O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1034 I SÉRIE-NÚMERO 31

Queria também pôr em evidência que ocorre amanhã, no Estado espanhol, uma greve geral e que essa greve geral é uma entre outras greves gerais que têm vindo a sacudir os diferentes Estados da Comunidade Europeia, pondo em relevo que a orientação económica do Governo PSD e as teses do Primeiro-Ministro acerca da política económica e social do país têm inspiração na Comissão Europeia e nas sedes das grandes companhias multinacionais e que a política dos Estados tem vindo, cada vez mais, a sofrer a contestação generalizada dos trabalhadores de larguíssimos movimentos sociais. Esta greve geral que ocorre no Estado espanhol é também um manifesto negativo em relação à política neoliberal e anti-social e aos critérios monetaristas do Mercado Comum europeu e da senda de Maastricht.

Para finalizar, direi que essa greve geral que ocorre no Estado espanhol e as gerais greves de que vamos tendo indício e desenvolvimento no Estado português são um desmentido cabal, completo e fidedigno de que o Pacto Social não era, de facto, contestado pelos trabalhadores portugueses. Que, cada vez mais, aquela Europa, que o Sr. Primeiro-Ministro disse aqui, ainda há poucos dias, «marchar a todo o vapor», se faz também pela história dos Estados e que a sua história imediata e mediata cada vez mais se vão fazendo pela história dos movimentos sociais.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Pinto.

0 Sr. Adriano Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me VV. Ex.ªs algumas breves palavras sobre o desporto, tendo como motivação algumas tendências ou tentações desenhadas no horizonte do seu desenvolvimento entre nós.

Concluímos recentemente uma etapa que nos apraz registar e que veio dotar o sistema desportivo de um edifício jurídico em conformidade com as exigências de modernização e democratização de um Estado de Direito. Encontramo-nos, presentemente, na fase de instalação de estruturas e de instituições susceptíveis de implementarem a concretização das aspirações subjacentes aos novos instrumentos jurídicos. Neste contexto, tem sido colocada com insistência e como questão central a da capacidade real de organização do desporto pelas instituições tradicionais.

Ensina-nos a história do desporto - quer a mais, quer a menos recente, tanto no plano nacional como no internacional - que o desenvolvimento desportivo é sempre uma questão de princípios, de reafirmação, de actualização e de renovação dos princípios clássicos que enformaram o desporto como um sistema humano, social e moralmente bom. É também em torno dos princípios que a questão da organização do desporto, hoje tão aflorada entre nós, deve ser elaborada. Reconhecemos que clubes, associações e federações desportivas se afastaram, em alguns casos, dos objectivos que motivaram a sua criação. Que têm perdido credibilidade como instituições culturais e morais, porque, não raras vezes, se têm sobrecarregado de objectivos extrínsecos, afastando-se do cerne da sua objectividade intrínseca, porque têm, com frequência, colocado em primeiro plano aspectos secundários e colocado em plano inferior e até no esquecimento sentidos e motivos primeiros.

Contudo, o reconhecimento destes erros não pode ser aproveitado para cair na tentação de desviar o desporto do seu caminho natural, de querer submeter a sua prática e organização à lógica do trabalho, de o querer estruturar e modelar à semelhança de uma actividade empresarial. A necessidade de inovação do sistema desportivo implica, naturalmente, a modernização da sua organização e administração, o recurso a instrumentos de gestão com validade noutras instituições e instâncias, mas sem esquecer que no desporto coabitam outros princípios, objectivos e finalidades.

O desporto faz parte do processo de civilização e esta é um sistema de valores espirituais e de espiritualização da vida. Ao cair nos braços da onda tecnocrática e economicista, o desporto tende a ignorar aquele vínculo e a afastar-se do seu horizonte de princípios e referências. Condena-se, assim, a perder nitidez e consistência, a diluir-se no amorfismo e na ausência de uma identidade própria. Toma-se uma instituição sem alma, estipulando e morrendo como uma árvore sem raízes e sem seiva.

Inovar sim, cortando com o «tradicionalismo», mas resistindo simultaneamente a moda do «actualismo». Ou seja: não queremos permanecer no passado, mas também não o queremos negar. Queremos, sim, afirmar e actualizar princípios de existência, que estão acima da corrosão dos tempos e sem os quais tudo se dispersaria num nada sem entranhas, num dinamismo apenas aparente porque desprovido de raízes sólidas. A inovação da organização e administração do desporto não pode, por isso, deixar de ser uma reafirmação ofensiva dos seus princípios de sempre: humanos, pedagógicos, culturais, éticos e morais.

Por tudo isto e em face de tantas preocupações obsessivas apostadas em estruturar o desporto como se fosse uma actividade eminentemente económica, em converter os clubes em empresas e em subvalorizar tudo o que não se enquadra nesta lógica, parece-me legítimo perguntar: haverá ou não lugar no futuro para as organizações desportivas tradicionais? Para as federações, associações e clubes? Cairá o desporto totalmente na esfera do privado e dos interesses económicos, sendo esquecidos, menosprezados ou destruídos os organismos que não acompanharem esta onda? Quem cuidará de ensinar as crianças a jogar e a lidar com o desporto? Quem cuidará de fomentar talentos, de treinar atletas? Quem se ocupará com a juventude, com os adultos, com as pessoas idosas e diminuídas?

Quem congregará os meios materiais e humanos para organizar competições e procurar resultados e rendimentos? Quem disponibilizará o seu tempo para o desempenho, socialmente altruísta e solidário, de funções e tarefas no desporto?

Passarão as novas organizações ou hipotéticos clubes-empresa a estar dispensados dos vínculos aos valores humanistas do desporto?

A tentativa de resposta converte-se num reexame de princípios e num exercício de compromissos. As «novas» ideias são compreensíveis. 0 desporto sempre esteve e estará incluído na dinâmica das mudanças. É à modernização das sociedades industriais que o desporto deve o aumento da sua relevância. É ele próprio um factor de modernização da vida. Não faria, pois, sentido que ele se convertesse em militante da resistência à modernização, que não tomasse a sério as novas necessidades e perspectivas.

Porém, esta abertura e flexibilidade não se podem confundir com um casamento e, por via deste, com toda e qualquer tendência de modernismo, com uma renúncia a qualquer preço e a ser paga por cheque de cobertura duvidosa aos princípios que perfazem as virtualidades da organização desportiva. Inovar não pode ser vender ilusões e utopias, não pode ser deixar os cidadãos entregues à sua sorte, nem exigir da organização tradicional do desporto uma reformulação tal que signifique a sua perversão.