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25 DE JUNHO DE 1993 2803

É igualmente um erro dizer-se que os partidos políticos são associações privadas, porque são mais do que associações privadas: sendo associações privadas, são associações privadas com consagração constitucional. Como diria um conhecido constitucionalista, os partidos políticos situam-se no ponto nevrálgico em que convergem o poder do Estado, juridicamente sancionado, e o poder da sociedade, politicamente legitimado. Os partidos políticos são o meio termo entre um órgão de participação e gestão do Estado e uma associação privada.
Nesse sentido, é absolutamente adequado que o Tribunal de Contas faça a apreciação das contas públicas ou até de contas privadas, por maioria de razão, de uma entidade - um partido político - que é mais do que uma entidade privada, com a vantagem - não havendo da nossa parte qualquer suspeição em relação ao Tribunal Constitucional e à Comissão Nacional de Eleições - de algo que justifica a existência dos tribunais. Um tribunal de família, um tribunal de menores, um tribunal cível e um tribunal criminal distinguem-se em função da sua especialização. O Tribunal de Contas é um tribunal especializado em aferir contas públicas ou privadas no limite. Logo, tem uma capacidade técnica e de especialização que o Tribunal Constitucional não tem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, não direi que se trata, até por uma questão de rigor histórico, de uma concepção republicana e laica. As monarquias constitucionais, no que diz respeito à sociedade civil, a expressão dessa sociedade civil, como a democracia e as formas da vida política, e até, nalguns casos, a algumas experiências republicanas, como foi, por exemplo, a portuguesa (sem querer entrar aqui em debate histórico), tem também, com certeza, mais tradição democrática e liberal.
Quanto a ser ou não laica, também, em bom rigor, não utilizaria esse termo. Chamar-lhe-ia, sim, uma concepção civilista da vida pública. A cultura política americana, por exemplo, é fortemente impregnada de ideias sobre a Uberdade que têm origem religiosa e nem por isso muitas das formas da acção política nos parecem laicas. Trata-se de uma questão de mera precisão terminológica.
O que é essencial afirmar neste debate é que a forma de organização do sistema político deve, desde logo, resultar de um princípio de cidadania, pelo qual os homens tomam conta dos seus próprios destinos através de uma atitude volitiva, cultural, civilizacional. É essa atitude que dá origem à democracia e esse carácter volitivo da acção dos homens que nós, como mandatários exactamente do exercício desse poder e desses direitos, temos sempre de reafirmar.
No que diz respeito às compatibilidades, limitei-me a exprimir a seguinte preocupação evidente: quando há uma contradição ou um conflito entre os interesses privados de um político em exercício das suas funções públicas, deve funcionar o princípio da incompatibilidade. Não tenho qualquer dúvida sobre esta matéria. Esse é que é o princípio essencial das incompatibilidades!
Alargar as incompatibilidades ao exercício profissional e levá-las ao ponto em que os cidadãos com um mandato político, que - insisto - é efémero pela sua própria natureza, perdem, pelo exercício desse mandato, a possibilidade não só de voltar à sociedade de onde vieram como ainda a possibilidade de exercer a profissão e, obviamente, perder aquilo que os liga à sua vida material e aos seus proveitos cria duas coisas terríveis, que devemos evitar.
É que, por um lado, essa tentação transforma esta Assembleia numa espécie de grupo de funcionários públicos, que não são funcionários directamente do Estado mas que acabam por ser funcionários dos partidos, o que gera, evidentemente, um mecanismo de servidão partidária. Ora. para acabar com o princípio da servidão partidária e estabelecer aquilo que deve ser a servidão a quem representamos e aos interesses do Estado e da Nação, só há duas formas: alterar a legislação eleitoral no sentido de reforçar o mandato e a responsabilização individual do Deputado face a quem o eleja e garantir que objectivamente as pessoas possam sair com a mesma liberdade com que entraram. Mas para poder sair com a mesma liberdade com que entro não posso cair num vácuo, sem profissão, sem relação concreta com a sociedade.
O segundo aspecto dessa tentação, do qual pouco falámos, ainda é pior: é que não podemos criar uma situação pela qual progressivamente, por via de uma espécie de profissionalismo político, que sem dúvida é exigido pela especialização das nossas funções, percamos contacto com os problemas da sociedade, a começar pelos problemas que nos facultaram os nossos conhecimentos particulares. Por exemplo, os Srs. Deputados que são advogados, médicos, professores ou operários não podem nem devem perder aquilo que correspondeu à sua experiência de vida, ao seu conhecimento de uma realidade particular, e que fez com que se tomassem notórios do ponto de vista quer privado quer público.
Penso, em suma, que deveremos ter muito cuidado nesta matéria, porque as decisões que tomarmos sobre incompatibilidades, remunerações dos cargos políticos, carreiras, regalias ou não regalias e direitos e deveres irão inevitavelmente condicionar - e já estão a condicionar - as escolhas. Já estão, muitas vezes, a condicionar as escolhas de forma perversa, ou seja, já estão, nalguns casos, a impedir que se escolha quem se quereria. Isso é verdade para o Parlamento, para as autarquias, para o Governo. Por muito pouco popular que o seja, isso deve ser dito com clareza por nós, que temos essa responsabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas isso nada tem a ver com a dedicação que as pessoas devem emprestar ao exercício de funções políticas. Trata-se de duas coisas corripletamente distintas: as condições que escolhermos podem condicionar o estado em que esta Casa estará daqui a uns anos.
Penso que devemos dizer com toda a clareza aos cidadãos que nos elegeram - digo-o muitas vezes - que não é por esse caminho que poupam e criam as melhores condições de escolha e que eles próprios têm todo o interesse em ser representados não só pelas pessoas mais qualificadas no plano técnico, como também pelas pessoas mais qualificadas no plano político e mais prestigiadas perante a opinião pública.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.