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18 DE MARÇO DE 1993 1747
visibilidade, mais controlabilidade no agir público, seja no estatuto da decisão pública seja no estatuto do decisor público.
Devem ser dadas ao País razões para acreditar que menos actos de corrupção ficarão impunes. Mas são-lhe sobretudo devidas razões para acreditar que as instituições e o seu procedimento são reformulados de forma a diminuírem substancialmente as ocasiões de corromper e ser corrompido e que, por isso, nelas pode fundadamente depositar mais confiança.
A corrupção é filha da opacidade, do segredo, da complexidade burocrática e do excesso de regulamentação, da discricionariedade e do casuísmo nas decisões públicas. É por isso que a nossa perspectiva de combate à corrupção tem um alcance e uma ambição e uma cultura pública de referência de todo diferentes das que o Governo aqui manifesta.
No nosso programa são peças essenciais a abertura dos processos administrativos e a adequada publicidade das decisões, a simplificação burocrática, a transparência e a sujeição a controlo público das contas dos partidos políticos, o acesso do público às declarações de património e rendimentos dos titulares de cargos políticos e equiparados, ao registo dos seus interesses e às respectivas declarações de IRS - tudo medidas que insistentemente vimos propondo sem que tenhamos obtido até ao momento a anuência da maioria.
Na linha dessas preocupações, quisemos assinalar hoje a diferença de perspectiva que nos separa de uma leitura redutora do tratamento institucional da corrupção, apresentando dois projectos de lei, a cuja entrega à Mesa procederei no termo desta intervenção. Um prevê a realização de auditorias à aplicação de fundos estruturais, através de entidades independentes, seleccionadas por concurso público por iniciativa da Assembleia da República ou do Governo; o outro assegura a publicidade das decisões de entidades públicas que atribuam benefícios a particulares.
O Estado -e, em Portugal, em particular a partir da adesão às Comunidades - é hoje um enorme distribuidor de vantagens a particulares, através de subsídios, subvenções, incentivos, donativos, prémios, ajudas, compensações, restituições, perdões, dilação de dívidas e indemnizações não fixadas judicialmente. É preciso que tudo isso passe a ser decidido e aplicado sob a luz da publicidade, para que a corrupção e o desvio encontrem dificuldades, resistências, controles e desencorajamentos que até hoje têm faltado.
Srs. Deputados da maioria, o nosso desafio é: dêem connosco um passo contra a corrupção, aprovando os nossos projectos e fazendo com que a publicidade e a transparência adquiram direitos que lhes têm faltado nas nossas leis e nos nossos costumes políticos.
A restrita proposta que o Governo hoje nos traz, no termo de tão absorventes e reservados trabalhos preparatórios, se é frustrante como sucedâneo de um verdadeiro programa de combate à corrupção, inspira-nos, nas suas ambiguidades e imprecisões de concepção e redacção - aliás, já aqui admitidas -, interrogações e dúvidas sérias, nomeadamente em sede de constitucionalidade.
Que tipo de ordens genéricas de levantamento de segredo profissional poderão ser compatíveis com um juízo de adequação e proporcionalidade entre o sacrifício do segredo profissional e os concretos condicionalismos de uma situação investigatória?
Até onde se pretende e se poderá ir no domínio de uma legitimação ou de uma pré-credenciação dita judiciária de actos de colaboração e que actos de colaboração se tem em vista?
Até que ponto, numa sociedade democrática, pode um programa de luta contra a corrupção assentar no paradigma de uma sociedade de delatores, como bem prevenia o Procurador-Geral da República?
Quem decide, em última análise, da suspensão do processo num modelo em que o requerido é apenas «a concordância do juiz de instrução criminal?»
Inclui o Governo, nas acções preventivas, os inaceitáveis «pré-inquéritos», em que, à semelhança do que se passava em processos de averiguações sumários de dezenas de volumes, se acumule informação sobre cidadãos sem que estes tenham conhecimento desse processo de armazenamento, mesmo quando se não confirmam as suspeitas de que sejam alvo?
Tomei agora boa nota das respostas do Sr. Ministro às perguntas da Sr.ª Deputada Odete Santos e do Sr. Deputado Vera Jardim, mas voltaremos ao tema na especialidade.
A atribuição de uma competência, dita exclusiva, à Polícia Judiciária prejudica ou não, conforme já foi publicamente equacionado, a possibilidade de o Procurador-Geral da República entender de outro modo?
São, entre muitas outras, interrogações e suspeições que esta proposta, desacompanhada de um projecto de decreto-lei, não esclarece e que um diálogo recusado não pode ajudar a ultrapassar.
É doentio que se tenha chegado ao início deste debate com incertezas em relação a questões tão fundamentais como estas. É ainda mais doentio que possamos ter chegado a esta fase do debate sem que algumas dessas incertezas tenham sido cabalmente dissipadas. Esperamos que o Governo queira dar provas de bom senso antes da conclusão deste processo legislativo, arrepiando caminho em relação à postura inaceitável em que até agora se colocou em relação ao Parlamento, de modo a poder apurar-se a forma do diploma e clarificar os seus pontos obseuros. E esperamos, sobretudo, que o nosso repto de fundo seja aceite.
Acompanhem-nos, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados da maioria, num programa mais ambicioso de combate à corrupção que inclua reformas institucionais que levem mais transparência e publicidade, para começar, às decisões e ao estatuto dos titulares de cargos políticos e decisores públicos equiparáveis. O País tem, neste domínio, direito a mais e a melhor. Tem direito ao que não foi trazido aqui hoje, a um verdadeiro programa de combate à corrupção à altura dos desafios e ameaças que neste campo se colocam à sociedade portuguesa neste fim de século e, ouso dizê-lo, neste fim de capítulo político.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Propõe-se o Governo, com a proposta de lei em debate, adoptar um conjunto de soluções de índole substantiva, adjectiva e organizatória pré-ordenadas a melhorar a actuação das instâncias formais de controlo na prevenção e perseguição, no domínio da corrupção e da criminalidade económica em sentido amplo, daquilo a que, com os Franceses, podíamos designar criminalité dês affaires, o que em Espanha se chamam delitos sócio-económicos e que os alemães tratam como Wirtschqftskriminalitaet, uma realidade que, no plano da teoria criminológica, vem sendo