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3 DE MARÇO DE 1994 1459

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No ano passado, denunciei nesta Assembleia e fora dela, com provas na mão, a existência de uma rede de corrupção ligada à captação fraudulenta de subsídios de cereais.
Após essa denúncia, o PS apresentou um pedido de inquérito aos mais de 900 milhões de contos distribuídos e investidos no sector agrícola de 1986 a 1992. O PSD reagiu à denúncia, com o insulto e a mentira, como é habitual nestas matérias de moralização do Estado e da sociedade civil.
Graças à pressão diária da comunicação social, que começou a publicar os recibos falsos e a entrevistar os falsos produtores de cereais, o PSD, não aceitando o inquérito aos 900 milhões de contos, viu-se obrigado a apresentar um inquérito à Cooperativa Agrícola de Torres Vedras.
Perdeu-se uma excelente oportunidade de fazer frente a dois dos maiores males da sociedade portuguesa: a corrupção e o compadrio.
Hoje, todos sabemos que a rede é muito mais vasta e que passou pelas cooperativas de Santarém, Cooperativa de Desenvolvimento Agrícola (CDA), de Ourique, de Ferreira do Alentejo, de Castro Verde, etc.
Milhões e milhões foram roubados em nome dos agricultores, com a conivência de dirigentes associativos e de serviços oficiais, como se provou no inquérito à Cooperativa de Torres Vedras.
Este Ministério da Agricultura não tem autoridade para impor a moralização no sector, porque permeia a venalidade e o compadrio, e esta maioria protege essa actuação.
Os quase 500 000 contos que recebe por dia, na sua grande maioria fundos comunitários, são manuseados no segredo dos Deuses. Não há publicações mensais ou anuais que individualizem quem recebe, o que produz ou em que investe.
Há um total controlo partidário de toda a máquina do Ministério, confundindo os interesses do partido com os do Estado. Neste Ministério está mesmo instituído um prémio à venalidade e ao compadrio.
Homens acusados desses actos são de imediato promovidos. Exemplos claros desta actuação são os seguintes: o Engenheiro Fernando Mota é nomeado Director-Geral das Florestas e, em Vila Real, é criada a empresa A. Mota e Filhos, pertencente a um seu irmão, o qual rapidamente se transforma num dos maiores empreiteiros florestais do País.
O escândalo torna-se público.
De imediato, passa-se a Direcção-Geral a Instituto e nomeia-se o Engenheiro Mota a Director do IFADAP, com o pelouro do controlo de todos os meios financeiros para a floresta nacional.
É ou não a promoção do compadrio e da venalidade?
O Dr. Machado Gouveia foi nomeado Director-Geral da Pecuária. No seu consulado rebenta o escândalo dos abates sanitários que lesaram o Estado em mais de 600 000 contos. É imposta a censura científica aos investigadores nacionais que diagnosticaram as encefalopatias espongiformes, violando todas as regras de funcionamento de um Estado de direito e dos acordos internacionais assumidos.
Detectam-se irregularidades de centenas de milhar de contos nos fundos de prevenção da peste suína africana. Solução encontrada: passa-se a Direcção-Geral Para Instituto de Protecção à Produção Agrícola e o Pr. Machado Gouveia é promovido a seu Presidente.
É ou não a promoção do compadrio e da venalidade?
A caça é um sector controverso em Portugal e todos os passos deviam procurar um consenso nacional. Em Trás-os-Montes é nomeado, como responsável por este sector, o Engenheiro Álvaro Barreira. Este senhor utilizando terrenos públicos e o seu próprio cargo rapidamente se transformou no maior empresário privado de exploração da caça a nível nacional.

Vozes do PS: - Uma vergonha!

O Orador: - Já foi promovido a parceiro de caçadas do Ministro e do Secretário de Estado da Agricultura.

É ou não a promoção do compadrio e da venalidade?

São os mesmos, Ministro e Secretário de Estado, que pegam nos terrenos da Tapada de Mafra e mais umas herdades, que criam uma empresa pública de caça e colocam como administradores os seus assessores e chefe de gabinete.

O Ministério pratica, ele mesmo, a venalidade e o compadrio.

O Engenheiro Costa Freire é um aprendiz perante estes profissionais. O inquérito à Cooperativa de Torres Vedras é elucidativo de tudo isto.

Aplausos do PS.

É espantosa a facilidade com que se rouba. Um cidadão, que era amigo do Sr. Carimbo, subia ao gabinete e fazia com ele, como comerciante, um contrato de entrega de milhares de toneladas de cereais. Em seguida, carregava a camioneta, que poderia ser, por exemplo, de areia, passava por uma báscula e tirava um ticket com o peso. Apresentava-se na Cooperativa com o ticket, inventava os falsos produtores até perfazer a tonelagem contratada e eram passados recibos em nome desses falsos produtores, mas depositados na conta desse comerciante.
Assim, um ticket de balança transformava-se em cereais para arrecadar subsídios.
Os serviços oficiais fiscalizavam e inventavam relatórios falsos, evitando assim que a fraude fosse diagnosticada. A rede tinha extensão à CDA, Cooperativa da CAP, onde o Sr. Carimbo era tesoureiro, e ligação à Cooperativa de Santarém, onde o Sr. Casqueiro era presidente.
Negócios ilícitos de amigos cobertos por outros amigos.
Por mim, depois de tantos insultos a que fui sujeito por esta maioria e por este «ministério clandestino», com algumas ameaças anónimas de permeio, dou-me por satisfeito com as conclusões do relatório.
A fraude ficou provada, a incapacidade dos serviços demonstrada e a rede cada vez mais à vista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este inquérito é o primeiro aprovado por unanimidade, com a colaboração empenhada do Presidente do INGÁ na entrega pronta de todo o material solicitado.
Agradeço aos Deputados Luís Capoulas Santos, que presidiu à Comissão, o empenhamento colocado e a Fialho Anastácio, que redigiu, com todo o rigor, o relatório apresentado.
Valeu a pena o esforço, mas mais teria valido se esta Assembleia tivesse votado o pedido de inquérito apresentado pelo PS aos mais de 900 milhões de contos.
Ninguém consegue compreender como é possível, com tantos milhões, a agricultura portuguesa encontrar-se na maior crise da sua existência.