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11 DE NOVEMBRO DE 1994 377

norias étnicas, de amputação do exercício de direitos, de perseguição política e de qualquer forma de tentativa de manutenção ou, mesmo, perpetuação do poder, mas na óptica dos cidadãos, da sua defesa, dos seus interesses concretos Aquela óptica em que a informação, como poder que efectivamente é, se torne, numa perspectiva democrática, num instrumento de saber e de poder partilhados, descentralizado, acessível aos cidadãos, facilitador da sua vida quotidiana, profissional e cívica, que permita conhecer direitos perante o ambiente, a Administração Pública, o abuso fiscal, a justiça, e exercê-los e participar das coisas públicas e da vida pública, dando, desse modo, à cidadania o corpo e sentido que ainda não tem.
No entanto, discutir o «sistema de informações em democracia» é também discutir os próprios limites desses direitos, os mecanismos de controlo que definem a fronteira do lícito e do ilícito, do aceitável e do abuso e é, acima de tudo, definir com clareza a existência ou não de sistemas eficazes de fiscalização e controlo desses serviços, na perspectiva da salvaguarda dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos que, sob nenhum pretexto, podem ser trocados ou amputados.
Trata-se, por fim, de uma discussão que nos leva a questionar o tipo de sociedade em que vivemos, aquela que hoje condescende em ter «micros» escondidos, escutas telefónicas, câmaras de vídeo simuladas e cidadãos rigorosamente vigiados. Hoje, importa saber e questionar onde está a liberdade, o novo sentido e tipo de sociedade que se desenha e as novas ameaças que sobre nós pairam.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estas são, seguramente, demasiadas interrogações para muito escassas respostas que o debate não soube encontrar e que, hoje, cada vez mais, se mantêm em aberto, como em aberto se mantém a ideia, para nós cada vez mais enraizada, de que o Estado vigia para evitar ser vigiado!

Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Vou fazer uma intervenção muito curta, dado que a Câmara já está fatigada, mas suficientemente informada sobre esta matéria. Limitar-me-ei, por isso, a fazer alguns comentários restritos a alguns pontos.
O primeiro serve para sublinhar que o clima em que foi discutido este problema pela primeira vez na Assembleia e aquando da votação da lei já não corresponde, hoje, aos factos.
Nessa data, havia ainda uma grande inquietação, sob uma herança cultural antiga mas também sob uma competição, algumas vezes feroz, entre as forças partidárias Ora, essa foi uma das razões, ainda aqui não mencionada, para aquela cautela, tantas vezes invocada, de impedir a concentração das tutelas em relação aos serviços. Nesse tempo, as coligações é que apareciam como o modelo de governo de esperar sair das eleições e a não concentração das tutelas garantia a oportunidade de distribui-las pelos partidos que viessem a compor o Governo.
Essas circunstâncias mudaram inteiramente, assim como o quadro das preocupações a que os serviços de informações tem de fazer face. Não podemos continuar a encarar esta questão como se se tratasse de uma ordem pública interna que estivesse sempre em causa, não podemos continuar a imaginar que há uma luta constante em relação a um governo que não está limitado pela legalidade - algumas vezes faltará a ela, mas não é essa a questão essencial.
O problema é que estes serviços ligados à segurança, à defesa e à informação militar estão, neste momento, em toda a área ocidental, pelo menos, a sofrer uma variação, que corresponde a uma linha evidentíssima na própria NATO, é que a NATO é cada vez menos militar e mais política, porque as responsabilidades que está a enfrentar já não correspondem ao ambiente militar em que foi criada e a que nós também procurámos corresponder nessa data.
Por isso mesmo, a definição dos serviços, neste momento, do ponto de vista técnico, precisa sobretudo de ter em vista a reavaliação dos objectivos, porque esses objectivos, hoje, dizem muito respeito à vida económica, à vida científica, à vida tecnológica, etc., e nós até temos exemplos entre nós. Escusávamos de ter sido surpreendidos com o caso TOTTA, se tivéssemos um serviço de informações habilitado a enfrentar as circunstâncias novas que o País enfrenta.
Por outro lado, no que toca à discrição dos serviços, é necessário ter em conta que eles, ocupando-se da segurança do País, atendendo a factores externos mas debruçados necessariamente sobre a vida interna do País, precisam de ter credibilidade e confiabilidade em relação ao estrangeiro. E estamos talvez esquecidos que, entre 1974 e 1984, Portugal deixou de ser receptor de informações da NATO, porque não era confiável como membro da Aliança Atlântica. Não foi uma humilhação para o País mas uma lição de humildade que ele leve de sofrer. Portanto, este problema da confiabilidade e da credibilidade em relação ao estrangeiro é uma questão que temos de pôr na primeira linha.
Assim sendo, temos, em primeiro lugar, de fazer uma reavaliação de objectivos e de ultrapassar as questões de pura segurança pública e, em segundo lugar, de preservar inteiramente a credibilidade dos serviços em relação à comunidade internacional a que pertencemos.
Depois, devemos também debruçar-nos seriamente sobre a credibilidade de respeito pela lei da parte do Governo. É que nós não podemos fugir à circunstância de que a responsabilidade principal nesta matéria cabe ao executivo e de que o serviço de informações, pela sua própria natureza, não pode estar facilmente acessível a qualquer força política ou instância que o queira analisar. E os serviços mais sujeitos à experiência de controlo democrático dão-nos constantemente exemplos de abusos extraordinários. De facto, foi publicado, há poucos dias, um livro com as memórias do Rei de Marrocos e até ele se mostra surpreendido com os abusos que os serviços de informações do General De Gaulle praticaram naquela data em relação a opositores, designadamente na Argélia.
Todos nos lembramos de que, num grande país de experiência democrática, como é os Estados Unidos, o Presidente Reagan teve dificuldades em explicar como é que aconteceu a intervenção e utilização dos serviços em relação aos Contras.
Os perigos são realmente grandes de que o poder, seja qual for a sua tradição ou o ambiente cultural em que está mergulhado, venha a abusar. Para isso, a única indicação que encontro nos autores que tratam deste assunto, a única garantia, é a honestidade do Governo. Nesta matéria, exactamente como na matéria conexa do segredo de Estado, não há outra garantia que não a da confiabilidade do Governo.