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1 DE MARÇO DE 1991 1561

A proposta de lei apresentada pelo Governo não tem esse conteúdo mínimo, não dá resposta às "necessidades do Estado para fazer face à implementação de um processo de planeamento, nos termos em que este pode (e deve) ser concebido e realizável no actual enquadramento político e económico".
As insuficiências e omissões da proposta de lei são gritantes quanto à coerência sistémica de um qualquer sistema de planeamento que se pretenda estruturar. Mas elas são muito mais graves quando tais insuficiências e omissões da proposta de lei correspondem, exactamente, às insuficiências e omissões que existem no sistema em vigor. Isto é, o Governo conhece-as, mais ainda, reconhece-as, mas, por sua vontade política, não pretende dar-lhes solução. Com o que certamente pretende significar que, com a apresentação desta proposta de lei, visa apenas cumprir formalmente um comando constitucional, mas que não lhe pretende atribuir qualquer eficácia prática.
O Governo continua assim a optar pelo "planeamento decorativo" a que a Constituição da República não dá cobertura legal.
Vejamos algumas situações caracterizadoras da proposta de lei e demonstrativas do que acabo de referir.
Não há na proposta qualquer norma que permita ultrapassar a actual "ambiguidade sobre a localização dos centros de decisão da política económica". Isto é, não responde à questão primeira de saber qual a orgânica ministerial adequada à definição das opções estratégicas para a economia portuguesa, à formulação da política económica numa óptica de desenvolvimento e a sua articulação com a política Financeira. Com efeito, tal aponta para a manutenção do actual predomínio do financeiro sobre o económico, a subordinação do planeamento estratégico à política económica conjuntural, recusando assim o sentido útil do planeamento estratégico, invertendo a própria precedência constitucionalmente consagrada e, só por si, inviabilizando qualquer sistema de planeamento eficiente, qualquer implementação de uma estratégia de médio prazo, qualquer possibilidade de a economia portuguesa responder, com êxito, aos desafios e perigos de 1993 e da União Económica e Monetária. E isto para não falar agora no continuação do esvaziamento do Ministério do Planeamento enquanto tal.
Em segundo lugar, o sistema decisional previsto na proposta de lei continua a ser centralizador. E este erro, este pecado mortal do sistema de planeamento, existindo igualmente na óptica sectorial, é extremamente evidente e grave na perspectiva regional. O Governo pretende continuar a assenhorear-se do planeamento regional, quando este, de forma inequívoca, constitucionalmente, é da competência do poder regional.
O Governo pretende, afinal, a perpetuação da usurpação, através de órgãos desconcentrados do poder central, de competências que constitucionalmente pertencem aos órgãos das regiões administrativas.
Enquanto esta competência regional não for exercida, o Governo pode continuar a elaborar programas de desenvolvimento regional, em que prevalecem critérios de repartição sectorial de recursos fora de qualquer "quadro de aspirações das regiões, política e socialmente expresso através de mecanismos de decisão representativos". Porém, por isso mesmo, não pode elaborar planos regionais de desenvolvimento económico e social.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta é, certamente, uma das razões essenciais que motivam o Governo e o PSD a obstacularizar, por todos os meios e contra os comandos constitucionais, o exigível processo de criação das regiões administrativas. A vontade centralizadora do Governo sobrepõe-se aos interesses do desenvolvimento económico e social das regiões, aos interesses do País e das populações.
Em terceiro lugar, a proposta do Governo não dá qualquer resposta à questão central dos mecanismos de controlo e avaliação do planeamento. Questão que se coloca quer na óptica técnica de controlo e avaliação da execução física dos projectos de investimento público e dos seus resultados, quer na óptica da avaliação política do cumprimento das grandes opções aprovadas pela Assembleia da República.
O Governo pretende, afinal, que a avaliação se circunscreva à vertente financeira, procurando deste modo fugir aos riscos políticos e de gestão de uma avaliação objectiva e global dos investimentos que promove e dos compromissos políticos que assume.
Estas, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, três questões centrais das muitas deficiências e insuficiências da proposta de lei que o Governo nos apresentou, alegadamente visando a definição de um sistema de planeamento nacional, que nos parece de relevar em sede de debate na generalidade.
No entanto, não posso concluir sem, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, colocar à Assembleia dois aspectos do conteúdo da proposta de lei, caracterizadores do posicionamento do Governo face à Constituição e à Assembleia da República.
Em primeiro lugar, no n.º 2 do artigo 2.º da proposta de lei o Governo pretende consagrar legalmente que pode haver planos de desenvolvimento económico e social de médio prazo, sendo tal demonstrativo da ausência de perspectiva de um planeamento estratégico e do desprezo a que o Governo vota a Constituição.
O Governo e o PSD podem querer o que quiserem, e o seu projecto de revisão constitucional demonstrou que o PSD não queria qualquer planeamento. Mas, nesta matéria, a vontade do PSD foi uma coisa, enquanto que o constitucionalmente consagrado é outra bem diferente. Aqui, o PSD e o Governo perderam, uma vez que a Constituição impõe a existência do plano de médio prazo. Há, pois, que alterar a proposta de lei em conformidade, uma que, tal como está, é rotundamente inconstitucional.
O segundo aspecto tem a ver com a profunda discordância existente entre a nota justificativa da proposta de lei e o seu articulado.
Naquela nota justificam-se várias questões - desde o estatuto funcional e orgânico dos órgãos de planeamento centrais, sectoriais e regionais, até ao acompanhamento e avaliação, passando pelo regime de elaboração e apresentação dos relatórios de execução dos planos - que depois não têm concretização no articulado. Aliás, a nota justificativa chega mesmo a referir-se aos artigos 21.º e 22.º da proposta de lei, sendo certo que a proposta apresentada pelo Governo à Assembleia da República - pasme-se!- apenas contém 15 artigos.
Este facto reflecte, de forma inequívoca, o desprezo a que o Governo vota este órgão de soberania, confiante em que a maioria acrílica do PSD tudo aceita e tudo lhe permite. Porém, no caso vertente, também poderá significar que o Governo apresentou esta proposta de lei sem que, no interior do Governo, haja ideias claras sobre o sistema