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19 DE NOVEMBRO DE 1993

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E, como me não demito de reflectir por cegueiras de escola, não me resigno à neutralidade social do modelo de distribuição das economias de mercado, por mais que desconheça modelo de produção melhor do que o delas.
Está aí o Portugal de que não me orgulho: desigual! Com metade a fenecer e metade a progredir; com um atraso educativo, cultural, científico e tecnoIógico preocupante; com manchas que alastram, abaixo do limiar da pobreza. Dormem tranquilos os excludentes, sendo cada vez mais os excluídos?
Está aí o mundo que me tira o sono. Uma riqueza global estatística de 4000 dólares por habitante, mas com metade da sua população - cerca de três biliões de seres humanos - com direito a um rendimento per capita, ainda assim estatístico, logo falso, de 330 dólares por habitante,...

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Esteve vários anos sem dormir..., enquanto esteve no Governo...

Risos do PSD.

do mercado. Basta referir o que para aí vai de intervenção do Estado na economia, tendo por instrumento a polífica - dita de pacotilha, designação que vem de «pacote»
dos envelopes financeiros.
E certo que não tem sido feliz. Só para o sector agrícola, o Governo já «empacotou» cerca de 900 milhões de contos, sempre com produções e produtividades decrescentes, ao ponto de já só cobrirmos cerca de 25 % das nossas necessidades alimentares... 0 que comeremos quando deixarmos de receber da Comunidade o com que importamos os outros 75 %?
Resposta luminosa para este drama: converter os nossos agricultores em pensionistas.
Goethe configurou, no seu poderoso «Dr. Fausto»,
um «negócio» assim: Fausto vende a alma ao diabo e recebe
em troca o amor eterno de uma bonita mulher. Seguramente
inspirados nele, os nossos zeladores põem agora o Sr. Delors
a fazer de Mafarrico e a convencer os ' nossos agricultores a
que lhe vendam a alma por uma pensão de reforma. Reco
nheça-se que a motivação é neste caso mais débil!...

0 Orador: - em contraponto com cerca de um sexto Risos do PS

da população total auferindo em média mais de 6000 dóla
res por habitante ... !
Invoco isto porquê? Para realçar que, cá dentro como lá fora, o problema não está tanto no sistema de produção mas no modelo de distribuição da riqueza ....

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - ... no grau de solidariedade com que os cidadãos, as regiões, os povos e os continentes se entreajudam. Esse grau mede-se em 0,33 % do produto dos países industrializados. É, a nível internacional, outra vez a esmola! Esmola que corre o risco de diminuir à medida que os grandes grupos transnacionais vão substituindo os Estados na gestão das economias - já vão em 30 % do comércio mundial.
É contra isto, a que já se chamou «gerir sem ninguém aos comandos», que em vão concito a esperança de pássardes a ter dúvidas sobre o bem fundado das vossas obstinações de escola. E como as tereis, se ainda recentemente, pela voz de um seu assessor, o Sr. Ministro das Finanças viu nas críticas à sua política, advindas de autoridades tão reconhecidas e tão distanciadas como Miguel Cadilhe, João Salgueiro, Vítor Constâncio, Alfredo de Sousa e António Borges: «crificas, unicitárias» tendo por «objecto o retorno ao proteccionismo financeiro»? Tratar-se-ia, segundo ele, de uma «cruzada contra o Governo,», uma espécie - e agora já não cito - de nova força do bloqueio do perfeccionismo oficial! Além do mais, todos perigosíssimos keynesianos!...
Que se há-de fazer a esta prenda? Reconhecer que sois politicamente inamovíveis e que o grande infortúnio de as políticas permanecerem imóveis, apesar das abissais mutações de conjuntura, reside em os seus responsáveis continuarem a ser os mesmos!
É claro que a falsa glória de não dar o braço a torcer tem o seu preço em contradições insanáveis e, desde logo, a de que o Primeiro-Ministro é simultaneamente liberal e -centralizador .. ! Nenhum político, desde Salazar, sem excluir Marcello Caetano, centralizou em si maior soma de poder pessoal - político e económico - do que o actual Primeiro-Ministro!

Vozes do PS: - Muito bem!

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0 Orador: - Entre o poder assumido inscrevem-se, contraditoriamente, poderosas alavancas do funcionamento

Não haverá mesmo outra saída senão este melancólico ocaso da ligação amorosa entre o cultivador e o seu agro? Ou entre o pescador e o seu mar? Não receia o Sr. Primeiro-Ministro acabar por ficar na História como síndico de falências ou liquidatário de fainas?

Em matéria de contradições, poucas não terão sido ainda experimentadas: ao nível das políticas macroeconómicas cambial, monetária, orçamental e de rendimentos e preços o Governo já revalorizou e desvalorizou a moeda; já defendeu uma política de rigor monetário, de altas taxas de juro e uma política de confrontação com o Banco de Portugal por se opor à sua baixa; já perfilhou, até à intransigência e ao mau humor, uma política de contenção do défice e uma política de defesa da virtuosidade desse dêfice; já praticou, ad uswn electiones, uma política de aumento ,do poder de compra dos salários e das pensões, defendendo agora a política sine qua non da sua contenção; já pactuou com o desemprego e já acordou para se preocupar com ele; exalta a concertação social, mas recusa-se a dar o meio passo que a tomaria possível; já jurou amor à descentralização administrativa e já recentrou em si meios financeiros a que as autarquias tinham direito!

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Negou a crise, fingiu aceitá-la quando lhe entrou pelos olhos adentro e apresenta um Orçamento para 1994 em que retoma até onde pode a visão idilica que esteve na base do colapso das suas previsões para 1993.
Já tive oportunidade de acusar aqui o Governo e o Sr. Ministro das Finanças de perfilharem uma política económica deslumbrada pelas perfonnances da tecno-macroeconomia - vê-se agora o que valiam!... - e pelo determinismo mecanicista das leis do mercado - viu-se agora o que determinaram! Além disso, eticamente neutra e imbuída de amoralismo técnico. E convidei-o a encarar a econon-úa como uma ciência social e não como um exercício universitário.
Respondeu-me, então descomposto, que as oposições criticam e a caravana passa... Não passou!

Risos do PS.

E só o facto de ter permanecido pode explicar esta reincidência num Orçamento sem pessoas dentro, dirigido