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986 I SÉRIE -NÚMERO 29

E continua este jovem: «Neste momento precisava de ir ao Hospital de Santa Maria fazer medicina física e reabilitação, pelo menos um mês, para me tirar algumas das dores que me atormentam, e o meu braço está completamente atrofiado. Tenho imensos problemas com os meus pais. Eles não me dão nem apoio monetário nem moral, por isso sinto-me um autêntico lixo. Nesta terra, a minha vida é comer, ouvir musica e dormir.»
Dá conta depois do seu contentamento em ter visto na televisão alguém interessar-se pelo problema, porque, segundo diz, «até agora ainda não tinha visto ninguém interessar-se pelos problemas dos deficientes».
E continua assim: «Sobretudo gostaria de saber como resolver algumas questões. Tenho apenas a 4.º classe, porque desisti de estudar. Gostaria de voltar a estudar, mas para isso teria de me deslocar a Castelo Branco, a cerca de 38 km, porque é o local mais próximo onde há escola à noite, só que com a minha pensão de invalidez não me dá para as viagens e para os livros que teria de comprar.»
Adivinha-se o atropelo das ideias, não vá esquecer-se de alguma coisa importante: «Disseram-me que, mesmo eu sendo deficiente, podia tirar a carta de condução, mas que teria de ser em Lisboa, numa escola especial, embora eu não tenha condições para tirar a carta.» Finalmente, interroga: «Gostaria que me dissesse se posso ou não tirar a carta de condução, como e onde.»
As queixas, em tom de informação, correm em catadupa: «Derivado aos medicamentos que tomei no hospital, e ainda continuo a tomar alguns, os meus dentes apodreceram todos e de vez em quando alguns doem-me, eu precisava de arrancá-los, só que é muito caro e não tenho dinheiro. O que é que posso fazer?»
Refreia finalmente as palavras, referindo que ainda linha muito para dizer, «só que a carta já vai longa e eu não quero dar mais trabalho. Fico-me hoje por aqui. Termino com os meus melhores cumprimentos.» Termina assim este jovem essa carta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No passado dia 27 de Novembro, promovemos, nesta Assembleia, uma interpelação ao Governo sobre a situação dos deficientes em Portugal. Na altura, o PRD alertou o Governo de não aplicar as medidas de política de prevenção e reabilitação das pessoas com deficiência, nomeadamente nos domínios da educação, integração social, transportes e saúde. Apesar da desvalorização merecida, esta iniciativa acabou por merecer da comunicação social um tratamento muito apreciável.
Desde então, o Grupo Parlamentar do PRD tem recebido, diariamente, cartas de congratulação e agradecimento por parte de instituições privadas e de cidadãos comuns. Fazem referência, na sua generalidade, ao desinteresse prestado pelo poder político à matéria em causa. Mas a maioria dos contactos que nos têm chegado são apelos de pessoas que descrevem as precárias condições em que vivem e as situações de injustiça de que são vítimas; pessoas que nem sequer conhecem os seus direitos ou que, conhecendo-os, não os vêem consagrados; cidadãos que apelam sistematicamente aos ministros e que recebem lacónicas respostas ou, por vezes, resposta nenhuma; pessoas que se deslocam com dificuldade, mas que são empurradas de serviço em serviço na busca de uma mera informação; pessoas que no quotidiano se apercebem de que os diplomas anunciados e publicados são restritivos e que, quantas vezes, não se aplicam àqueles que deles deveriam beneficiar.
Outros contactos nos têm chegado, dos quais não temos testemunhos escritos: telefonemas de portugueses que colocam sob a forma oral os seus problemas, porque têm dificuldade de os fazer de forma escrita. É o caso de um ex-agente da Polícia de Segurança Pública que há 30 anos, com 100% de incapacidade ganha em serviço, tem percorrido, em vão, todas as instâncias para obter um regime de compensação que lhe assegure as condições mínimas de sobrevivência, ou o dos paraplégicos invisuais, a quem é negado o subsídio de acompanhamento por terceira pessoa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pareceu-nos fundamental dar-vos conhecimento destes ecos que nos têm chegado e que serão encaminhados para o Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social sob a forma de requerimento, para dele obtermos resposta. Mas estes apelos que nos dirigiram permitem identificar a justificação plena de um provedor dos deficientes. Pensamos que o diploma hoje em discussão, não obstante carecer de ajustamentos e explicações, pode e deve constituir um instrumento importante e inovador no sentido de assegurar o gozo pleno dos direitos de todos os cidadãos.
Quanto ao projecto lei das associações de deficientes, é sabido que ele foi elaborado com um forte contributo dessas mesmas associações. Conclui-se, pelo menos teoricamente, que ele consubstancia as aspirações desta faixa populacional e que se encontra adaptado à realidade portuguesa. Trata-se, no fundo, de um diploma que tem por objectivo desenvolver o artigo 71.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, bem como as normas correspondentes na Lei de Bases de Prevenção, Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência. Ele corresponde igualmente à aplicação das medidas de política preconizadas no Plano Orientador de Reabilitação.
Hoje, Sr. Presidente e Srs. Deputados, definir o quadro em que se inserem as associações de e para deficientes na tomada de decisões dentro dos poderes central e local, bem como definir e consagrar claramente a forma como são apoiadas estas organizações com vista à prossecução dos seus objectivos, é um imperativo que esta Câmara não pode nem deve enjeitar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje é mais um dia em que a Assembleia da Republica tem a oportunidade de não se alhear das suas competências nesta matéria. A nossa postura é, como sempre, a de contribuir para promover soluções e derrubar os obstáculos que persistem numa sociedade que desrespeita a diferença de um conjunto significativo de cidadãos, estimados em l milhão.
Temos a firme convicção de que os diplomas em análise são instrumentos desse contributo que pretendemos dar. Por isso, apelamos a todos os grupos parlamentares que as viabilizem, a fim de que, em sede de comissão, sejam possíveis os ajustamentos que no debate aqui referimos.

Aplausos do PS, do PCP, do PRD e do deputado independente Raul Castro.

Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Manuela Aguiar.

A Sr.1 Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Osório Gomes.

O Sr. Osório Gomes (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Esta legislatura tem consagrado, sem dúvida, uma muito especial atenção aos problemas da prevenção, reabilitação e integração social das pessoas com deficiência.