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27 DE FEVEREIRO DE 1991 (1519)

que o Governo recusou na conferencia de líderes. Se o fez, algumas razoes terá, e essas razoes traduzem-se em reconhecer que não está efectivamente em condições de produzir esse debate, porque ele reconheceria o fracasso da sua política agrícola para a agricultura nacional.

Aplausos do PCP.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): -Os senhores não querem discutir os problemas da agricultura, querem é fazer «fofoca» com a agricultura, o que é diferente!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Por que 6 que não requerem uma interpelação ao Governo sobre a questão?

O Sr. Carlos Brito (PCP): -Já está requerida!

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No discurso de ano novo ao Corpo Diplomático, o Papa João Paulo II referia: «1990 foi o ano da liberdade. Façamos de 1991 o ano da solidariedade.»

Vozes do PS:-Muito bem!

O Orador: - Sábia orientação que bem poderia ser adoptada entre nós em relação a um problema que tem assumido maiores proporções nos últimos anos e que não pode deixar ninguém indiferente: o problema da pobreza e da exclusão social.

O Sr. António Guterres (PS): -Muito bem!

O Orador: - Apesar de termos uma Constituição das mais avançadas do mundo no que respeita à proclamação dos direitos dos cidadãos, muitos milhares de portugueses, homens, mulheres, crianças, jovens ou idosos vivem uma situação dramática de completa exclusão social. Uma situação que tem na sua génese razoes de extrema pobreza e que cria uma situação de marginalização e um círculo vicioso de pobreza, de onde quase nunca se sai.
Para que se possa avaliar a extensão do drama, permitam-me que dê conta a esta Assembleia de alguns dados de um estudo recente efectuado por uma equipa de técnicos para várias instituições- Só na área de Lisboa existem hoje cerca de 250 000 pessoas em condições sub-humanas de alojamento: vivem em zonas degradadas, bairros da lata e outros clandestinos e degradados, sem um mínimo de condições, completamente excluídos do mercado habitacional normal. Cerca de 60 % destas pessoas vivem abaixo do limiar de pobreza, o que quer dizer que não dispõem de um mínimo de rendimentos para fazer face às necessidades de um cabaz de compras de um nível de vida minimamente aceitável.
Refira-se que 45 % das que trabalham tem salários inferiores ao salário mínimo nacional. Mesmo nas famílias em que duas pessoas trabalham, 36 % estão abaixo da linha de pobreza, normalmente com empregos precários em empresas de subcontratação na construção civil (mesmo em obras do Estado), sem qualquer vínculo contratual e qualquer tipo de protecção social.
67 % deste universo são portugueses e 23 % imigrantes, na sua maior parte provenientes dos países africanos de expressão portuguesa. Dos portugueses, 54 % são oriundos de outras regiões do País, principalmente de meios rurais: pertencem a uma nova geração migrante, sazonal, sem direitos de nenhuma espécie; 20 % não sabe ler nem escrever e só 10 % tem habilitações acima da 4.ª classe.
Nos jovens a situação é ainda mais dramática: 60 % dos jovens com idades compreendidas entre os 12 e os 24 anos não cumpriram a escolaridade obrigatória e o insucesso escolar das crianças é superior a 50 %. Este grupo caracteriza-se por uma grande precocidade: no abandono da escola, para ir trabalhar, pois a escola não lhes diz nada; na constituição de família, casam e têm filhos muito cedo; no abandono da vida activa, para viverem de múltiplos expedientes; na morte, por acidente, por doença ou por suicídio, por vezes na presença das crianças.
80 % dos indivíduos que se consideram pobres declaram ser filhos de pobres, o que demonstra uma tendência para a reprodução da pobreza, uma vez que as novas gerações não têm condições para se integrarem e tendem para a exclusão. Verifica-se ainda que quanto mais prolongada é a permanência na pobreza mais baixo é o nível de aspirações e maior a resignação: deixam mesmo de acreditar em si próprios.
Outra situação dramática é a dos sem abrigo. Só em Lisboa calcula-se em 2500 o número de pessoas permanentemente sem abrigo, chegando a atingir 4000 em certas alturas do ano. Para avaliarmos melhor a extensão deste drama, valerá a pena acrescentar que em Londres, com cerca de cinco vezes mais população, se calcula, nas piores alturas, em 5000 o número de pessoas sem abrigo. A maior parte são idosos e, das pessoas em idade activa, desempregados sem direito a subsídio de desemprego, gente que caiu na rua por insuficiência de reforma ou por ter perdido o suporte familiar, jovens desempregados, toxico-dependentes e doentes do foro psiquiátrico.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Portugal não é só Lisboa e este problema não existe apenas em Lisboa. A massa humana que constitui os grupos mais vulneráveis encontra--se por todo o País: famílias de baixos rendimentos, crianças de famílias empobrecidas, pessoas idosas e sem abrigo ou mal alojadas, desempregados ou ocupados em empregos precários, deficientes, minorias étnicas, toxi-codpendentes ou alcoólicos, mulher de famílias empobrecidas integram o grupo das muitas centenas de milhar de pessoas que em Portugal vivem abaixo do limiar de pobreza e constituem, no seu conjunto, um imenso grupo de cidadãos excluídos da sociedade e privados, por inexistência de condições para o seu exercício, dos mais elementares direitos da pessoa humana.
Dir-me-ão: «Mas em Portugal sempre houve miséria, sempre houve pobreza. E, mesmo na Europa, não se manifesta ela com formas e extensões diferentes na Europa inteira?» É verdade, mas também é verdade que nunca, como agora, houve tanta manifestação de fenómenos de exclusão social e que no nosso país nunca, como agora, houve condições económicas e financeiras para desencadear um combate sério contra estes fenómenos.

Aplausos do PS.

No que à Europa respeita, tudo é relativo, porque um pobre na Alemanha, por exemplo, tem mais rendimentos do que um remediado em Portugal, situação agravada em Portugal pela inexistência de um rendimento mínimo garantido.

Vozes do PS: - Muito bem!