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1394 - I SÉRIE - NÚMERO 41

Sr.ª Secretária de Estado, a nossa cultura dominante, que não conhece esta questão da segurança interna nem as falsificações de documentos, enfim, tudo aquilo que a Sr.ª Secretária de Estado apresentou como argumentos, aquilo que vê é que um senhor foi abordado pela polícia e teve de ir à esquadra para se identificar, sem se saber porquê. Aliás, nem a própria pessoa sabe porquê, pois a polícia, segundo esta proposta de lei, não é obrigada a dizer-lhe por que é que o está a identificar.
As pessoas até podem gritar «Olhem, ele está a levar-me, sem me dizer de que sou suspeito», porque, segundo esta lei, a polícia, a guarda ou a autoridade nem sequer são obrigadas a dizer ao cidadão por que é que querem que ele se identifique. Veja lá onde é que nós chegámos!
Por outro lado, seis horas é muito pouco tempo para o Dr. José Vera Jardim pedir o habeas corpus e eu, por exemplo, sair em liberdade. De modo que por este caminho também não posso ir.
Por último, dizer que se adopta este procedimento, por razões de segurança interna, é muito pouco. Qual segurança interna, qual quê? O que é que o guarda me vai dizer? Já basta que ele diga que, segundo a lei de segurança interna, tenho de lhe apresentar o documento.
Sr.ª Secretária de Estado, aquilo que, no Código de Processo Penal, era um procedimento cautelar para os delinquentes ou suspeitos de crimes, tornou-se, com esta proposta de lei, uma regra geral, pois ela não é mais do que a transposição dos artigos 250.º e outros daquele Código.
Por isso, para que. amanhã, possa dizer aos meus eleitores que podem ir, tranquilamente, comprar a garrafa de leite para o filho ou o jornal, que podem ir conversar com alguém ou até tomar banho na praia, calmamente, gostava que a Sr.ª Secretária de Estado desse uma explicação relativamente às dúvidas que suscitei.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado da Justiça, o Grupo Parlamentar de Os Verdes considera que esta proposta de lei, que o Governo apresenta hoje à Assembleia, fomenta a instabilidade e a insegurança dos cidadãos, promove a suspeita generalizada entre os cidadãos e restringe o direito à liberdade e à segurança consignado no artigo 27.º da Constituição da República Portuguesa.
Entendemos que, enquanto a lei de segurança interna - Lei n.º 20/87, de 12 de Junho - abriu as «portas», a proposta de lei, que o Governo agora apresenta, alarga os «corredores» escurecidos para que se estabeleça na sociedade portuguesa um Estado de excepção, um Estado policial. Esta é a consideração que tecemos relativamente a esta proposta.
O que queremos saber, Sr.ª Secretária de Estado, é o que é que os portugueses têm feito, de tão grave, desde 1986 até esta data, que justifique as alterações tão significativas que se verificam nesta proposta de lei relativamente ao Código de Processo Penal? É que, na altura, o Governo considerava que apenas os órgãos de polícia criminal podiam fazer a identificação dos cidadãos em locais de excepção, isto é, em locais ou lugares habitualmente frequentados por delinquentes, e só em situação de considerados suspeitos. E considerados suspeitos, como define o Código, são os cidadãos relativamente aos quais se entenda que pertencem a associações criminosas e que tenham participado em crimes ou estejam em vias disso.
Por outro lado, a possibilidade de a polícia criminal actuar, procedendo à detenção dos cidadãos para identificação, no caso de não possuírem identificação no momento em que são abordados, também foi definida muito claramente.
Desta vez, o Governo apresenta uma proposta de lei que diz que qualquer cidadão, em qualquer local público, pode ser detido para identificação. E a questão que se coloca, Sr.ª Secretária de Estado, é a seguinte: o que é que os cidadãos portugueses fizeram de tão grave? Que comportamento é que o Governo atribui aos portugueses, ao longo destes últimos seis anos, para lhe dar esta condenação? É que nós consideramos esta proposta de lei uma condenação e, naturalmente, repudiamo-la.
Pelo menos ao longo destes seis anos, o Governo foi responsável pela condução de uma política pautada pelos objectivos estabelecidos na Constituição, de democratização e aprofundamento da democracia e do regime democrático. Ora, verificamos que o sentido desta proposta de lei é totalmente contrário ao objectivo que a Constituição da República Portuguesa preconiza.
São estas as explicações que peço e que, certamente, a generalidade dos portugueses também gostaria de ver dadas.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep): - Sr.ª Secretária de Estado, uma proposta destas tem de vir de um governo que está longe dos cidadãos, que não sente aquilo que eles sentem e que constitui as características da nossa sociedade. Talvez de um governo que passa muito tempo a ver televisão, os filmes norte-americanos, a série Hill Street Bluesl Por isso, inventou super-esquadras, contra aquilo que era normal na nossa sociedade, que era haver esquadras junto da população, numa relação que não seria das melhores, evidentemente, mas que tinha outras potencialidades e outras características. Tem de vir de um governo que, a passo e passo, vai instalando a suspeita geral sobre a sociedade e vai provocando uma situação que é a de cidadãos «rigorosamente vigiados».
É inaceitável para qualquer cidadão, pelo menos na nossa sociedade, ser tratado como um delinquente, como alguém que é suspeito, como alguém que tem de ir à esquadra. Ir à esquadra é para participar um roubo, ou uma agressão. Ninguém vai a uma esquadra de boa vontade! E sempre uma violência, uma violentarão do cidadão impor-lhe a ida a uma esquadra, nem que seja a mais próxima. Esperemos que não seja a super esquadra, no outro lado da cidade! É sempre uma violência, ainda mais quando essa violência pode prolongar-se por seis horas, e ainda mais quando o cidadão pode estar sujeito, eventualmente (e digo isto com todos os cuidados), a comportamentos que têm sido várias vezes- muitas vezes! - denunciados, de violências e de falta de consideração pelos cidadãos.
É evidente que nós, Deputados, temos de ficar preocupados com uma proposta destas. Pela minha parte,