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1602 I SÉRIE - NÚMERO 49

da pobreza, usada politicamente para defesa de privilégios, como garante de discriminações e como pilar de uma ordem desumana que afronta os explorados. Logo, as mulheres.
Mas da memória vem o sopro de lutas já vencidas. Lutas que à mulher trouxeram a dignidade, a liberdade e a participação activa na política.
Não precisam as mulheres de mentores nem de olhares paternos, pois resignadas não são. Elas sabem e querem lutar, dia a dia porfiam pelos seus direitos económicos, sociais e culturais, pelos seus direitos políticos.
Que as não saibam ouvir é coisa de somenos importância, coisas de um Aristófanes menor, zombando da Assembleia de Mulheres. São coisas que a História contará na luta das mulheres.

Aplausos do PCP, do PS e do Deputado independente Manuel Sérgio.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Leonor Coutinho.

A Sr.ª Leonor Coutinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Esta Assembleia da República renova, ano após ano, a celebração do Dia Internacional da Mulher, num ritual que também vai variando ano após anos mas que, persistentemente, nos lembra a condição das mulheres.
Não me parece possível dizer algo de profundamente inovador para as mulheres, porque elas existem há tanto tempo quanto a Humanidade e há muito tempo que as suas condições de vida são difíceis, mais difíceis que as dos homens.
E essa condição de vida mais difícil da mulher não resulta da sua estrutura física, das suas capacidades intelectuais ou da ausência de alma, como chegou a ser discutido nesta nossa Europa, há alguns séculos, mas, sim, da organização de cada sociedade humana.
Aliás, quanto mais a ciência avança mais se reconhece a adequação biológica dos genes femininos, quanto mais a sociedade se aperfeiçoa num sentido democrático mais a mulher sabe valorizar as suas capacidades e destrói as dúvidas sobre a valoração da sua identidade.
Nasci com o desgosto dos meus pais de eu ser mulher, lutei por ser igual e usufruo hoje do imenso prazer da certeza do direito a existir e de participar, como mulher, no mundo que me rodeia.
Faço parte desta evolução do meu País. Sinto nele a Pátria da língua e da História contada nos livros, mas também a identidade profunda de uma Mátria menos conhecida mas que existe nas aspirações de todos os que querem construir, como futuro, um ideal partilhado.
Compulsando as intervenções feitas em todos estes anos, adquirimos a certeza de que os homens Deputados cantaram, como Aragon, a mulher como devir do homem, celebraram os seus méritos e reconhecem os estatutos desiguais que persistem na nossa sociedade.
As mulheres Deputadas lembraram sempre a violência de que as mulheres são vítimas, as discriminações que as atingem na vida real, e propuseram diplomas para melhorar as condições de uma igualdade desejada.
A celebração do Dia Internacional da Mulher foi por vezes festa, com bancadas cheias de Deputados e de assistência, mas foi também, muitas vezes, o travo amargo de sentir que, no Parlamento, tudo continuava na mesma e que, qualquer que fosse a composição partidária, persistia, apesar dos discursos, uma quota de homens superior a 90 %.

O País, em 1974, abriu as portas do acesso das mulheres à magistratura, à diplomacia e à carreira administrativa local e, abolindo todas as restrições baseadas no sexo quanto à capacidade eleitoral dos cidadãos, nomeou a primeira mulher para o exercício do cargo de ministra.
O Estado democrático consagrou, em menos de 5 anos, na Constituição, no Código Civil e em leis essenciais, a igualdade de direitos entre homens e mulheres.
As mulheres portuguesas souberam responder, rapidamente, em quantidade e qualidade, aos desafios da educação e do emprego.
Sr.ªs e Srs. Deputados: Portugal é, hoje, um dos países europeus onde a mulher mais participa no mercado de trabalho (44,5 % da população activa), é o país europeu onde a percentagem de mulheres nos quadros dirigentes da função pública é maior, atingindo 45 % São mulheres 61,8 % dos portugueses com menos de 30 anos habilitados com curso superior, o que na próxima década deverá permitir às mulheres compensarem o atraso educacional que transportam do passado.
Por sua vez, a percentagem de doutoramentos obtidos por mulheres passou de 5,1 % na década de 60 para 18,1 % na década de 70 e atingiu, nos anos 80, 33,7 %.
Apesar de a diplomacia e de a magistratura apenas terem sido abertas às mulheres em 1974, a taxa de feminização destas carreiras já atinge, respectivamente, 18 % e 20 %.
Em profissões tradicionalmente masculinas, as mulheres vão acedendo tranquilamente e, hoje, já são 31 % as advogadas e 40 % as médicas.
A sociedade portuguesa modificou-se, modernizou-se e, hoje, a partilha das responsabilidades entre homens e mulheres é um ponto na ordem do dia.
Toda a sociedade portuguesa celebra o dia das mulheres. São inúmeras as reuniões e os debates organizados pelos departamentos de mulheres dos sindicatos, pelas mulheres empresárias, pelas mulheres juristas, pelas associações múltiplas, etc.
A Amnistia Internacional veio aproveitar este dia para lembrar que 80 % das violações dos Direitos Humanos são praticadas sobre mulheres.
A Polícia Judiciária confirma-nos que, também em Portugal, mais de 80 % das vítimas de crimes e agressões são do sexo feminino.
A Organização das Nações Unidas lembra que as mulheres contribuem para a humanidade com dois terços do trabalho e beneficiam apenas de um décimo dos rendimentos.
O mundo inteiro está preocupado com a ausência de crescimento demográfico dos países mais desenvolvidos e com a explosão demográfica e da miséria nos países do Sul.
Nenhuma mulher quer pôr no mundo um filho que não pode sustentar e que sabe que a vida virá torturar, se puder escolher a maternidade e tiver acesso a meios anticoncepcionais.
A maioria das mulheres portuguesas desejaria ter mais filhos que pudesse acompanhar e a quem pudesse garantir educação, bem-estar e um futuro melhor. Mas a nossa sociedade pouco apoia a maternidade e a família e um filho traduz-se, em Portugal, em enormes encargos, preocupações e insegurança.
Em Portugal, as mulheres substituem as carências do Estado-Providência na educação pré-escolar, na escola e na saúde, para além das discriminações de que são objecto. Assim, não querem ter mais Filhos.
A nossa política de emigração discrimina as mulheres e não favorece o reagrupamento familiar e a integração das crianças que connosco habitam.