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I SÉRIE -NÚMERO 56 1806

(...) fazer-se lei retroactiva sobre o regime de empreitadas, deixando, todavia, em aberto o regime de concursos públicos, de que este Centro está dispensado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta sociedade é uma pura Ficção jurídica. Imaginada, apenas, para o Governo poder fugir aos controlos e à prestação de contas.

Aplausos do PS.

Segundo: a irregularidade financeira. Raramente se viu um tal pandemónio nas finanças públicas portuguesas!... O custo global do Centro, de 1988 a 1991, subiu de 6 para 27 milhões de contos, esperando-se que atinja os 40 milhões dentro de um ano, talvez os 50 em 1993. Esta escalada de preços, sem precedentes nas obras públicas portuguesas, vai-se fazendo com boa consciência, sem hesitação. O que é aprovado num ano será negado no ano seguinte, sem remorsos. A obra é tão enorme que não se olha a meios!...
Terceiro: a imperícia técnica. Para um Governo que se não cansa de elogiar a sua competência, este Centro merece simples reprovação. Sem apelo nem recurso! Os planos iniciais foram mal feitos, os custos mal calculados. Um dos maiores investimentos de sempre da Administração Pública foi iniciado sem que houvesse previamente um plano de utilização, um modelo de gestão, nem sequer o conhecimento do seu objecto. Os prazos foram adiados, os módulos (como se chama às diversas partes da obra) foram destacados para se poder acabar um e adiar outros. Se o imprevisto é inerente à vida, a imprevisão é já erro e falta - como é o caso do Centro!
Quarto: a vaidade política. É esta e a respectiva ansiedade que explicam os erros mencionados. Este Centro, em muitos aspectos desnecessário, inadequado, é, sobretudo, obra de fachada e de regime.

Aplausos do PS.

«Para inglês ver» - como se dizia - ou para «embasbacar o europeu» - sua moderna versão. Por aquela vaidade atentou-se contra a História, destruiu-se o que tinha significado, e, pior do que a ilegalidade, como disse Herculano, ainda é o despropósito. «Na arte de governar, os despropósitos são, às vezes, piores do que os atentados.»

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para gáudio dos governantes e desespero de todos, este Centro é tudo: atentado, ilegalidade e despropósito.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - Pela vaidade, a área de protecção dos Jerónimos não foi respeitada, o Comité do Património Mundial não foi consultado. As novas formas de destruição do património são, para além do tradicional abandono e do velho camartelo, a construção «pechisbeque», o monumento inútil, o escritório como nova catedral. O Centro faz-se, mas Tibães espera, como esperam e desesperam o Convento de Cristo, o Palácio da Ajuda, a Pena, Santa Clara-a-Velha, os Frades Trinos, Santa Maria do Bouro e tantos outros, sem falar nos centros históricos substituídos por tijolo amarelo-de-ovo e coruchéus verde-alface.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas a tanto obriga a vaidade: o impulso era enorme, tanto como a volúpia da História.
Quinto: a propaganda pela cultura. Os que não encontram em si razão suficiente e força genuína vão buscá-las à cultura dos outros, na tentativa de dourar a sua própria auréola. E a cultura, nos tempos modernos e nas mãos dos governos, transforma-se na propaganda do presente, facto agravado, como sempre, como irremediavelmente sempre, pelo nacionalismo barato e pelas comemorações rituais, que, lentamente, fazem dos contemporâneos os «parasitas» da História, que vivem das glórias dos outros e querem ficar na História antes de fazê-la. Pior encarregam-se, eles próprios, não vá o diabo tecê-las, de organizar as homenagens que outros e vindouros poderiam, eventualmente, prestar. E é tanta a força do impulso e tão grande a tentação da propaganda que a verdadeira obra, a que dura, a que muda os homens e a vida, a que se deixa em testamento e se recebe em herança, essa, é descurada, esquecida.

Aplausos do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, Jorge Lemos e José Magalhães.

A política que cultiva os homens e as mulheres, a que cria locais de expressão cultural, a que realmente fica na História, essa virá com as calendas. Em vez de cultura na escola, em vez de música e artes para todos, em vez de arquivos abertos para investigação, em vez de restauro e preservação dos solares, dos templos, dos castelos e das ruas com história, em vez de tudo o que é necessário e urgente, mas deixa vestígios duráveis, em vez disso, temos o Centro... Triste consolação para tantos portugueses analfabetos e incultos, para tantos sem meios de chegar à cultura, até sem vontade, o mais decisivo de todos os meios, mas que sem uso, sem exercício, se perde!
Sexto: a fuga ao controlo democrático. Tudo foi organizado para que não haja controlo parlamentar sobre um dos maiores empreendimentos governamentais em curso. Igualmente, todos os esforços foram feitos, com sucesso, para retirar o Tribunal de Contas dos circuitos financeiros públicos. Os orçamentos globais finais foram três vezes modificados e, acriticamente, votados pela maioria, tendo aumentado, até hoje, 400%. A chamada Sociedade de Gestão do Centro Cultural escapa ao regime geral dos concursos públicos, tendo mesmo fugido, durante um ano, ao regime geral de empreitadas. O Secretário de Estado da Cultura, teoricamente responsável pela perpetração, já recusou, várias vezes - cinco ao que parece!... - vir à Assembleia da República debater a obra que obrigou a sacrificar o seu orçamento para tudo o que era importante.
Sétimo: finalmente, o luxo de um país pobre. A vaidade sobrepôs-se à necessidade. Um país que pede à CEE 15 000 contos para limpar os castelos e 25 000 para caiar os solares, não hesitou em gastar 40 ou 50 milhões com a vistosa aparência.

Aplausos do PS e dos deputados independentes Herculano Pombo, Jorge Lemos e José Magalhães.

Foram 2 % do PIDDAC de 1990 e 4 % do de 1991, foi esta a prioridade das prioridades, num país com tantas carências, bem mais baratas, nas escolas sem artes e sem música, nas escolas sem livros, nas bibliotecas sem aquecimento, na música sem escolas, na mais baixa leitura de jornais e livros de todo o mundo industrializado.

Vozes do PS: - Muito bem!