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2514 I SÉRIE -NÚMERO 76

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em todos os países os responsáveis tiraram conclusões após a guerra do Golfo. Conclusões que incidiram sobre os eixos centrais da acção diplomática, sobre os níveis de participação militar e sobre a reconstituição das políticas de segurança e de defesa, bem como sobre o papel das alianças e das grandes organizações internacionais.
Até hoje, não aconteceu assim em Portugal.
O Governo tem-se inibido de o fazer. Propomos, por isto e desde já, dez grandes tópicos de discussão pública.
Primeiro: a necessidade de actualizar o conceito estratégico de defesa nacional.
Portugal é o único país europeu que se auto-excluiu de um debate sobre esta matéria. A Comunidade Europeia, a União Europeia Ocidental e a Aliança Atlântica, cada um dos seus países, debatem e reformulam a sua apreciação das políticas de defesa e segurança, na sequência do novo modelo de relações entre o Leste e o Oeste e das ilações da guerra do Golfo. Entre nós, a proposta formulada no Parlamento no sentido da modernização do conceito estratégico de defesa nacional não teve acolhimento útil. Em véspera de tomar importantes decisões sobre o reequipamento das forças armadas, com a votação da nova lei de programação militar, seria da maior utilidade proceder a uma adequação de princípios, exigida pela evolução das circunstâncias e das doutrinas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Segundo: a importância de acertar uma orientação nacional sobre o futuro das instituições europeias para, a partir dela, presidir às Comunidades no 1.º semestre de 1992.
Regra geral, a presença portuguesa nos organismos internacionais tem-se pautado pela desproporção flagrante entre a discrição e a timidez com que tomamos parle nas reuniões - uma actuação quase simbolicamente protocolar - e a exuberância com que, a propósito, os intervenientes se apressam a projectar comentários públicos para ampliação doméstica nos meios de informação.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Orador: - Considerar que a integração do País se faz, unicamente, pela via da gestão paulatina de medidas transitórias e derrogações temporárias e menosprezar a assunção de posições de fundo sobre os grandes dossiers da Comunidade é prosseguir uma via de auto-apagamento extremamente lesiva da capacidade de projecção externa de Portugal. Está por fazer um debate interno que nos habilite, neste ponto, à obtenção dos adequados consensos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro: a integração e a presidência das Comunidades não devem fazer esquecer entre europeus as relações de país a país.
De certa forma é a necessidade de um movimento de sinal contrário. Se há que saber estar acima dos dossiers sectoriais referente à integração específica de Portugal, há também que ser capaz de não diluir toda a nossa política para com os países da Comunidade na matriz da institucionalização comunitária. Nas Comunidades Europeias não se dispensa o bilateral. No caso português, toma-se absolutamente evidente a importância de fazer ampliar o denominador comunitário através do desenvolvimento de sistemas dinâmicos de relacionamento bilateral com países como a Alemanha, o Reino Unido, a França, a Espanha, a Itália ou o Benelux. A adesão as Comunidades não significa o fim ou a mera diluição do relacionamento país a país. O desafio das diplomacias bilaterais passará a estar de novo na ordem do dia entre os Doze.
Quarto: Portugal não deve automarginalizar-se da reconstrução da Europa Central.
O fim da guerra fria, a par da reunificação alemã, viu surgir novas democracias na Polónia, na Hungria e na Checoslováquia, que hoje procuram uma acomodação na recém-criada ordem da segurança europeia e um relacionamento político e económico muito activo com a Europa ocidental.
Apesar da distância e de uma falta de traços culturais idênticos, qualquer desses países, em ruptura com os anteriores regimes totalitários, sente fortes laços de proximidade com Portugal, quer no estabelecimento de sistemas políticos participados e pluralistas, quer na passagem a economias de mercado, assentes na privatização e não na propriedade pública.

O Sr. Rui Vieira (PS): -Muito bem!

O Orador: - A cooptação das democracias da Europa central para a esfera de influência comunitária é uma orientação correcta, que deve ser assumida por Portugal em todos os planos da sua acção diplomática. Longe vão os tempos em que os méritos de uma via pluralista nos pertenciam como novidade exclusiva. Compreender a situação é o primeiro passo para nela nos inserirmos de modo correcto.
Quinto: urge repensar o nosso relacionamento com os EUA.
A guerra do Golfo reconfírmou a centralidade do papel desempenhado pelos Estados Unidos na cena internacional. A começar pela União Soviética, todos os países têm vindo a reconfigurar o seu modelo de relações com o «Estado-Mundo».
A circunstância de se integrar blocos regionais - como as Comunidades Europeias - ou até uma aliança conjunta - como o Tratado do Atlântico Norte - não impede que se procure estabelecer uma relação vantajosa com a potência mundial.
Estamos colocados, como ninguém, para entrar na corrida do relacionamento dinâmico com os Estados Unidos, mas, paradoxalmente, somos daqueles que mais energia despendem, inutilmente, por força de uma corrosiva dispersão de esforços.
O conteúdo da relação óptima entre os nossos dois países não deve ser definido de fora, por uma das partes em exclusivo, ou quedar-se ao sabor de pulsões que, no interior do País, apenas visam a rotina de interesses instalados. O teste para essa nova etapa é, sem duvida, a renegociação do Acordo das Lajes, tema sobre o qual muito pouco está perspectivado e ainda menos está, cabalmente, informado e esclarecido. O lugar comum é, dramaticamente, insuficiente para conter a inevitabilidade de ajustamentos, correcções e mudanças. Mas quais? Eis o que não está determinado nem assumido.

Vozes do PS: - Muito bem!