3313 - 13 DE OUTUBRO DE 1993
O Sr. Presidente: - Então, Sr. Deputado, tem a palavra para esse efeito.
O Sr. José Paulo Casaca (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, o senhor referiu expressamente; na sua intervenção, a Convenção de Berna e disse que a reportagem da RTP demonstra a caça ao golfinho nos Açores.
Sendo assim, começo por perguntar ao Sr. Deputado se, de facto, tem consciência de que, mesmo antes da ratificação ou, pelo menos, da transposição para a lei portuguesa da Convenção de Berna, já se encontrava proibida a caça ao golfinho na Região Autónoma dos Açores, na sequência de uma iniciativa legislativa do Partido Socialista.
Por outro lado gostava de saber se o Sr. Deputado tem também em consideraçâo que, nos Açores, contrariamente àquilo que se passa, por exemplo, nos Estados Unidos da América - embora limitado pelo facto de o golfinho ter morrido acidentalmente, em resultado de artes de pesca, como, por exemplo, a de cerco -não é permitida a comercialização da carne de golfinho nem que ela seja servida em qualquer restaurante.
Gostava ainda de saber se o Sr. Deputado André Martins tem consciência de que a generalidade da população que se dedica à pesca, não à artesanal mas à pesca dita industrial, nos Açores, não é, sequer, originária dos Açores e sim do Continente, da Região Autónoma da Madeira e até mesmo de Cabo Verde,' e que, em larga medida, traz para os Açores 'as suas práticas habituais de pesca
Quero ainda perguntar ao Sr. Deputado se tem consciência de que a caça ao golfinho não se pratica de uma, forma generalizada nos Açores e de que os Açores não tem', de forma alguma, o monopólio desse tipo de actividade. Registaram-se acontecimentos em que, por várias ocasiões, a Marinha detectou, e multou mesmo, embarcações de pesca, ao largo da costa do, Continente, que, de facto, caçaram golfinhos. Não se trata, portanto, de uma prática que seja restrita aos Açores. Em último lugar, gostaria de saber se o Sr. Deputado tem consciência de que quem, de acordo com a própria legislação regional aprovada já há 10 anos, é responsável pela fiscalização e, portanto,, por que se impeça a, captura de qualquer golfinho, são as autoridades marítimas, isto é, a Marinha portuguesa, tanto nos Açores como no Continente.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.
O Sr. André Martins (Os Verdes) - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Paulo Casaca, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que, embora tendo consciência de todas as questões que colocou, não se trata aqui de uma questão de consciência no sentido em que a referiu. Do que se trata, sim, em nosso entender, é de tomarmos conhecimento de determinados factos, também do conhecimento da opinião pública portuguesa, que põem em causa o bom nome de Portugal relativamente ao cumprimento dos compromissos assumidos perante a comunidade internacional. Estão também em causa os interesses de Portugal nas relações comerciais com o exterior e, designadamente, os interesses do povo açoreano. É que uma grande parte das conservas exportadas, nomeadamente para os Estados Unidos, têm origem nos Açores.
Do nosso ponto de vista, são estas as questões que aqui se colocam Por isso, afirmações como, por exemplo, as do Sr. Deputado Mano Maciel - hoje, aliás, ausente, talvez por ter outras tarefas mais importantes do que esta de continuar o debate que iniciámos aqui na última Comissão Permanente.
A Sr.ª Conceição Castro Pereira (PSD): - Está no estrangeiro!
O Orador: - ... dizendo que os grandes responsáveis por esta situação foram os repórteres da RTP, são juízos de valor, que apenas registamos mas que, no decorrer da audição parlamentar por nós proposta, o Sr Deputado certamente poderá demonstrar. Caso contrário, lamentamos que o Sr Deputado tenha tomado essa posição aqui, na Assembleia da República.
De facto; para nós, o que importa é acabar com as especulações. Todos sabemos, Sr. Deputado, que há notícia de que, com alguma regularidade, os pescadores são acusados de capturar nas suas redes golfinhos ou outras espécies protegidas. Essa é, portanto, uma situação, digamos, normal na actividade da pesca, se considerarmos como normal o facto de estas espécies serem apanhadas nas malhas que, por lei, são autorizados a utilizar
Por outro lado, trata-se aqui também de cumprir a legislação internacional, designadamente a Convenção de Berna, relativa à conservação da vida selvagem e dos habitat naturais, que Portugal transpôs para a legislação nacional através do Decreto-Lei n.º 316789, regulamentando a aplicação dessa Convenção à legislação nacional sobre a protecção dos habitat naturais e das espécies em vias de extinção, e também o Decreto-Lei n.º 114/90, que promove a aplicação da Convenção sobre o comércio internacional das espécies da fauna e flora selvagens ameaçadas de extinção, como é o caso dos golfinhos-toninhas nos Açores.
É isto o que está em causa. Sr. Deputado, e entendemos te avançado com uma proposta que satisfaz os interesses nacionais, porque é isto o que nos preocupa.
Naturalmente, nesta audição parlamentar, tem de haver alguém responsável por aquilo que aconteceu: ou quem divulgou imagens que não devia, ou quem «mete a cabeça na areia», como a avestruz,- recusando-se a encarar os problemas de frente.
O Sr. Presidente: - Faça o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Orador - Concluo já, Sr. Presidente.
É isto, Srs. Deputados, o que está em causa e o que nós queremos aprovar, para ser restabelecido o bom nome de Portugal. Por outro lado, também pretendemos que os pescadores açoreanos não sejam o bode expiatório em todo este processo, porque não é o povo açoreano que está aqui em causa, mas, sim, os governantes deste País, designadamente o Governo português.
Pôr isso, Sr. Deputado, não me referi à legislação regional, porque essa compete à Assembleia Regional dos Açores desenvolver, encontrando os processos que julgar mais convenientes para avaliar essa situação.
Do que se trata aqui é de respeitar o interesse e a posição nacionais na comunidade internacional. Por isso, propõe-se na Assembleia da República 'que se faça essa avaliação dos factos
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado - José Paulo Casaca.
O Sr. José Paulo Casaca (PS):- Sr Presidente, Srs. Deputados. Independentemente dos critérios objectivos que possam corroborar carácter específico dos golfinhos no reino animal, qualquer pessoa que. lide com eles reconhece-os como seres vivos, capazes de brincar, exprimir alegria ou tristeza, solidariedade familiar e de grupo, de forma absolutamente ímpar.
No mar dos Açores, mercê da ausência de produção industrial de poluentes, os golfinhos são extremamente abundantes, contrariamente ao que se passa em outras zonas do País,