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2452 I SÉRIE-NÚMERO 75

tratos perpétuos são imorais! Os contratos perpétuos são contra a ordem pública.
Mas esta situação, de que todos nós temos de assumir uma quota-parte de culpa - porque, nesta matéria de arrendamento, não há inocentes -, tem uma componente social que atravessa toda a sociedade portuguesa. A melhor solução não é, não pode ser, com certeza, esperar que sejam as leis do mercado a resolverem esta questão ou este problema. Porque, Srs. Deputados, há senhorios ricos e pobres, assim como há arrendatários pobres e ricos Não e nessa área de demagogia que a questão tem de encontrar solução.
As medidas aplicáveis aos arrendamentos do passado têm de ser justas mas também graduais e não podem pretender privilegiar nem os senhorios nem os arrendatários Os interesses em jogo são maioritariamente - repito «maioritariamente» - respeitáveis. A gestão e o equilíbrio das expectativas - e não quero dizer «dos direitos adquiridos» - merecem toda a ponderação.
As inovações que o Governo se propõe introduzir no arrendamento não habitacional acabarão por resolver, de uma forma indirecta, a situação quanto aos contratos do passado. O exercício do direito de preferência se encarregará dessa missão de equilíbrio.
Sempre que houver um trespasse ou uma cessão do direito ao arrendamento, o senhorio - sem prejuízo para o arrendatário - poderá, através da preferência, retomar o local e aplicar-lhe o novo regime. E cá continuamos, outra vez, nessa área, muito grande, da liberdade contratual.
A equidade impor-se-á gradualmente, sem traumas nem custos, no mercado do arrendamento.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A problemática do arrendamento não habitacional tem acentuado na sociedade portuguesa o desequilíbrio entre os interesses dos senhorios e dos arrendatários.
O Governo apresenta-se nesta Câmara a oferecer-se para resolver esta situação para futuro. O Partido Social-Democrata concorda e aplaude.
O Grupo Parlamentar do PSD vai, portanto, votar favoravelmente esta proposta de lei de autorização legislativa, mas - e digo-o expressamente - com o sentido de que as inovações legislativas propostas só serão aplicáveis aos contratos do futuro - repito: «só serão aplicáveis aos contratos do futuro».

(O Orador reviu.) Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os seguintes Srs. Deputados: Luís Filipe Madeira, Armando Vara e Narana Coissoró.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Correia Afonso, a questão dos arrendamentos é muito complexa e V. Ex.ª abordou alguns aspectos que tocam o cerne do problema. Diria que roçou quase o que me parecia ajustado num governo que pretende rever a problemática jurídica do arrendamento urbano, não só o comercial e de profissões liberais como o de habitação
V. Ex.ª disse, e muito bem, que o arrendamento tendencialmente perpétuo é algo de insólito numa sociedade de propriedade privada. De facto, o arrendamento perpetuo retira ao proprietário a disponibilidade dos seus bens, que é algo que choca com os princípios com que vivemos.
Pergunto se não será altura, depois de tantos anos de profunda reflexão, depois de ter elaborado o que hoje é conhecido pelo RAU, alterando legislação quase centenária, de o Governo ter um rasgo como o dos liberais - com certeza, V. Ex.ª não se envergonha - dos séculos XVIII e XIX, estabelecendo para o regime do arrendamento sem prazo algo parecido com aquilo que o Visconde de Seabra aplicou à enfiteuse, isto é, criar um esquema, com ou sem laudémio, que permitisse a remissão do arrendamento
Será, talvez, um esquema complicado, mas não tanto quanto possa parecer, porque tem alguma lógica. Por um lado, defende-se o direito do proprietário, aumentando as rendas se o arrendamento ultrapassar determinado prazo, e, por outro lado, reconhece-se ao arrendatário o direito à remissão, em condições justas, a discutir. Aqui estava uma medida audaciosa, a tal que permitiria acabar com essa ofensa da ordem pública que é o arrendamento perpétuo, como o Sr. Deputado referiu.
O contrário disso, aliás, sem qualquer novidade, porque já existe na legislação portuguesa, pode levar a situações de perfeito abuso de direito para fugir à questão da perpetuidade, como, por exemplo, o estabelecimento, no próprio contrato de arrendamento, de cláusulas quase ou mesmo leoninas com vista a revisões posteriores do preço da renda.
O Estado tem, pois, de evitar também este tipo de situações em que uma família, um comerciante ou cidadão, porque em estado de necessidade, é obrigado a ceder perante exigências leoninas do senhorio, ou seja, tem de reconhecer aqui um justo equilíbrio: o arrendatário deve pagar o que é justo hoje e tem de ser protegido, no futuro, contra arbitrariedades.
Pergunto a V. Ex.ª, que é, com certeza, um dos porta-vozes da sua bancada nesta matéria, por que é que o Governo, já que pediu um prazo de seis meses - e todos sabemos que não é para cumprir -, não aguarda mais um pouco e não reúne técnicos, sociólogos, juristas e economistas. Pelo menos, teria uma equipa a trabalhar para fazer uma revisão moderna desta matéria, ou seja, não mais antiga que a revisão do século XIX!
Por outro lado, o que é que quer dizer a alínea d) do artigo 2.º da proposta de lei? Já a li três vezes e continuo sem perceber o que significa «proceder às adaptações técnico-legislativas necessárias à coerência e à harmonização sistemática da legislação de arrendamento urbano em vigor». Mas o que é isto? Peço desculpa, mas não podiam traduzir isto em português?!

Risos do PS.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Correia Afonso, como o meu colega de bancada já referiu, o Sr. Deputado fez uma intervenção conhecedora e muito avisada do problema.
Ora, a sensação com que fiquei foi a de que o Sr. Deputado sabia mais das intenções do Governo do que o que consta do pedido de autorização legislativa e também que houve uma preocupação da sua parte em fazer algo a que chamaria quase, por antecipação, uma interpretação autêntica do que vai ser a legislação que, eventualmente, será elaborada sobre esta matéria.