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2516 I SÉRIE -NÚMERO 76

bispo, impusera-se a tarefa de escrever, mensalmente, para o jornal O Mensageiro de Santo António, uma carta dirigida a algum personagem ilustre do passado, e começou por Charles Dickens.
Recordava ao romancista palavras que este escrevera em 1843, antes do Manifesto, nos Contos de Natal, que descreviam a vida lastimosa dos «oprimidos», inspirado pelo «amor aos pobres».
Passados 130 anos, Albino Luciani informava-o de que, vivida a experiência, que se prometera correctora, dos vários socialismos, a situação piorara consideravelmente.
Dizia-lhe: «No teu tempo as injustiças sociais iam numa única direcção: os operários apontavam com o dedo os seus patrões. Hoje é incontável a gente que aponta com o dedo: os trabalhadores do campo, que se queixam de estarem muito pior do que os trabalhadores da indústria; aqui, na Itália, o sul contra o norte; em África, na Ásia, na América Latina, as nações do Terceiro Mundo contra as nações do bem-estar.»
Nem o reformismo, nem a revolução, tinham eliminado o passivo dos sistemas, acontecendo que a evolução autónoma dos aparelhos políticos tinha muitas vezes contribuído para o agravar.
Coincidindo com a reeleição de Ronald Reagan, depois de uma campanha que prometia o «renascimento da América», sob uma filosofia política e económica liberal, a Conferência Episcopal dos EUA publicou uma carta pastoral sobre a doutrina social católica e sobre a economia, em 11 de Novembro de 1984, na qual tomava duas posições fundamentais: em primeiro lugar, reconhecendo o impacte positivo do capitalismo ao nível da produção, condenava a imoralidade dos desequilíbrios sociais produzidos, afirmando que ao nível de desigualdade dos rendimentos da nossa sociedade, e sobretudo à escala mundial, é moralmente inaceitável»; em segundo lugar, a corrida armamentista e as armas nucleares eram igualmente condenadas. Não era necessária muita imaginação paia recordar imediatamente o complexo militar-induslrial que tanto preocupara Eiscnhower.
Enquanto o passivo das desigualdades se agrava em direcção ao sul do continente americano, praticamente todo ele dentro das fronteiras da geografia da fome, a denúncia pastoral leva a registos que a teologia da libertação recolhe, causando dúvidas sobre a admissibilidade das propostas, mas nenhumas sobre as injustiças denunciadas.
O avanço qualitativo da nova encíclica traduz-se em ultrapassar a condenação moral, que permaneceu, para relembrar a clamorosa violação dos direitos do Homem em todas as latitudes, e concluir pela necessidade de refazer os sistemas, de terminar com a violência sistémica que frustra os esforços dos povos mais desfavorecidos, tão responsável o capitalismo selvagem como o socialismo real.
Não é razoável perguntar pelo alinhamento político da mensagem, em função dos conceitos de progressismo e reaccionarismo, de esquerda e direita, e eventualmente dos alinhamentos partidários concretos de cada país, designadamente o país hospedeiro.
A milenária questão das relações da Igreja com o poder político teve no Concílio uma resposta para os novos tempos: ficou longe a época da legitimação do poder pela Igreja; foi esquecida a luta vivida entre a expulsão revolucionária liberal da Igreja e a acalmia concordatária, com o incitamento aos católicos para regressarem às tarefas políticas; no Concílio, foi a Igreja que se afastou do poder político, recusando a qualquer formação o direito de considerar-se sua filha dilecta. Para substituir os monarcas católicos, fidelíssimos, cristianíssimos, defensores da fé, não existe uma alternativa partidária ou governamental.
O desafio da globalidade, que espera por qualquer forma de governo até ao fim do século, é uma das tónicas das mensagens escutadas e, por isso, o apelo à paz e à redefinição da função que progressivamente vem sendo feita nesta área. Foi Pio XII quem, perante as ameaças de uma segunda guerra civil, a que chamamos guerra mundial, definiu o Ofício da Pacificação na alocução de 2 de Junho de 1939 dirigida ao Sacro Colégio, renovando a doutrina que constava da Encíclica Pacem, de Pio XI, publicada em 23 de Maio de 1920, e onde enunciava o preceito de que «a aproximação fraternal dos povos é um dever». Esse Ofício da Pacificação, em face da dura experiência deste meio século de «guerra improvável e de paz impossível», foi complementado por João Paulo II, em 17 de Outubro de 1986, com o espírito da Jornada de Assis, que pregou em Santa Maria dos Anjos, na Catedral de Assis e na Praça de São Francisco. Trata-se de chamar à convergência activa todas as religiões e credos, ao serviço da tese comum de que a paz é um bem supremo na Terra.
Alguns analistas têm dúvidas sobre a eficácia dos movimentos religiosos no sentido de contrariar os impulsos belicistas, mas pelo menos o renascimento dos fundamentálismos - eficazes em sentido contrário - deve levar a meditar sobre o risco de não se conseguir a convergência na responsabilidade pela paz.
Em suma, parece de admitir que nenhuma conjuntura se espelhou melhor no transnacionalismo católico, e as respostas da doutrina, a palavra vinda da cátedra apostólica, condicionam necessariamente, por aceitação ou repúdio, o discurso político global em que finalmente se integram as múltiplas alegações das potências, das internacionais, dos movimentos e das diversas crenças.
As intervenções de João Paulo II, nesta jornada peregrina, deram forma magistral e sistemática à mensagem que foi tomando forma ao longo destes anos de apostolado.
Se ter escolhido Fátima para se dirigir ao Mundo toca profundamente os católicos, não é descabida uma satisfação nacional por ele ter dirigido essa mensagem ao Mundo na língua portuguesa.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Também é de interesse mundial, e português, que tenha feito o balanço de cinco séculos de evangelização. Que tenha feito a definição do activo, porque do passivo há muito quem se tenha ocupado. Que tenha lembrado que não está tudo no Soldado Prático, de Diogo do Couto, porque o mais valioso continua nos Lusíadas, de Camões. Que tenha tornado visível que o Padroado, sobretudo o do Oriente, e o Acordo Missionário, definiram responsabilidades que foram assumidas em comum pela Igreja e pelo Estado, durante séculos, e que o resultado positivo está somado ao património comum da Humanidade. Que muito do povo de Deus, que o segue ao redor da Terra, tal como foi dito pelos bispos angolanos em Fátima, conheceu a fé por acção dos portugueses.

A Sr.1 Manuela Aguiar (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É gratificante que, neste fim de século, e avaliando tudo, o activo e o passivo, de novo tenha convidado os portugueses para as novas tarefas da evangelização, porque o povo português, como colonizador, não pode