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1606 I SÉRIE -NÚMERO 45

A questão que se coloca - e podemos fazer essa discussão de uma forma mais alargada noutra ocasião, uma vez que não é propriamente esta, julgo eu, a ocasião própria para esse efeito - é a de saber se entendemos ou não que, num espectáculo que é pago e que tem despesas, se deve ou não englobar nessas despesas o policiamento a esse mesmo espectáculo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Desde a 2.º revisão constitucional que foi estabelecida a incumbência do Estado (artigo 79.º da Constituição) de "prevenir a violência no desporto".
Se é verdade que nunca houve entre nós, felizmente, acontecimentos tão graves como já vimos acontecer noutros países, designadamente em estádios de futebol, a verdade é que já tem havido problemas, nalguns casos sérios, a nível de violência nos estádios, pelo que a questão fundamental é, acima de tudo, a de prevenir de modo a que esses acontecimentos não aconteçam. É que não é só depois de acontecerem fenómenos de violência extremamente graves, como já vimos, infelizmente, noutros países, designadamente europeus, que teremos de tomar medidas. Temos de tomar medidas para prevenir que esses acontecimentos de violência possam acontecer nos nossos estádios.
O que nos parece é que este decreto-lei sobre o policiamento nos recintos desportivos enferma de um grande demissionismo e de alguma irresponsabilidade a esse nível, na medida em que dispõe que a requisição da força policial é facultativa e da responsabilidade dos organizadores, a menos que os recintos tenham sido declarados interditos nessa época. Esta é a velha máxima do "depois de casa roubada, trancas na porta",...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... nada se fazendo para que, antes de os acontecimentos terem lugar, estes possam ser prevenidos.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Creio, aliás, que o que aqui foi dito a propósito da situação que este decreto-lei gera no exemplo dos campeonatos de futebol da 1.º Divisão é extremamente significativo. É impensável para qualquer um de nós a realização dos jogos de futebol, inclusivamente de alto risco, sem a presença de forças de segurança, mas isso só não acontece porque os clubes não são irresponsáveis, uma vez que, à face deste decreto-lei, isso podia perfeitamente acontecer.
Por outro lado, é também bastante grave que se refira, no artigo 3.º, que "a responsabilidade pelos encargos com o policiamento de espectáculos desportivos realizados em recintos desportivos é suportada pelos respectivos organizadores". Sendo obviamente de considerar que, no caso do desporto profissional, os clubes possam assumir, pelo menos, uma parte da responsabilidade com esses encargos, parece-nos que o Estado não deve demitir-se dessa responsabilidade, porque a segurança dos cidadãos é, sobretudo, responsabilidade sua. Escusado será dizer que, no caso das modalidades amadoras ou das modalidades profissionais naqueles segmentos que são praticados sob forma amadora, que é o caso dos escalões inferiores e, também, das distritais, entendemos que o Estado não deve fugir às suas responsabilidades com o policiamento desses recintos e que esses jogos também têm, obviamente, problemas a nível da segurança dos cidadãos, ou podem vir a tê-lo.
É do conhecimento geral que a solução que o Governo encontrou na primeira versão deste decreto-lei (porque este diploma tem, de facto, duas versões) não agradou a ninguém, na medida em que se pediram aos clubes que adiantassem dinheiro, que eles, obviamente, não tinham. Ora, isto criou as situações que todos conhecemos, ou seja, de protesto por parte de vários clubes, designadamente de escalões de futebol amador, e acabou por haver uma segunda versão deste decreto-lei, que foi feita da pior maneira - creio que é importante que tenhamos aqui consciência disso.
O que o Governo fez, um mês depois da publicação deste decreto-lei, foi uma declaração de rectificação no Diário da República que não é nenhuma rectificação, são alterações substantivas ao decreto-lei. Ora, o Governo não pode fazer isto, porque senão qualquer dia, numa revisão constitucional, teremos de prever a figura da chamada "rectificação das declarações de rectificação" que são publicadas no Diário da Republicai

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A declaração de rectificação serve para corrigir gralhas, inexactidões do texto do decreto-lei, e não foi isso que se passou. E é evidente que o Governo não levaria um mês a descobrir esses erros. Quando se diz: "onde está ano económico deve ler-se mês", obviamente que isto não é a alteração de uma gralha, mas a correcção daquilo que o Governo viu que tinha feito mal. Quando, a propósito do artigo 9.º, se prevê "dois representantes das federações" e o Governo verifica que se esqueceu de dizer "sendo um deles representante da Federação Portuguesa de Futebol (FPF)", é evidente que isto não é correcção de nenhuma gralha, mas a verificação por parte do Governo do esquecimento da FPF, que tinha de contemplar. Quando se diz, no artigo 10.º: "onde se lê campeonatos deve ler-se competições", obviamente que se estão a ler coisas completamente diferentes. Há, pois, aqui um abuso do instituto de declaração de rectificação que não pode passar em claro, sob pena de o Governo fazer as versões que entender e alterar como entender diplomas legislativos sob a forma de uma simples declaração de rectificação que consta do Diário da República e para a qual muito poucos reparam. Portanto, aquilo que estamos a discutir aqui já não é o decreto-lei cuja ratificação foi pedida pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Creio, pois, que temos de ter em atenção estas situações para que não se repitam, uma vez que são extremamente graves do ponto de vista institucional e, mesmo, do ponto de vista do Estado de direito; por isso o reparo.
Uma última questão, Sr. Secretário de Estado: têm sido tornadas públicas, através da comunicação social, afirmações de responsáveis, designadamente do seu Ministério, de que as verbas disponibilizadas nos termos deste decreto-lei e que advêm do Totoloto não vão chegar até ao fim da época, o que poderá colocar uma situação grave. Essas notícias referem também que em final de Fevereiro, princípios de Março, já seria possível ter uma avaliação sobre