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19 DE FEVEREIRO DE 1993 1467

sido acompanhada de alguns efeitos indesejáveis, na medida em que dela emergiu uma delinquência de carácter internacional, não raro praticando actos criminosos com laivos de alguma impunidade, pois os delinquentes aproveitam-se de conhecidas limitações dos regimes jurídicos existentes em matéria de competência extraterritorial, dificultando, assim, a aplicação da lei penal.
Este estado de coisas não pode ser contrariado exclusivamente através do recurso à extradição, exigindo formas de cooperação internacional diversificadas que, por um lado, permitam a efectiva aplicação da lei e, por outro, tenham presentes os fins ressocializadores das penas e medidas de segurança.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na verdade, as dificuldades inerentes a barreiras linguísticas e culturas, a impossibilidade de contacto com a família, poderão conduzir a uma execução da sentença penal em termos humanitariamente inaceitáveis, de acordo com os parâmetros de política criminal e de salvaguarda dos direitos do homem actualmente defendidos pela generalidade das sociedades civilizadas.
Portugal, pela sua tradição conhecida nestas matérias, desde logo se revelou sensível à aceitação desta Convenção, que assinou ainda em Março de 1983.
Impunha-se, no entanto, na que concerne a aspectos específicos da Convenção, aprovar legislação interna que expressamente os viesse a contemplar. Surgia, assim, o Decreto-Lei n.º 43/91, de 22 de Janeiro, aprovado pelo anterior governo, que regula exaustivamente a cooperaçâo internacional em matéria penal e prevê, nos artigos 106.º a 115.º, a matéria atinente à transferência de pessoas condenadas.
Ao mesmo tempo, o referido decreto-lei abriu as portas a que o nosso país viesse a iniciar os processos dê ratificação de algumas convenções internacionais, o que antes não sucedera porque se impunha, como referi, que a legislação interna contemplasse institutos jurídicos em matéria de cooperação internacional, como aconteceu com a entrada em vigor do supracitado decreto-lei.
Confrontando o texto da Convenção em análise com a legislação nacional, concluiu-se que a aludida Convenção assenta numa filosofia de política criminal que assume como objectivos primordiais a reinserção social e a ressocialização dos condenados.
Essa mesma filosofia, no que respeita aos fins das penas, impregna claramente a legislação constitucional, penal e processual penal portuguesa.
Assim, a aceitação do presente instrumento jurídico não suscita quaisquer problemas de conciliação com o nosso ordenamento jurídico, pelo que não se afigura necessária a emissão de reservas à Convenção para efeitos de ratificação.
E aconselhável, no entanto, exarar as declarações que vieram a ser exaradas, pelas quais o nosso país, nomeadamente, define o conceito de nacionalidade e fica com a possibilidade de apreciar a sentença condenatória, por forma a ser conformada com o nosso ordenamento jurídico pelo mecanismo da conversão.
Daqui resulta que a transferência terá destinatários estrangeiros e também apátridas com residência habitual no país para onde são transferidos, mas impede-se quê cidadãos portugueses com residência habitual no estrangeiro aí cumpram pena resultante de condenação em Portugal.
Por outro lado, as sanções executáveis em Portugal hão-de obedecer aos princípios constitucionais e penais existentes entre nós e quê impedem três hipóteses a que a Convenção faz referência: a execução de pena indeterminada, de medida de segurança de duração indeterminada e o chamado princípio da «dupla via», que se traduz na aplicação cumulativa de pena e medida de segurança a pessoa imputável, em razão da prática do mesmo crime.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, encontrando-se a Convenção Europeia sobre a Transferência de Pessoas Condenadas conforme ao nosso ordenamento jurídico, constitucional e ordinário, razões não existem para deixar de se ratificar este importante instrumento jurídico que marca mais um relevante passo em sede de cooperação internacional em matéria penal.
É o que o Governo solicita a esta Câmara.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, V. Ex.ª falou na filosofia de reinserção social que anima o sistema penal português. E assim é!
No entanto, gostaria só de lhe fazer algumas perguntas sobre a prática. É que de filosofia já estamos um bocadinho cheios, filosofia que vem, nas leis, que brota do sistema jurídico, mas, quando se chega à prática, a filosofia perdeu-se no caminho.
Gostava que V. Ex.ª me confirmasse se é ou não verdade que o sistema prisional português se encontra, neste momento, com mais de 10 000 reclusos, ou seja, o maior número, desde sempre, na história prisional portuguesa. E se efectivamente assim é, é ou não verdade também que, na maior parte dos estabelecimentos prisionais centrais, estão dois e três reclusos na mesma cela? E se assim é, como parece ser, o que é que o Governo tenciona fazer?
Gostaria também de perguntar a V. Ex.ª, sabido como é, que se encontram nas prisões portuguesas, neste momento, mais de 1000 reclusos de nacionalidade estrangeira, o que é que o Governo tem feito em matéria de acordos bilaterais e de práticas, digamos, ao abrigo de princípios que já constam no direito interno português e que a ratificação da Convenção vem, agora confirmar, no que diz respeito à ressocialização e à reinserção social desses reclusos.
A última questão que gostaria de lhe colocar tem a ver com o facto de V. Ex.ª falar da necessidade de o recluso ter contactos com o seu meio familiar, com a comunidade. Gostaria que V. Ex.ª me desse, se os tiver, números de condenados e preventivos que se encontrem a cumprir pena ou em situação de prisão preventiva - que ainda persiste em mais de 25 %, neste momento - no continente e sejam provenientes, por exemplo, das ilhas da Madeira e dos Açores, ou que sejam de Trás-os-Montes e estejam a cumprir pena no Alentejo, ou vice-versa, uma vez que não podemos falar de boas intenções em relação aos condenados estrangeiros e ficamo-nos só pela filosofia no que diz respeito aos condenados portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.