto outros acabam por ter um direito inato.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em conclusão: a Universidade Portuguesa está perante uma quase mutação, que não conseguirá levar a cabo sozinha. Ela deve ser indubitavelmente ajudada pelo Estado nessa tarefa. Este não deve fazê-lo na convicção de que está a ser generoso; antes o fará no cumprimento dos seus deveres perante os Portugueses.
Srs. Deputados, respeitemos a Universidade, toda a Universidade em toda a sua história, pelo que ela tem de permanente e de essencial, mas respeitemos também, sobretudo, a Universidade que luta pela ciência e pela justiça, a Universidade que lula contra a «Universidade das trevas e do dogma».
Admiremos toda a Universidade, que, a muitos de nós ensinou a liberdade, revelou a tolerância e formou o espírito crítico, mas saibamos também denunciar e combater a Universidade que aceitou, tantas vezes, ser agência do despotismo e do conformismo, contra a outra Universidade: a que se revoltava em nome da liberdade!

Aplausos do PS.

Festejemos toda a Universidade, pelos mestres que nela se fizeram, pelos cientistas que nela viveram, pelos professores eminentes que a construíram, sem nunca esquecer que a Universidade também expulsou estudantes que lutavam pela liberdade, recusou a admissão de grandes, mas incómodos, espíritos, permitiu o afastamento de professores que combatiam pela dignidade e deixou, silenciosamente, que governos demitissem cientistas que não aceitavam viver de joelhos.
Recordemos toda a Universidade, pela sua longa busca do saber, pela sua infinita dedicação e pela repetida incompreensão com que é brindada pelos poderes públicos. Mas não duvido que lembraremos, sobretudo, a Universidade que nos deu lições de humanidade, a que nos ajudou a duvidar e a que nos permitiu ser livres.

Aplausos gerais.