O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2614 I SÉRIE - NÚMERO 80

de moderna, que assenta numa visão de progresso a qualquer preço e que, por via disso, vive na obsessão do imediato, na sofreguidão do «coisismo» materialista e na avidez hedonista do prazer fugaz.
Temo, por isso, que esta solução das reservas do nu não corresponda a um regresso à autenticidade humana, imas antes a um exibicionismo elitista e marialva.
Se a prática dita naturista for entendida não apenas na sua dimensão episódica, aqui caracterizada, mas na sua dimensão sistémica e integrativa, então estaremos no bom caminho. Mas devo confessar a minha sincera e profunda dúvida de que este projecto de lei seja expressão de maior naturalidade na relação do homem consigo mesmo, com os outros e com a natureza. Uma dúvida destas custa mais a despir do que a própria roupa.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia.

O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde há quase 10 anos que neste Parlamento, por iniciativas diversas, se vem abordando e reflectindo sobre o tema da prática do naturismo.
O assunto não é premente, não se verifica no dia-a-dia uma forte exigência popular para o regulamentar, a sociedade não o exige insistentemente. No entanto, também ninguém poderá ignorá-lo, com base em preconceitos, tabus ou em nome de qualquer crença que, como cidadãos, todos têm o direito de ter. Mas os titulares de cargos públicos terão sempre a serenidade e o discernimento para observar as questões acima dos sentimentos imediatos que qualquer bom coração pode determinar.
O assunto não se insere, por enquanto, nas preocupações cimeiras dos cidadãos, nem nas primeiras linhas de nenhum programa partidário, nem, certamente, nas prioridades de qualquer Governo. No entanto, há que não esconder a cabeça na areia.
É preciso olhar o mundo que nos rodeia, a sua evolução, o que ocorre, em particular em algumas zonas turísticas, e ter a visão, a postura e a mentalidade dos espíritos abertos e dos homens e das mulheres livres, tolerantes e capazes de compreender os outros. Hoje ninguém poderá negar o direito à diferença, salvaguardado que seja o respeito pela nossa civilização e pela nossa cultura.
A prática ou não do naturismo não deve ser um problema político da esfera própria de disputa entre partidos políticos; é mais, e sobretudo, uma questão de ordem ética, moral,, cultural e da livre opinião individual de cada um de nós.
As opções religiosas, a cultura gastronómica, a indumentária, o estilo de vida ou as preferências desportivas ou clubísticas também não deverão fazer parte da disputa partidária. Igualmente, encaramos a prática do naturismo no contexto dos estilos de vida e dos padrões de comportamento de cada cidadão livre.
Mas, colocada a questão nestes termos, não pode, no entanto, o Órgão de soberania mais representativo dos portugueses abdicar da reflexão e da definição de regras de respeito pelos valores morais e culturais da nossa sociedade.
Em 1988, o Parlamento aprovou uma lei sobre a prática do naturismo, com votos favoráveis da maioria dos Deputados do PSD, do PS, do PCP, do PRD, de Os Verdes e da Intervenção Democrática. Embora, livremente, alguns Deputados do PSD e do PRD tenham manifestado legitimamente opinião diferente.
Recorde-se que, na altura, ficou definida a necessidade de criação de regras para utilização dos campos de naturismo, bem como quanto ao licenciamento, acesso, organização e sinalização dos mesmos.
Portanto, a questão de fundo foi discutida e aprovada há seis anos, com excelentes intervenções de Deputados de vários partidos, razão pela qual hoje não devemos voltar ao ponto de partida. Devemos, sim, situar o debate no passo seguinte, ou seja, na regulamentação dessa lei. É que, num Estado de direito, há que respeitar as decisões tomadas democraticamente, e essa é uma delas.
A Assembleia da República já decidiu quanto à necessidade de regulamentação da prática do naturismo. Essa decisão, portanto, não está hoje em discussão. Vamos, sim, falar das regras para a prática do naturismo.
Importa salientar que de 1988 até hoje o assunto não esteve parado nos corredores do Governo. Muito trabalho foi feito e com a seriedade e a dignidade que o assunto impõe.
Assim, durante mais de dois anos uma equipa da então Secretaria de Estado do Ambiente trabalhou com juristas da Federação Portuguesa de Naturismo e com dirigentes da Associação Nacional dos Municípios Portugueses e da União das Associações da Indústria Hoteleira e Similares do Centro e Sul de Portugal, além de terem obtido contributos da Secretaria de Estado da Justiça, da Guarda Nacional Republicana, da Federação Portuguesa de Campismo e de Caravanismo, do Sindicato Democrático da Hotelaria, Alimentação e Turismo, bem como das então Direcções-Gerais dos Portos e das Pescas.
Elaborou-se um projecto de regulamento bastante detalhado, o qual merece, no entanto, uma serena apreciação política
No Verão de 1991, o Governo não aprovou este projecto de decreto-lei pelas seguintes três razões legítimas e óbvias: em primeiro lugar, porque se estava em claro período de pré-campanha eleitoral para as eleições legislativas e, nessa ocasião, poderia a polémica em volta da sua entrada em vigor gerar atitudes demagógicas, longe da convergência e da serenidade que o assunto deve ter; em segundo lugar, porque se entendeu que, não sendo matéria de natureza política ou administrativa pura e simples, mas sim questão de natureza moral, ética e cultural, melhor seria obter a opinião de todas as forças políticas parlamentares, na Legislatura seguinte e em período de serenidade construtiva sem paixões eleitorais e, por último, porque, em dado momento, se considerou que tendo o assunto surgido de iniciativa parlamentar e em matéria que não tem a ver apenas com a Administração Pública central, mas sobretudo com as autarquias e com entidades de direito privado, e em especial com direitos e liberdades dos cidadãos, teria eventualmente vantagens que fosse o próprio Parlamento a definir as regras e os princípios essenciais a respeitar nesta matéria.
Estamos assim em boas condições para, com as orientações do debate - aqui no Plenário e, depois, em sede de Comissão -, se preparar um bom regulamento, com o contributo de todos os quadrantes do pensamento político aqui representados.
A prática do naturismo, além das orientações genéricas que a lei já apontou, e que aqui importa sublinhar, deverá pautar-se por alguns princípios essenciais que quero salientar.
Em primeiro lugar, deve fazer-se depender a aprovação dos espaços de naturismo de prévia audição e parecer favorável das assembleias municipais e das câmaras municipais, como órgãos mais representativos da opinião das populações locais, as quais deverão ser previamente bem informadas acerca da intenção de criar tais espaços.
Em segundo lugar, há que assegurar que esses espaços sejam suficientemente afastados de aglomerados urbanos,