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1742 I SÉRIE - NÚMERO 54

Há censura, sim, Sr. Deputado! Há, sim! Sei que aí, nessa bancada, não há censura porque não há limites à criatividade, inclusivamente do comportamento.
Mas aqui há, sim, Sr. Deputado! Há censura do pudor político, do imperativo moral e da honradez dos mandatos que subscrevemos e aos quais, com muito orgulho, somos fiéis. É, de facto, esse o nosso grande ponto de honra. O Sr. Deputado discorda de nós neste ponto. É esta uma profunda divergência que nos separa!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa da honra e consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Indep.): - Sr. Deputado José Silva Marques, não pretendo fugir à questão central do debate, mas não posso deixar de salientar que, em meu entender, as suas palavras são a negação daquilo que é um direito constitucional, que faz parle do nosso sistema político actual, designadamente no que respeita à existência, neste Parlamento, de deputados independentes, eleitos directamente pelo povo, representando todo o país, que têm, entre outras, a missão de legislar e fiscalizar os actos do Governo.
É nessa qualidade de deputado independente que aqui me encontro e, deixe-me dizer-lhe, já há bastante doutrina sobre a matéria dos deputados que passam a independentes. Aconselho, pois, o Sr. Deputado a ler tudo quanto a este propósito aqui foi dito durante os debates da Assembleia Constituinte.
Com efeito, não foi por acaso que, na Constituição, o legislador constitucional, muito claramente, consagrou a possibilidade real de a situação em causa vir a acontecer, e tem acontecido vezes sem conta. Porquê? Talvez porque o sistema partidário vigente, com o qual concordo, não deva nunca confundir-se com a «partidocracia» que os senhores querem impor e contra a qual me revoltei e me revoltarei sempre!
Mas, Sr. Deputado José Silva Marques, a questão central não e essa! A questão central, que o Sr. Deputado Domingos Duarte Lima hoje aqui trouxe, não está na existência de deputados independentes neste Parlamento, mas, sim, no facto de a Constituição «estar a fazer o pino». Os senhores, durante as vossas jornadas parlamentares, em Setúbal, inverteram a Constituição. De facto, o Parlamento deixou de fiscalizar o Governo e passou o Governo a fiscalizar, a repreender, a ameaçar um grupo parlamentar, criando-lhe até novas regras.
Na verdade, Sr. Deputado, não me choca que a direcção de um grupo parlamentar crie regras e discipline a sua bancada. Não me choca mesmo! Bem pelo contrário, acho que é razoável, mas que um primeiro-ministro o faça acho vexatório até para mim, que não me sinto incluído no rol daqueles que vão submeter-se a tal!
Diga-me, Sr. Deputado, que não foi assim que as coisas se passaram em Setúbal, porque foi precisamente assim que tive conhecimento delas, através de um órgão de comunicação social. Isto é, realizou-se um comício feito por um
primeiro-ministro para uma maioria parlamentar que se arrogou o direito de parar os trabalhos parlamentares para fazer um comício de dois dias com o Sr. Primeiro-Ministro.
Foi, de facto, o que vi através da televisão! Sc isto não aconteceu, se não foi a realidade, Sr. Deputado, diga-me, porque me senti vexado durante este dois últimos dias.
Por isso, ainda há pouco, tive alguns desabafos a que o Sr. Deputado Domingos Duarte Lima teve a gentileza de responder.
As vezes, Sr. Deputado, é preferível pagar a multa e ir para casa durante algum tempo, em vez de ficar a assistir à descida da Assembleia da República no conceito da opinião pública e, sobretudo, no que é o nosso sentir e u nossa dignidade como representantes do povo.
É ou não certo, Sr. Deputado, que o nosso sistema constitucional é um sistema semipresidencial, semiparlamentar, em que os órgãos de soberania, que são directamente eleitos pelo povo, são os que devem assumir, de facto, a legitimidade democrática plena enquanto órgãos de soberania? Será que deve caber ao Governo, que é a emanação desta Assembleia, criticar ou vir à Assembleia quando bem lhe parece? Ou não terá a Assembleia vindo a perder, desde que este Governo é governo e desde que esta maioria é maioria, grande parte do seu poder fiscalizador, se não mesmo a totalidade dele?
Sr. Deputado, creia que não me chocava que a sua bancada organizasse umas jornadas parlamentares e elogiasse o trabalho do seu grupo parlamentar e o do Governo. Em que é que isso me poderia chocar? Em nada! Achava perfeitamente normal e banal! Mas choca-me, de facto, que um primeiro-ministro faça críticas e ameaças à Assembleia, quando ele é a emanação dela.
E o que me chocou, particularmente, foi ver a Constituição invertida, em Setúbal. Não posso suportar isto, quer como deputado independente quer em qualquer outra qualidade.

Aplausos de alguns deputados do PS e dos deputados independentes Helena Roseta e Jorge Lemos.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado José Silva Marques.

O Sr. José Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, embora com dificuldade, por respeito para com o Sr. Deputado, esboçarei uma justificação.
Sr. Deputado Herculano Pombo, não tenho bem a certeza de o Sr. Deputado ter entendido tudo o que lhe aconteceu desde que, pela primeira vez, se candidatou ao cargo de deputado. De facto, não estou seguro de que tenha entendido tudo o que se passou, desde esse primeiro dia até hoje, todas as atribulações e surpresas que lhe têm surgido...
Sr. Deputado, o problema é que na política, como em tudo na vida - afinal, por que é que a política haveria de ser diferente? -, não há borlas,...

O Sr. José Magalhães (Indep.): - Há multas!

O Orador: -... nada é gratuito - e ainda bem que assim e -, tudo deve depender do risco que se corre, do risco de nos apresentarmos tal qual somos face àqueles a quem pedimos a confiança e o voto.
Sr. Deputado, saiba que transitar com protecção é agradável, parece rápido, mas é muito inseguro. Sei que o seu caso e muito diferente. Sc me permite e sem ofensa, direi que, no seu caso, se tratou de uma agradável distracção - apesar de tudo, há-de reconhecê-lo - num lapso da sua vida. Digo-lhe que foi agradável porque este assento de deputado não tem só espinhos... Resta saber se nós - o senhor e eu próprio - aceitamos as consequências difíceis que ele implica. E, aí, estou à espera dessa sua incomodidade, tão difícil, tão horrível,...