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648 I SÉRIE — NÚMERO 18

a pena perguntar se um dos grandes défices do processo que conduziu a Maastricht não é, precisamente, a carência de reflexão cultural.
Como podem os cidadãos identiíïcar-se com as normas e os mecanismos de acção comunitária preconizados se não lhes são transmitidos os fundamentos das escolhas feitas?
Só uma informação e uma pedagogia políticas enraizadas nos valores culturais que singularizam a identidade europeia teriam permitido aos povos da Europa exercer a sua cidadania face ao Tratado da União com lucidez e consciência.
Essa pedagogia não foi feita. Mas, se queremos recuperar algum do tempo, perdido, urge alertar a opinião pública para o significado cultural das principais opções em jogo.
Todos os tratados que a história produziu são, de algum modo, um espelho da sociedade que os viu nascer. Se o nosso espelha o primado da economia sobre a cultura, se dá prioridade aos instrumentos sobre os fins e se subordina, por vezes, à burocracia mecanismos de decisão democráticos, temos de ter consciência que esse foi o «espírito do tempo» em que ele foi gerado.
Com a aceleração histórica, que é marca deste fim de século, é legítimo esperar que as limitações que hoje apontamos não sejam as mesmas que apontaremos amanhã. O «espírito do tempo» evolui.
Por isso, numa perspectiva cultural, ratificar o Tratado não é apenas assumir uma determinada etapa histórica; é também, e simultaneamente, fazer confiança à etapa futura, etapa que desejamos que seja de maior participação democrática, de maior ênfase na Europa dos povos e dos cidadãos, de maior visibilidade, afinal, do projecto não: só material mas também espiritual, que é a verdadeira marca do continente europeu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A discussão cultural global que a ratificação de um tratado como o de Maastricht toma patente não nos faz esquecer uma outra dimensão que o mesmo Tratado contém: a da política a desenvolver pela Comunidade no que se refere à cultura, entendida agora no seu sentido restrito, como esfera da vida social com autonomia própria.
Propõe-se a Comunidade contribuir (cito o artigo 128.°): «[...] para o desenvolvimento das culturas dos Estados membros, respeitando a sua diversidade nacional e regional e pondo simultaneamente em evidência o património cultural comum».
Nesse objectivo genérico, inscrevem-se os domínios; em que a acção da Comunidade incentivará a cooperação entre Estados membros e, se necessário, apoiará e completará a sua acção. São eles: a «melhoria do conhecimento é da divulgação da cultura e da história dos povos europeus»; a «conservação e salvaguarda do património cultural de importância europeia»; os «intercâmbios culturais não comerciais», e a «criação artística e literária, incluindo o sector audiovisual».
Valeria a pena perguntar o que se fez e o que está a fazer-se entre nós em ordem à implementação destas trocas. Como o tempo o não permite, questiono, apenas como exemplo, a primeira área mencionada: que iniciativas estão em marcha no sentido de darmos o nosso contributo para que a história e a cultura do nosso país sejam melhor conhecidas pelos outros europeus? E, recriprocamente, em que medida está o nosso sistema de ensino preparado para transmitir aos jovens uma visão mais europeia da história e da cultura do continente?
Deixo estas interrogações no ar, acreditando que, na era pós-Maastricht, elas venham a merecer do nosso e dos outros governos europeus a atenção que merecem.
Uma última nota relativa ainda ao artigo 128.°
Ao contrário do que por vezes se tem dito, a política cultural de que se fala neste artigo não é um acréscimo dispensável nem uma flor de retórica colocada no Tratado apenas para consolar alguns espíritos inquietos. É uma dimensão transversal que se pretende tomar presente em todos os aspectos da acção comunitária. E a alínea 4) di-lo claramente: «A Comunidade terá em conta os aspectos culturais na sua acção, ao abrigo de outras disposições do presente Tratado.»
Ora, è esta transversalidade que gostaríamos de ver também consagrada na política cultural interna do nosso país.
Num mundo cada vez mais marcado pela interdisciplinaridade, não pode a cultura continuar a circunscrever-se a um pequeno sector da gestão pública, satisfeito por poder contar com alguns trocos de outras despesas que o Orçamento do Estado considera prioritárias.
É preciso que todas as decisões políticas, nacionais e comunitárias, tenham um coeficiente cultural explícito. Sem essa dimensão, continuaremos emparedados nos compromissos (para não dizer contradições) que todos, mesmo os que apoiamos a ratificação do Tratado, nele reconhecemos.
Sem ela, avançaremos talvez na construção de uma Europa de funcionários e contabilistas, mas não avançaremos, certamente, no percurso mais lento da construção da Europa das culturas, a única que constitui uma base sólida para a edificação do futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos nem, tão-pouco, tempos disponíveis, declaro encerrado o debate.
A próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, a partir das 10 horas, com a continuação do debate sobre a proposta de resolução n.° 11/VI — Aprova, para ratificação, o Tratado da União Europeia, assinado em Maastricht em 7 de Fevereiro de 1992.

Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

António do Carmo Branco Malveiro.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
Joaquim Vilela de Araújo.
Leonardo Eugênio Ramos Ribeiro de Almeida.
Luís Carlos David Nobre.