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7 DE JANEIRO DE 1994 787

0 Orador: - 0 engenheiro Couto dos Santos interveio pela primeira vez, nesta Assembleia, na qualidade de Ministro da Educação, há cerca de um ano e meio, para apresentar a proposta de lei das propinas. Já não é Ministro. Semeou ventos, não resistiu à tempestade!
Hoje, assistimos à estreia da nova Ministra da Educação para defender a mesma lei, a mesma política e, previsivelmente, pois ainda não sabemos, com o mesmo discurso. A primeira proposta de lei da Dr a Manuela Ferreira Leite é, precisamente, o último decreto - aliás, vetado - do engenheiro Couto dos Santos. A nova Ministra começa mal por este caminho. Por quanto tempo será Ministra, logo se verá!

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Sobre a matéria que hoje debatemos - a lei das propinas - existe um projecto de lei do PCP, que propõe a sua revogação, mas que aguarda agendamento para Plenário. Segundo a prática sempre seguida nesta Assembleia deveria ter sido agendado para hoje, mas o PSD, usando como único argumento a força de ser maioria, não o consentiu. Quando todos os factos apontam para indispensabilidade de abrir um processo de diálogo sobre a questão das propinas, quando todas as entidades e instituições reclamam esse diálogo, quando o próprio veto presidencial possibilita o reequacionar de todo o processo, o Governo persiste no seu autismo político e no confronto institucional, apresenta esta proposta de lei, promove o seu agendamento e, mais uma vez, recusa um debate sério, profundo e participado sobre a questão das propinas. Esta é a postura de um governo fechado à sociedade, arrogante e prepotente.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o que hoje está verdadeiramente em debate não são as pseudo-alterações ou a falsa regulamentação da lei das propinas, que constam da nova proposta de lei. 0 Governo já demonstrou que não está interessado em alterar a lei das propinas.
Pelo contrário, pretende mantê-la e aplicá-la, passar por cima da autonomia universitária e impor a aplicação administrativa dos aumentos das propinas contra a vontade dos estudantes e das instituições; estabelecer um novo regime sancionatório para os estudantes que resistam à aplicação da lei, impondo a anulação das respectivas matrículas e impedindo-os de frequentar as aulas ou de beneficiar de mecanismos de acção social.
Esta proposta de lei não é mais do que uma nova tentativa para aplicar uma lei que é unanimemente contestada pela comunidade universitária. Já que as bastonadas da polícia não resolveram o problema, que avance a Assembleia da República com bastonadas legislativas. Às críticas de todos os quadrantes, o Governo responde com o confronto e insiste em prosseguir uma política cujo falhanço é, hoje, manifestamente reconhecido. A este respeito Cavaco Silva não mente: mudaram os ministros mas as políticas e os métodos autoritários são os mesmos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, a nossa oposição em relação à lei das propinas não é conjuntural, não é de pormenor, nem se limita a discordâncias quanto à sua oportunidade. É uma oposição de fundo. 0 PCP é contra o aumento das propinas, porque considera a educação como um direito social dos jovens portugueses e não como um mero privilégio individual.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - 0 objectivo da lei das propinas é a mercantilização do ensino. Subjacente à lei das propinas está a concepção de que o ensino é um privilégio que deve ser pago e não um investimento social de importância estratégica para o País e como tal deve ser assegurado pelo Estado. 0 seu objectivo é tomar progressivamente pago o acesso aos níveis mais elevados de ensino, direito que a nossa Constituição exige que seja progressivamente gratuito.
É uma refinada hipocrisia que um Governo, responsável pela acentuação das desigualdades na sociedade portuguesa, por um sistema fiscal gerador de injustiças, que agrava a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho e sobre os baixos e médios rendimentos e isenta de impostos os lucros, os especuladores e as grandes fortunas, venha encontrar nas propinas a panaceia para assegurar a justiça social.
Os cidadãos pagam os seus impostos para que o Estado assegure as funções sociais que lhe competem e que se traduzem na garantia de direitos fundamentais como a justiça, a saúde, ou a educação.
Com os argumentos fáceis e populistas do tipo - «porque não hão-de os ricos pagar propinas?» - o Governo não pretende fazer sua a exigência de que «os ricos paguem a crise», o que pretende é obrigar os cidadãos a pagar aquilo a que têm direito e isentar o Estado do cumprimento dos seus deveres sociais, na sua esfarrapada tese de «menos Estado» para os cidadãos e de mais benesses para o capital.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Orador: - Ao afirmar que frequentar o ensino em condições de progressiva gratuitidade, independentemente da situação económica, é socialmente injusto, o Governo não andará longe de considerar que a comparticipação do Estado nos medicamentos é socialmente injusta, que o abono de família é socialmente injusto, que o acesso gratuito a bibliotecas públicas é socialmente injusto, ou que é socialmente injusta a gratuitidade da própria escolaridade obrigatória.
A injustiça social não resulta da existência de serviços públicos gratuitos, mas de uma sociedade geradora de injustiças e desigualdades; de um sistema fiscal que as aprofunda e de leis que neguem aos cidadãos, por razoes económicas, o acesso a bens sociais fundamentais.

Aplausos do PCP.

0 PCP pronuncia-se, por isso, pela revogação da Lei n.º 20/92 e pelo cumprimento do preceito constitucional que incumbe o Estado de garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino. E, nesse sentido, manifesta-se contra a desresponsabilização do Estado no financiamento do ensino superior público e a favor de um sistema de acção social, que permita aos estudantes de menores recursos fazer face aos custos elevadíssimos da frequência do ensino superior.
0 facto de a lei das propinas ter sido aplicada em algumas universidades só teve dois méritos: demostrar a falsidade das suas pretensas virtudes e tornar óbvio o seu carácter injusto.
Vejamos telegraficamente os factos: quando se pagam propinas não são fundamentalmente os ricos que as pagam, mas aqueles que, trabalhando por conta de outrém, não têm