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9 DE MARÇO DE 1995 1681

Compete-nos a todos, homens e mulheres, a tarefa de concretizar, em medidas efectivas, um estatuto que já ganhou foros de cidadania, para que, no futuro, a efeméride que há 94 anos se comemora neste dia possa fenecer tranquilamente, com a consciência do dever cumprido.
Aplausos do CDS-PP, do PSD, do PS, do PCP e do Deputado independente Manuel Sérgio.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O dia 8 de Março de 1995 tornará a deixar nas mulheres portuguesas os sentimentos de insatisfação que nos últimos anos se vão acrescentando,
«O tempo não está para graças»... ouve-se, constantemente, lá fora.
É o filho que se veste à pressa para ser deixado em casa de um familiar mais disponível ou na ama, que preenche os seus anos de desemprego cuidando de crianças; é o marido massacrado pela ameaça de encerramento da fábrica; é ela própria, atabalhoando os trabalhos domésticos com os cuidados dos filhos e o trabalho na linha, em gestos de que já não guarda memória; é o questionário que se preenche, na ânsia de um emprego, com um zumbido nos ouvidos, que não dá sequer para perceber o sentido: «Está grávida? Quantos filhos tem? São saudáveis? Pensa casar?»
A vida não está para graças...
E os olhos alongam-se na figura do filho adolescente e nas solicitações que podem aguardá-lo no caminho para a escola e que ameaçam marcar o seu percurso pela vida.
Há dias que revolucionam o presente com memórias do passado. Um desses dias é, precisamente, o dia 8 de Março, que, com o 1.º de Maio e o dos Mártires de Chicago, continua a ser o eco das lutas operárias no feminino, das lutas da mulher pela paz, contra a opressão, pela democracia.
Percorro preguiçosamente, com o gosto de me deter devagar em cada linha, o livro Subsídios para a história das lutas e movimentos de mulheres em Portugal sob o regime fascista, publicado, no ano passado, pela Organização das Mulheres Comunistas. É uma extensa e cuidada sistematização dos factos mais importantes que envolveram as mulheres na luta pela democracia, dos factos que atestam a empenhada participação das mulheres portuguesas na vida política contra peias do aparelho repressivo e contra as algemas culturais e sociais com que se pretendia limitar a sua cidadania. Todos os cidadãos eram iguais perante a lei, ressalvadas, quanto ao sexo, as diferenças de tratamento justificadas pela natureza.
Mas a mulher bem cedo se apercebeu de que a democracia é inseparável de um estatuto de plena cidadania e por isso as encontramos desafiando o aparelho político e económico da repressão e da exploração.
Elas fizeram, de facto, greve de braços caídos, greves políticas, greves pelo direito ao trabalho e ao salário.
Elas, as vendedeiras do Mercado do Bulhão, pararam as vendas em 17 de Dezembro de 1949 e manifestaram-se contra a prisão, nesse mesmo dia, de Virgínia Moura do Movimento Nacional Democrático.
Elas, as mulheres da delegação do Porto da Associação Feminina Portuguesa para a Paz, exigiram ao Secretário-Geral da ONU, em 1950, a proibição do uso de armas atómicas e a assinatura de um pacto de paz; elas, as operárias têxteis de Matosinhos, pararam os teares em sinal de protesto e de solidariedade para com camaradas suspensas e elegeram, nesse remoto ano de 1950, uma comissão de unidade.
Elas afrontaram a polícia na Marinha Grande, em 1949, protestando contra a ameaça do subsídio de desemprego, o mesmo acontecendo em Setúbal, em Matosinhos e no Algarve, no remoto ano de 1952. exigindo para as operárias conserveiras o pagamento do mês de defeso e protestando, em greve, contra o trabalho nocturno e por empreitada
Elas comemoraram em força o dia 8 de Março de 1970 - já estava muito perto o Abril de 1974 -, em Silves, Loures, Lisboa, Moscavide, Porto, Setúbal, Évora, Gondomar, Santarém, Alhos Vedros e Barreiro, com palestras, comunicados, greves e concentrações.
Elas editam um boletim clandestino, de seu nome Catarina, que o Alentejo viu nascer.
Elas aceleram a passada para a meta do dia 25 de Abril, exigindo, em 1973, amnistia para os presos políticos e o fim da guerra colonial, apelando também à luta contra o aumento do custo de vida, contra os monopólios e pela obtenção das liberdades democráticas.
Elas sentiram a mudança que ia entrar pelas casas.
Elas sabem, de um saber de experiência feita, da lei que se mudou, da dignidade dia a dia conquistada, porque, como diz Maria Teresa Horta, «Abril deu-lhes o gesto e a palavra».
E porque sabem tudo isto, ao sentirem, neste dia sempre renovado, que a vida não está para graças, não deixam de questionar o futuro, com mágoa nas entrelinhas, mas sabendo que os tempos são, eles próprios, de mudança e que a resposta vem com o vento que passa.
É certo que, hoje, dos mais de 410 000 trabalhadores desempregados, 231 000, ou seja 56,3 % do total, são mulheres. Não é bonito dizer isto numa sessão comemorativa do Dia Internacional da Mulher, mas é a verdade.
É certo que no ano de 1994 o número de mulheres desempregadas, registadas nos centros de emprego, aumentou em cerca de 20000, o que representa um aumento de quase 10 %. Não é uma frase bonita de se ouvir, mas é verdade.
A maior taxa de incidência do emprego feminino apresenta-se nos sectores de baixos salários e de menor qualificação. A remuneração média da mulher trabalhadora situa-se muito abaixo da remuneração média nacional (entre menos 10 % nos serviços sociais e menos 38 % nos têxteis e vestuário). Será incómodo de se ouvir, mas é verdade.
O emprego feminino tem maior incidência nos sectores de actividade e profissões que pagam mais baixos salários e em que o grau de qualificação é mais baixo (serviços de limpeza, têxteis, vestuário, serviços pessoais e domésticos, hotelaria e comércio retalhista)
O emprego feminino concentra-se, sobretudo, nos níveis de qualificação profissional mais baixa. Cerca de 26 % do emprego feminino tem o epíteto de «não qualificado» e de «aprendiz» ou de «praticante». É incómodo, mas é verdade.
A grande parte do emprego feminino tem características de emprego precário, fomentando-se desta forma a insegurança dos agregados familiares.
A vida não está para graças...
Elas, aqui e hoje, defrontam-se, afinal, na barreira onde defendem e exigem igualdade, com as consequências de uma política que, a nível mundial, torna as mulheres nas primeiras vítimas da indústria de armamento. Elas são também vítima das medidas demográficas isoladas, sem o acompanhamento de projectos para o desenvolvimento económico e social, e ainda as primeiras vítimas da ganância de 20 % dos países do Mundo que detêm 80 % da riqueza global. Tais países delas fazem o objecto privilegiado da arma