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2 DE JULHO DE 1994 2819

Ficou ainda provado naquela ponte, Sr. Ministro, que o dispositivo de segurança interna que V. Ex.ª comanda não está dotado dos meios necessários e adequados de intervenção. V. Ex.ª teve de socorrer-se de meios de engenharia militar para arrastar viaturas e, como sabe, há um problema de enquadramento legal no uso desses bens porque, fora do estado de sítio e do estado de emergência, o uso de forças militares, de elementos operacionais e de outros elementos não é constitucionalmente admissível.
Ficou também a saber-se que a PSP não tem meios bastantes para, eventualmente e se for necessário, enfrentar uma manifestação hostil, dirigida ao derrube do Estado democrático, conduzida com o uso de meios pesados sobre centros urbanos tão cruciais como Lisboa, mas também poderia ser o Porto!
O que se passou na ponte mostrou uma vulnerabilidade essencial dos nossos meios de defesa, mostrou que a carência de meios vai ao ponto de V. Ex.ª, ou um futuro Governo PS, ter de tomar medidas para estar dotado dos meios necessários para enfrentar situações em que estejam em causa veículos pesados. O Sr. Ministro não os tem e não revelou competência nem capacidade.
Por outro lado, Sr. Ministro, tudo isto revelou uma flagrante descoordenação de polícias. Quando a GNR, de madrugada, abandonou o terreno, deixou a PSP sozinha, enfrentando pessoas, e foi a bonomia relativa nessas circunstâncias que impediu a lapidação das forças policiais no terreno, que não tinham meios porque os paióis e os armazenamentos de armamento estavam fechados. Essas forças foram deixadas entregues a si próprias, numa manifestação lamentável de impotência e de incompetência.
É sobre estes acontecimentos que V. Ex.ª vem dizer à bancada do PS: «é exemplar, façam assim. É assim que, quem tem sentido de Estado, deve fazer» Sr. Ministro, essa aula é vinda de quem não tem legitimidade nem competência para a dar e, seguramente, para a dar a esta bancada.
Deixe que lhe diga, en passant, que a estatística que exibiu aqui é, no mínimo, de uma regularidade ética discutível. O Sr. Ministro citou um rol - que, aliás, podia ter prolongado para cima, para baixo e para o lado - de pessoas que foram detidas em circunstâncias históricas de que nos lembramos todos muito bem, só se esqueceu de revelar que elas foram libertadas a seguir, não foram baleadas e nenhuma foi para o hospital nas circunstâncias em que, lamentavelmente, neste momento, está uma pessoa, na sequência dos actos que comandou. Essa pequena diferença V. Ex.ª não sublinhou, ...

Aplausos do PS.

... ou seja, tem uma memória selectiva e é um professor lobotómico, tem metade das componentes neuronais necessárias para dar aulas.
Portanto, Sr. Ministro, estamos esclarecidos em relação à ética de V. Ex.ª nestas matérias.
Gostaria de relembrar a nossa insistência de que venha a ser aprovado urgentemente um código de conduta da actuação policial face aos cidadãos e criado um conselho de actividades de polícia que possa, com isenção e independência, apreciar incidentes, situações de dificuldade de relacionamento e até violações de direitos fundamentais no relacionamento com as forças policiais. Isso é essencial à eficácia das forças policiais e à confiança das pessoas nessas mesmas forças, para que os cidadãos vejam na polícia um elemento fundamental para a garantia das liberdades e alguém em que é possível confiar e depositar a certeza de que haverá apoio e defesa da legalidade dentro da legalidade. É esse o conceito fundamental em que não recuamos.
Não é preciso usar meios inconstitucionais para defender a Constituição e não é preciso violar as liberdades para defender o Estado democrático. Esta concepção eminentemente democrática é aquela de que nos orgulhamos, que reclamamos e assumimos como compromisso perante o povo português, agora e para o futuro.
Uma última palavra, Sr. Ministro, em relação à questão da descoordenação. V. Ex.ª está hoje aqui sozinho- enfim, acompanhado pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, agradável companhia -, pois estão ausentes os Ministros da Justiça e da Defesa Nacional, que responde por uma parte do dispositivo, respeitante à polícia marítima, e está ausente, naturalmente, o ministro das polícias de Espanha, que responde pela guarda das nossas costas na desgraçada situação que está gerada pela falta de meios do Estado português para defender a nossa faixa costeira.
Este quadro de debate, esta ausência e a sua presença em auto-imolação, porque as explicações que aqui dão são uma verdadeira fogueira em que V. Ex.ª entende consumir o que resta de si, é sinónimo ou imagem da política de segurança interna que temos: descoordenada, caracterizada pela tricefalia, pela carência endémica de meios, pela falta de orientações uniformes e por um fio condutor e, portanto, sujeita a incertezas, a disfunções, a ineficácias e a brutalidades como aquelas a que assistimos.
V. Ex.ª diz-nos que está orgulhoso desta obra. Nós dizemos que não temos qualquer razão para estar orgulhosos dela, não nos solidarizamos com ela, cremos outra alternativa e assumimos o compromisso de a realizar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este debate realiza-se num momento em que a indignação dos cidadãos em relação à actuação das forças de segurança é evidente e plenamente justificada.
Todo o País pôde assistir pela televisão à actuação desproporcionada das forças policiais na ponte 25 de Abril, que o Sr. Ministro da Administração Interna tão rasgadamente elogiou e elogia.
Todo o País sabe que um jovem foi atingido a tiro nas ruas de Almada durante as acções repressivas que foram desencadeadas contra a população desta cidade. Existem públicos testemunhos de que as forças policiais utilizaram, de facto, armas de fogo contra os cidadãos; todo o País sabe que um agente da PSP se encontra em prisão preventiva, sob suspeita de homicídio de um cidadão na esquadra de Matosinhos.
A violência nas esquadras portuguesas consta de relatórios da Amnistia Internacional. As manifestações estudantis mais recentes foram constantemente agredidas, foram as cargas policiais frente à Assembleia da República e ao Ministério da Educação; foram as agressões a estudantes do ensino secundário junto à Cidade Universitária; foram as provocações de agentes à paisana nessas manifestações e foram as acções de intimidação de jovens, por parte de forças policiais, para impedir os seus protestos contra as provas globais.
Os últimos tempos foram também marcados pelas cargas policiais contra os trabalhadores da TAP, contra os agricultores e contra os produtores de leite dos Açores