2924 I SÉRIE - NÚMERO 89
dãos, afinal, para tranquilidade de todos nós, mesmo quando nos baterem à porta, um qualquer dia, às 6 da manhã!
Aplausos do PS.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Puig.
O Sr. José Puig (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Num debate acerca de matéria com este relevo e complexidade, penso que devemos reflectir um pouco sobre a criação e desenvolvimento do Sistema de Informações da República, tomando em devida conta as propostas e as políticas dos maiores partidos com representação parlamentar.
Em Março de 1984, apresentando no Parlamento a proposta de diploma que originaria a Lei n.º 30/84, afirmava, em nome do Governo, o então Ministro do Estado e Assuntos Parlamentares, Dr. Almeida Santos: «O Estado deve ser justo, mas não tem de ser ingénuo. Vai para uma década que, de algum modo, somos uma coisa e outra ... Temos medo de quê? De que serviços dependentes do Primeiro-Ministro, do Ministro da Defesa Nacional ou dos mais altos chefes militares e fiscalizados por esta Assembleia, violem os direitos fundamentais dos cidadãos? Mas, então, esta lei ou os serviços por ela criados podem, assim, revogar a Constituição da República? Confiamos assim tão pouco nas instituições democráticas?!
Se bem ajuízo, há quem tenha medo, em democracia, de uma lei democratíssima mas não dos atropelos à segurança dos cidadãos que precisamente essa lei se destina a prevenir e a evitar. É bem isso ou será que se receia que a simples existência de normalíssimos serviços de informações, criados à luz do dia, controlados à luz do voto e fiscalizados por este Parlamento, traga no seio o risco de uma nova ditadura? Ainda aqui, amorosamente, cultivamos ilusões! A melhor forma de encomendar um tirano reside precisamente, não no reforço da protecção dos cidadãos, mas no seu desgaste».
Mais adiante, respondendo a críticas formuladas por Deputados do Partido Comunista Português, centradas nos escassos poderes de fiscalização do Conselho, afirmava o actual líder parlamentar do Partido Socialista: «(...) não há dúvida que, embora na sua criação, na sua génese e nos seus controles esses serviços devam ser o mais possível cristalinos, também é óbvio que não podemos sequer imaginar serviços de informações que se comportassem em termos de quem olha através de uma vidraça. Seríamos então supinamente ingénuos se admitíssemos que um serviço deste tipo alguma vez podia funcionar» (...), considerações que mereceram o aplauso de Deputados dos Grupos Parlamentares do PS e do PSD, reflectindo o entendimento dos dois maiores partidos do nosso espectro democrático, assim se justificando que estes partidos, juntamente com o CDS, tenham protagonizado a aprovação da Lei-Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa.
Quanto à posição então defendida pelo PCP, uma análise fria e objectiva da mesma conduz à inevitável evidência das muitas contradições subjacentes, como, aliás, acontece com todas, ou quase todas, as verdadeiras questões de regime.
De facto, resulta, em primeiro lugar, das palavras do então Deputado Lino Lima, uma enorme preocupação com as eventuais semelhanças entre as competências e os métodos dos Serviços de Informações da República e os da extinta PIDE/DGS de má memória.
Mas mais adiante, o Deputado Carlos Brito, do mesmo grupo parlamentar, declara textualmente que «(...) da nossa parte admitimos a existência, que, aliás, se verifica, de um serviço relativo à defesa nacional ou segurança externa, preferencialmente militar, mas com a adequada fiscalização parlamentar, como existe noutros países, e a existência, que também se verifica já, de Serviços de Informações da polícia de investigação criminal correctamente organizados».
E, noutro passo, afirma o mesmo Deputado que «É claro que (...) em Portugal sempre existiram serviços de informações desde o 25 de Abril. Trata-se, pois, de um dado de que nos servimos para demonstrar a desnecessidade destes Serviços de Informações que agora se propõem. E em relação aos Serviços propostos, vamos ver mais de perto alguns dos seus aspectos.
Em relação às informações militares, nada a dizer.
Em relação às informações relacionadas com a defesa nacional, qual o motivo porque se separa esta matéria dos Serviços de Informações Militares? Qual a vantagem, qual a funcionalidade desta separação?» - aliás, a posição de hoje do PCP é também, pela boca do Deputado João Amaral, perfeitamente antagónica e contraditória com esta defendida na altura.
E continuando, afirmava ainda o mesmo Deputado que «(...) quanto à questão da violência e do banditismo, nós dizemos não ser necessário um Serviço de Informações, visto que, para esse problema, há a Polícia Judiciária e é nesse campo que a Polícia Judiciária deve actuar».
De facto, o PCP defendia esta posição e estas eram as palavras do Deputado Carlos Brito. Ou seja, em termos de defesa nacional, preferia o Grupo Parlamentar do PCP a tutela militar, como, na altura, era habitual hoje já não tanto.
Por outro lado, no que respeita à segurança interna, apelava-se para a sobreposição das actividades policiais e de produção de informações. Isto é, solução que estaria, pelo menos, nas fronteiras de nova polícia de informações, exactamente o que se pretendeu evitar na solução que foi legalmente consagrada.
Tudo como, aliás, se vem expondo, de forma bem clara, nos pareceres do Conselho de Fiscalização apresentados à Assembleia, nos termos do n.º 3 do artigo 8.º da Lei n.º 30/84.
Num deles, referente aos anos de 1991 e 1992 refere-se que «(...) houve uma grande preocupação (por parte do legislador de 1984) em separar a actividade específica das informações da actividade policial e da função judicial, como forma de evitar o ressurgimento de uma polícia política ou polícia de informações».
Entrando na análise da proposta de lei hoje em debate, sublinha-se, desde logo, a extinção do Serviço de Informações Militares. No entanto, prevê-se a continuação das actividades de informação de natureza operacional específica, desenvolvidas pelas Forças Armadas, no âmbito estrito das suas necessidades internas de funcionamento e do desempenho das missões que lhes estão legalmente confiadas.
Ou seja, os Serviços de Informações Militares vêem apenas ajustada a sua dimensão e estrutura às efectivas necessidades de funcionamento interno inerentes ao desempenho das suas missões.
Em boa verdade, a existência de três serviços de informações é característica das mais poderosas potências internacionais, não sendo, de resto, a regra nos países comunitários.
Num país pequeno como Portugal afigura-se-nos que a evolução proposta se mostra adequada, em nome de uma efectiva racionalização dos recursos disponíveis.