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1702 I SÉRIE - NÚMERO 52

Agora, como disse também - e bem -, estou de acordo consigo em que este projecto, na especialidade, será, com certeza, melhorado. No entanto, há dois ou três pontos que gostava, desde já, de deixar à sua consideração: um dos primeiros, dado que este projecto de lei se destina ao reforço dos mecanismos de protecção legal devidos as mulheres vítimas de crimes, nomeadamente violência, é a questão da definição desta. O vosso projecto de lei nada diz sobre o que é ou o que se deve entender por violência, e essa, de facto, tem sido uma das questões, segundo me pude informar, mais debatidas em lermos das organizações internacionais. Julgo que, em sede de especialidade, esse e outros aspectos poderão, obviamente, ser melhorados e todos contribuiremos, com certeza, para esses melhoramentos.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sra Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odeie Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, vou tentar ser brevíssima, porque ainda queremos fazer uma outra intervenção sobre os projectos em discussão.
Efectivamente, o nosso projecto de lei pode ser melhorado e pode até acontecer que o que aqui está não seja suficiente, mas, por acaso, preocupámo-nos com o aspecto que o Sr. Deputado referiu, pois o n.º 2 do artigo 1.º diz que o sistema de protecção previsto no presente diploma aplica-se quando a motivação do crime resulte de atitude discriminatória relativamente à mulher, estando, nomeadamente, abrangidos os casos de crimes sexuais e de maus tratos a cônjuges. Houve essa preocupação, mas concedo que possa ser melhorado.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei em análise, embora não corresponda à complexidade das situações que geram violência no seio da família e da sociedade, de que as mulheres, as crianças e os idosos são as principais vítimas, tem o mérito de procurar solucionar uma grave lacuna da nossa sociedade - abrigo e auxílio adequado por pessoal preparado, para as mulheres e seus Filhos vítimas de violência.
O que existe é manifestamente insuficiente: um serviço de atendimento jurídico da Comissão da Condição Feminina, um serviço específico na Polícia Judiciária e na Polícia de Segurança Pública.
Os tribunais portugueses, por razões culturais, económicas e sociais, são, regra geral, benevolentes com os agressores, devido à extrema dependência das mulheres e seus filhos, se abandonados à sua sorte, sendo difícil aos juizes escolher o menor dos males - o terror da miséria ou o dos maus tratos.
Há, porém, outras razões, fundamentadas no conservadorismo polílico-cultural da sociedade portuguesa no que às doenças sociais diz respeito. O que se passa no interior da família é tabu, sujeito aos mitos familiares, enraizados em crenças que se transmitem através das gerações, dos antecedentes aos descendentes, e que são tributários dos mitos existentes no plano social, regional e nacional.
É na família gue se reflectem os desequilíbrios e as doenças sociais. É da sociedade para a família que tem de ser encontrado o ambiente saudável para as trocas afectivas no seio da família, num permanente jogo de interacção recíproca, tendente ao equilíbrio.
As modernas correntes em saúde mental vieram comprovar que um sintoma ou uma perturbação de comportamento de um dos membros da família deve ser compreendido e analisado no contexto dinâmico das relações intrafamiliares e desta com a sociedade.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Assim, a violência sobre as mulheres, sobre as crianças e sobre os idosos, os abusos sexuais e a violência moral e psicológica só podem ser detectados e prevenidos por um complexo sistema de apoio multidisciplinar à família, que garanta o seu desenvolvimento harmonioso em condições de igualdade de oportunidades, realização individual e direito à felicidade de cada um dos seus membros.
Um delito é sempre um delito e a lei trata-o como tal. Porém, todos sabemos que os delitos cometidos na intimidade do lar raramente chegam aos tribunais e, quando chegam, têm apenas um efeito punitivo e não curativo.
A lei aplica-se a comportamentos passados e nunca se preocupa com comportamentos futuros. Entendemos mesmo que o Código Penal não trata com suficiente rigor os casos de morte ou mutilação ocorridos muito depois da agressão, mas em consequência desta.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - As mulheres vítimas de violência, de todos os estratos sociais, ponderam a sua situação antes de agirem, sendo a verdadeira dimensão deste fenómeno ainda mal conhecida. Não existem estatísticas suficientes nem estudos aprofundados e mesmo a contabilização dos efeitos mais gravosos evidentes dos maus tratos físicos, que marcam, mutilam e causam a morte, é bastante difícil.
São as próprias mulheres e seus familiares que, quando recorrem aos hospitais e aos médicos, ocultam as condições e causas da agressão e as impedem de denunciar a ocorrência, invocando o direito ao sigilo, em nome da honra e dignidade da família ou receando retaliação.
Não se pense que estes casos são raros entre nós. O país dos brandos costumes esconde, no silêncio do lar, uma dupla moral - os vícios privados e as públicas virtudes.
Detectam-se nas reacções e manifestações organizadas de hipocrisia, de que são exemplares muitos líderes políticos, sociais e espirituais e, às vezes, a comemoração do dia mundial da mulher...

Aplausos do PS.

A Oradora: -.... que apenas erguem a bandeira da moral pública para condenarem com violência a difusão televisiva da desmistificação dos tabus sexuais, pela mostra de relações naturais ou perversas, tão velhas e presentes no nosso quotidiano, criando estigmas que recaem sobre a imagem da mulher. Mas não tem uma palavra, uma acção pública e nenhuma cruzada é feita para defender as vítimas da agressão no seio da família.

Aplausos do PS.

Criam-se conceitos desajustados à realidade da vida, inculcam-se culpas nos inocentes, exalta-se a mãe, condena-se o amor. Assim, muitos são os filhos do pecado original. A geração de 60 quis dar ao mundo filhos do amor e do prazer.