O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

350 I SÉRIE-NÚMERO 12

tes estiverem privados do uso das faculdades mentais, se por qualquer outra razão houver grave dificuldade em os ouvir ou ainda se se tiverem mostrado indignos no seu comportamento para com o filho.
Este conjunto de dispositivos legais tem vindo a mostrar-se insuficiente por duas ordens de razões: ou porque o prazo de um ano que é preciso esperar para a declaração judicial de abandono se revela demasiado longo numa altura em que cada dia conta, ou porque o comportamento dos pais naturais, prejudicando embora gravemente a possibilidade de crescimento harmonioso do filho, se não integra suficientemente em nenhuma das situações que a lei prevê como justificando a ultrapassagem do seu consentimento.
Infelizmente, a recusa do consentimento assume por vezes contornos de puro e desprezível interesse material. Mas, mesmo sem aí se chegar, há que compreender o real sofrimento, a hesitação, a vergonha, o peso da pressão social, o medo das consequências que os pais - as mais das vezes, de facto, a mãe sozinha - sentirão ao meditar uma decisão que assume sempre contornos muito dramáticos.
Todos os que lidam com situações destas sabem com que frequência os pais - mais precisamente a mãe - deixam um filho entregue a terceiros pouco depois de nascer e alimentam em seguida durante muito tempo a ideia de que um dia, no futuro, se voltarão dele a ocupar. A princípio, as visitas são frequentes, depois vão-se espaçando, mas a ilusão de que as coisas mudarão impede os pais de enfrentar a realidade e faz eternizar uma situação que importa um enorme sofrimento para a criança e que compromete a sua integração numa família.
Noutras situações os pais manterão os filhos consigo, mas por real incapacidade, desinteresse ou sobrecarga praticarão no dia-a-dia pequenos ou grandes actos de rejeição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É claro que só perante cada situação concreta cuidadosamente estudada se pode concluir da possibilidade e conveniência da adopção. É claro que é necessário garantir, quando for caso disso, quer auxílio suficiente aos pais naturais para que eles assumam a paternidade, quer compreensão e ajuda quando a entrega para adopção, sempre muito dolorosa, é justificada em nome do interesse da criança e constitui, ela mesmo um acto de amor. Ao legislador cabe ern qualquer caso traçar um quadro que permita em cada situação uma actuação com a garantia de a decisão sempre há-de provir de um juiz.
Como conciliar, em nome do superior interesse da criança que a tudo se deve sobrepor, uma adequada tutela do consentimento dos pais, a garantia de segurança que exige quem quer adoptar e a necessidade vital do menor de que uma integração familiar se processe tão depressa quanto possível.

Vozes do PSD: -Muito bem!

A Oradora: - O Governo optou por estabelecer um processo de confiança, obrigatoriamente prévio ao processo de adopção (excepto se se tratar do filho do cônjuge do adoptante).
A confiança será administrativa ou judicial. A administrativa só será possível face à não oposição, nomeadamente dos pais, e só existirá para entrega do menor a candidato a adoptante ou confirmação da permanência daquele a cargo deste.
Compreendo ainda a posição daqueles que entendem que em caso nenhum a confiança administrativa deve existir e a confiança judicial deva ser sempre pressuposto de uma acção de adopção, embora não considere que a solução deva ser essa, porque me parece que há situações em que nem a confiança é necessária. Mas compreendo mal a posição daqueles que, não admitindo que a confiança judicial deva ser sempre pressuposto da adopção, entendam que então não vale sequer a pena proceder a uma confiança administrativa que algum controlo da situação permitirá pelo menos.
A confiança judicial, que assume uma importância nuclear nesta reforma, pode ter por destinatário uma pessoa, um casal ou uma instituição - não necessariamente quem pretenda adoptar -, e elimina a necessidade de consentimento dos pais ern futura adopção.
A confiança judicial garante assim segurança ao candidato a adoptante e é agora pelos seus pressupostos de aplicação que o legislador exprime as situações que considera passíveis de adopção e as condições em que - fora a alteração das faculdades mentais e a ausência - pode ultrapassar-se a falta de consentimento dos pais. São três as condições tipificadas: o abandono propriamente dito, situação em que a confiança judicial pode sobrevir imediatamente, e dois tipos de comportamento que, em ambos os casos, deve comprometer seriamente os vínculos afectivos próprios da filiação - exige-se ou que, com gravidade, os pais tenham posto «ern perigo a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação do menor» sem qualquer exigência de tempo, ou então que um «manifesto desinteresse» dos pais tenha durado pelo menos seis meses.
Alarga-se assim expressamente o tipo de comportamento dos pais que pode fazer passar sem o seu consentimento, e diminui-se de facto de doze para seis meses o período que antes era necessário à declaração judicial de abandono, o qual desaparece como instituto autónomo, sendo os seus pressupostos convertidos em uma das situações que podem conduzir à confiança judicial.
É uma solução que entendo corresponder ao equipamento dos interesses em causa a que acima procedi, que me parece tecnicamente adequada e que em qualquer caso deixa a avaliação da situação, como deve acontecer em casos como este, em última instância ao juiz que, nos termos previstos, «pode» confiar o menor, desde que obviamente entenda que o deve fazer, em julgamento de oportunidade e não de mera legalidade.
Pretende o Governo ainda flexibilizar alguns dos requisitos estritos da adopção, no que respeita a idades e a tempo de duração do casamento. Parece-me bem tal orientação, mas desejo ainda fazer uma observação.
Desejo lembrar que o juiz que decreta uma adopção não tem apenas de verificar se adoptante e adoptado têm a idade requerida, se há consentimentos, etc. Tem também de determinar se se está perante os quatro grandes requisitos gerais da adopção, a saber: que apresente reais vantagens para o adoptando, que se funde em motivos legítimos, que não envolva sacrifício injusto para outros eventuais filhos de adoptante, e que seja razoável supor que entre adoptante e adoptando se estabelecerá um vínculo semelhante ao da filiação.
Perante estes requisitos gerais que acrescem aos mais específicos, o juiz pode decretar a adopção.