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17 DE JUNHO DE 1994 2611

o sentido do que consta no artigo 18.º do projecto de lei, que diz que «Nenhuma entidade pode recusar a passagem de licença da sua competência (...)». Creio que este normativo se refere a entidades que zelam pela segurança, pela saúde, pelo ambiente, etc. Sr. Deputado, entendo que essa entidade não se pode recusar a passagem da licença, desde que com fundamentos exteriores ao que for a sua competência. Mas, se considerar que não há, de facto, as condições necessárias, pode recusá-la. Suponho que será essa a ideia, caso contrário, não podemos crer que entidades que defendem determinadas responsabilidades sectoriais deixem de emitir com liberdade a sua opinião.
A quarta questão tem a ver com o deferimento tácito. Os Srs. Deputados propõem que seja a assembleia municipal a conceder autorização para utilização dos espaços de naturismo e depois vêm dizer que há deferimento tácito se não for tomada uma deliberação no prazo de 60 dias sobre a entrada do requerimento na câmara municipal. Mas não é a câmara municipal a responsável pela aprovação de um requerimento pela assembleia municipal. Julgo ser necessário fazer aqui qualquer acerto em termos de processo, sem o qual se podem gerar, inclusive, alguns conflitos entre órgãos autárquicos ou alguma confusão junto dos promotores da iniciativa.
Para terminar, gostava que o Sr. Deputado me esclarecesse sobre o que querem dizer com as «atitudes susceptíveis de provocar escândalo».
Finalmente, quanto à entrada em vigor e regulamentação deste diploma, o Sr. Deputado não vê o risco de, pela conjugação dos efeitos do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 23.º, voltarmos a ter um novo impasse, ou seja, a lei entrar parcialmente em vigor e ter alguns efeitos e não ter outros? Esperemos que este Governo mude rapidamente, mas durante o período em que isso não acontece, não poderá criar-se de novo a situação de se aplicar esta lei e haver aspectos que ainda ficam a carecer de regulamentação?

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, agradeço todas as questões que colocou. Relativamente a algumas, é fácil, aqui e perante o que está expresso no diploma, ficarem esclarecidas, outras levarão a alguma delonga, pelo que vou tentar dar o esclarecimento possível no tempo de que disponho.
No que respeita àquilo a que chamou de confusão quanto aos espaços municipais diferentes, isto é, quanto à possibilidade de um espaço naturista ocupar espaços municipais diferentes, naturalmente, o artigo referente a esta questão diz expressamente que a autorização compete às assembleias municipais. No entanto, compete a uma câmara municipal organizar o processo. No fundo, tudo isto se relaciona com o decorrer do processo e o cumprimento dos prazos que referiu.
Para nós, é importante que haja cumprimento de prazos, porque qualquer entidade pode «deixar para as calendas» uma decisão que é importante. Referimos os prazos a propósito da assembleia municipal porque consideramos que deve ser ela a decidir, porque é o órgão que entendemos ter maior competência para decidir sobre se deve situar-se determinado espaço naturista na área do seu município.
Se a assembleia municipal decidir a favor da concessão da licença, cremos que nenhuma outra entidade deve impedir essa aprovação e a implantação do espaço naturista porque, em nosso entender, as assembleias municipais representam os interesses do desenvolvimento municipal, que também está em causa. Quem conhece hoje a Europa e o Mundo, quem conhece Portugal, sabe o quanto é importante o desenvolvimento turístico e o quanto poderá condicionar o desenvolvimento de certas actividades turísticas se em determinado espaço municipal houver condições para que as pessoas se possam aí situar e ocupar os seus tempos livres. Relativamente à questão de esta lei poder entrar em vigor só em parte. Sr. Deputado, entendemos que temos de correr riscos. À Assembleia da República não compete fazer a regulamentação, designadamente em matéria que é da exclusiva competência - ou, como entendemos, da exclusiva incompetência - do poder executivo, do Governo. Por isso, pretendemos que a Assembleia da República não volte a aprovar uma lei que depois não possa ser posta em prática. Com este projecto de lei, se for aprovado, fazemos com que seja possível - este é a diferença em relação à lei anterior, aqui aprovada por Deputados de todos os grupos parlamentares com excepção do CDS-PP - a criação dos espaços naturistas e a prática do naturismo. São definidas, identificadas e responsabilizadas as entidades com competência para implementar esses espaços e para fazer a sua vigilância. Por isso, a outra responsabilidade cabe agora, de forma acrescida, ao Governo. Esperamos que o Governo - este, ou outro que venha a seguir - saiba assumir as suas responsabilidades.

O Sr. Presidente: -Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado André Martins, quero louvar a forma moderada e cautelosa como procurou defender o direito dos cidadãos amantes do naturismo, ao mesmo tempo que procurou que fossem respeitados os sentimentos das pessoas contrárias a esta prática. Fez bem, porque, apesar da «longa caminhada» que referiu a nossa saudosa amiga Natália Correia, a verdade é que ainda há uma certa relutância das pessoas em aceitar esta prática. Em todo o caso, creio que a relutância é um pouco aparente e está ligada a uma fenomenologia muito especial e complexa do que é, na realidade, um espírito contrário à prática do naturismo.
Posso recordar um episódio que testemunhei: em 1941, estava nas Caldas da Rainha, e houve uma grande concentração de estrangeiros refugiados, que vinham da França, da Alemanha, da Holanda, etc., em plena guerra, e que já praticavam um seminudismo, hoje, prática corrente, que era o uso do biquini, enquanto, em Portugal, os próprios homens eram forçados a tapar o tronco com uma camisolinha. Havia uma praia ali próxima das Caldas da Rainha, a da Foz do Arelho, e, no Verão, as refugiadas acorreram à praia, mas como o único fato de banho que possuíam era um biquini, naturalmente, usavam-no. Isto desencadeou uma série de protestos e o cabo-do-mar local, que era um homem imaginativo, resolveu o problema espetando uma tabuleta a meio da praia com uma seta para um lado, tendo escrito por baixo «fatos regulamentares» e uma outra, apontando para o lado oposto, que dizia «fatos não regulamentares». Desta forma acabaram os protestos - por isso é que digo que, às vezes, os protestos não são feitos com grande convicção - mas, em todo o caso, os nossos olhos viam para um lado e outro da tabuleta... Ora, o Sr. Deputado André Martins é tão cauteloso que até frisou que estes locais de prática de naturismo deveriam estar longe das vistas de outras pessoas para não as ofenderem.