20 DE NOVEMBRO DE 1992 549
estratégica, nós ou confiamos no Estado providência, no Estado administrativista, e temos a falência do modelo soviético, ou caímos na tese inversa da ocupação do espaço português pela capacidade externa de intervenção. Nem uma nem outra são necessárias nem aceitáveis em termos nacionais.
Daí a necessidade dessa afirmação. E essa afirmação passa por uma noção de dimensão, porque sem o mínimo de dimensão crítica as empresas não têm planeamento estratégico, não têm orientação estratégica.
A política do Governo, conduzida nos últimos anos e proposta no texto das Grandes Opções, assegura e mantém esta perspectiva.
Em primeiro lugar, a política de privatizações correspondeu a uma tentativa bem sucedida de minorar o carácter de dívida pública, mas constituiu também, na prática, um reforço das grandes empresas, dos grandes grupos, que são indispensáveis para Portugal poder concorrer.
Em segundo lugar, a política de manutenção de todos os incentivos fiscais, financeiros às políticas de aquisições, de fusões foi fundamental em Portugal e vai ser um aspecto fundamental a considerar no futuro.
Em terceiro lugar, a política que o sector empresarial do Estado gizou, no sentido de fomentar coligações de interesses entre várias instituições financeiras, constituiu a melhor forma de assegurar o mínimo de invenção crítica, para podermos intervir no estrangeiro e, sobretudo, para também intervirmos no mercado interno para nos defendermos.
Ao assegurar esta política, o Estado Português foi favorecedor de uma política patriótica, de uma política importante para a conciliação de todo o tecido empresarial português.
É por isso que esta política do Governo nos lembra um pouco o modelo que foi seguido na Holanda, um pequeno país como o nosso, com o mesmo número de população, com a mesma dimensão e com um tecido industrial também baseado numa dúzia de grandes empresas e num conjunto de pequenas empresas onde se irradiam os efeitos de dispressão, de irradiação, de subcontratação tecnológica que as grandes empresas fazem.
O modelo holandês, que está um pouco retratado nas Grandes Opções que o Governo apresenta, é um modelo correcto, necessário e inevitável para que continuemos.
Decorre ainda da questão da orientação estratégica das empresas um terceiro problema - o da sua internacionalização.
Verifiquei, com alegria, que nenhum partido da oposição contestou, nem sequer o discurso do Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território nem tão-pouco qualquer opção fundamental contida no Plano. Ê não contestou estas, em particular, porque elas são correctas, são justas e a oposição, além de não ter apresentado alternativa, o que também não se vai pedir- ninguém vai pedir àqueles que nada têm para dar que dêem alguma coisa -, mas, sobretudo, não se lhes pediu o reconhecimento do mérito e da importância desta política.
A internacionalização da economia portuguesa é fundamental, porque é preciso passarmos da noção dos 10 para os 300 milhões. Simplesmente, em Portugal houve a sensação e a percepção de se viver muito tempo do ênfase do campo produtivo. E, Srs. Deputados, se compararmos o preço de um bem produzido em Portugal e vendido no estrangeiro e o preço de produção (da fábrica portuguesa), constata-se que o preço por que é vendido no mercado
exterior é mais do dobro, na maior parte dos casos, do preço de produção. O que é que isto significa? Significa que o nosso ênfase no tecido produtivo português não pode estar meramente na produção, tem de estar na intermediação, tem de estar no passo a jusante da produção. Para isso, de que é que carece? De diagnóstico, de percepções, de apoios financeiros.
O PAEP, o plano de apoio do Estado Português à internacionalização das empresas portuguesas é, por isso, vital, é a única maneira de conseguirmos compensar dificuldades que, boje em dia, encontramos no campo da produção e compensarmos com alguns ganhos, com algum valor acrescentado adicional. Aquilo que não obtivermos na produção vamos encontrar na intermediação.
É fundamental esta política que o Governo propõe, propondo até meios de implementá-la e apoiá-la. Não podemos deixar de ficar satisfeitos e de contemplar esta política, mas não só nesta como noutras áreas o Governo quer apoiar, dependendo, naturalmente, da capacidade empresarial portuguesa conseguir obtê-la.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste inciso, vale a pena meditarmos sobre, talvez, uma questão nova, um paradigma novo, que este Plano nos traz. Em Portugal, durante muito tempo, houve a concepção de uma separação, quase de uma dicotomia: sector público/sector privado. Uns defendiam que o Estado devia ser meramente regulamentador, que não devia intervir directamente na economia; outros consideravam que era fundamental que o Estado assumisse a propriedade e a gestão dos grandes meios de produção.
A proposta deste Governo é extremamente original, é talvez o conteúdo mais original, mais inovador de um moderno Estado, imbuído de uma óptima social-democrata para combater esta dicotomia que é falsa. Hoje em dia, não faz sentido a defesa meramente de uns ou de outros; faz sentido, sim, o reforço da capacidade nacional. É por isso que a proposta que este Governo faz é de uma intervenção directa do Estado nas empresas com viabilidade, com capacidade, com um plano de horizontalidade determinado, de modo a propiciar a sua reconversão, a sua internacionalização e assegurar postos de trabalho permanentes e auto-sustentados.
A versão que o Governo nos propõe, que está a praticar desde há um ano e meio e que está orientada e reforçada nestas Grandes Opções, consagra esta moderna visão do Estado que para além das funções normais tradicionais num Estado providência também procura compensar a debilidade do tecido empresarial, apoiando o que deve ser apoiado.
Mas mais: nesta proposta o Estado não quer só apoiar quem deve ser; quer fornecer um quadro geral de informação, diria, de parceria com as empresas, com o tecido produtivo, de modo a fornecer-lhes a informação, a análise das vulnerabilidades, que muitas das empresas portuguesas ainda hoje não dispõem. Trata-se de um paradigma novo, de um paradigma de coligação, de parceria, joint venture, entre o Estado e as empresas, de modo a criarem-se condições para o sucesso desse mesmo tecido empresarial.
Com isto, ficam em causa todos aqueles que nos acusam de ultraliberalismo. Ultraliberalismo é a perspectiva daqueles que não se preocupam com o futuro, os que não têm pena dos que sofrem, que não sentem pena nem dor por aqueles que um dia podem perder o emprego.
Ser ultraliberal é escamotear a realidade humana. As propostas deste Governo procuram não só propor mas fazer, até comparticipar.