20 DE DEZEMBRO DE 1996 823
visando sancionar infracções cometidas no âmbito do desenvolvimento de actividades de apoio social com fins lucrativos, traduz uma medida positiva que deve merecer o nosso expresso apoio, tendo em conta que contribuirá de forma inequívoca para prevenir e punir as infracções numa área que assume cada vez maior relevância no plano social.
Constata-se, pois, que o quadro legal vigente sobre o ilícito de mera ordenação social aplicável ao licenciamento e funcionamento dos estabelecimentos que, com fins lucrativos, exercem actividades de apoio social relativas ao acolhimento de crianças, jovens, pessoas idosas ou pessoas com deficiência carece de aperfeiçoamento no que respeita à previsão de coimas a aplicar às pessoas singulares que cometam infracções, por forma a prevenir a sua prática, designadamente através de um substancial aumento do seu montante.
Esta medida afigura-se tanto mais importante quanto se sabe que irá ter uma abrangência elevada, uma vez que grande parte dos estabelecimentos que se dedicam ao exercício da actividade de apoio social pertence a pessoas singulares.
Com efeito, as alterações preconizadas pelo Governo ao quadro sancionatório previsto para as infracções cometidas por pessoas singulares no âmbito dos referidos estabelecimentos funcionarão - estamos convictos - como medida punitiva, preventiva e de desincentivo à prática de infracções, com especial destaque para as mais graves, que com alguma frequência têm sido cometidas.
Defendemos, pois, neste caso, o mesmo princípio que defendemos para as infracções cometidas por pessoas colectivas, ou seja, que o valor máximo das coimas a aplicar deve elevar-se a montantes susceptíveis de funcionarem, na verdade, como elemento inibitório e dissuasor da prática de infracções e não o inverso, por forma a que neste domínio o crime não compense efectivamente.
Constata-se, não raras vezes, que o quadro sancionatório previsto para as infracções nas mais diversas áreas não é suficientemente desincentivador, não impedindo, por isso, a sua prática nem, muitas vezes, a sua reiteração.
A possibilidade da previsão de coimas aplicáveis às pessoas singulares, com valores máximos que podem ir até aos dois milhões de escudos, valor este superior ao previsto no Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, com as alterações introduzidos pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, para o ilícito de mera ordenação social, parece-nos razoável e adequado para evitar, de futuro, a violação das normas previstas na lei.
Os objectivos pretendidos com a presente iniciativa, ou seja, a prevenção da prática de infracções, que se traduzirá numa inegável melhoria da qualidade e do bem-estar dos utentes e num reforço dos seus direitos, serão mais facilmente alcançáveis com sanções pecuniárias pesadas, complementadas por sanções acessórias, nas situações mais graves.
São os casos do encerramento do estabelecimento e da interdição ou suspensão do exercício da actividade, pois não faz sentido permitir, a quem não cumpre as obrigações decorrentes da lei, que continue a exercer livremente a sua actividade; da privação de subsídios ou benefícios concedidos por entidades públicas, pois, caso contrário, estaríamos a beneficiar o infractor, prejudicando os que cumprem as condições e requisitos legalmente impostos para o exercício da actividade, o que é inaceitável, na medida em que se traduziria num sistema injusto e socialmente desigualitário; ou, ainda, da publicidade das sanções aplicadas em determinadas situações. Esta última sanção acessória, que funcionará mais como sanção social, assume particular relevância, na medida em que pode trazer prejuízos acrescidos aos infractores.
Acresce que o cumprimento das normas de licenciamento e funcionamento dos estabelecimentos de apoio social não depende, em nosso entender, apenas de um aumento do valor das coimas aplicáveis; é necessário complementar esta medida com o reforço da acção fiscalizadora e até pedagógica do Estado, por forma a que o novo quadro sancionatório a criar tenha de facto aplicação prática. Estamos certos de que o Governo investirá também neste domínio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista apoia a presente iniciativa do Governo, na convicção de que a mesma serve os interesses do Estado, da população, em geral, e dos utentes dos estabelecimentos de apoio social, em particular.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 63/VII, que hoje sobe a Plenário da Assembleia da República e em que o Governo solicita autorização legislativa para rever o ilícito de mera ordenação social aplicável ao licenciamento e fiscalização dos estabelecimentos que desenvolvem actividades de apoio social no âmbito da segurança social, merece, por parte do Grupo Parlamentar do PCP, uma especial atenção, dado tratar-se de matéria extremamente importante para os cuidados e bem-estar dos utentes de lares lucrativos, quer se trate de lares de idosos ou lares de deficientes, que cabem no âmbito da presente proposta de lei.
Em primeiro lugar, quanto ao objecto, parece-nos importante salientar que não pode nem deve tratar-se apenas de aprovar o regime do ilícito de mera ordenação social aplicável à violação das normas relativas ao licenciamento e à fiscalização dos estabelecimentos que desenvolvem actividades de apoio social, no âmbito de protecção social.
Como é sobejamente conhecido de todos, os lares lucrativos têm crescido por todo o País, quase como cogumelos, por deficiente resposta de estabelecimentos oficiais ou por ausência de capacidade dos lares das IPSS, mas, o que é pior, têm aparecido também, sobretudo na mira do lucro fácil, numa área extremamente carenciada como a dos lares de idosos. É nesta área que se têm feito sentir as maiores deficiências, pois a capacidade de resposta, como já foi salientado, é mais deficiente, pese embora se reconheça o muito e bom trabalho que está a ser feito por parte das IPSS.
Cabe ao Governo, antes de mais, incentivar a criação de lares não lucrativos, apoiando as instituições, quer ao nível de infra-estruturas e equipamento, quer ao nível dos acordos a celebrar, sejam eles típicos ou atípicos, para os cuidados, com qualidade, a prestar aos utentes desses estabelecimentos. E é por aqui, ao nível do apoio às instituições não lucrativas, que deve passar a chamada «cidadania social», como objectivo principal do Governo.
Os jovens, os idosos ou os deficientes não podem nem devem ser vistos como um «mercado» potencial para as empresas privadas que, muitas vezes sem escrúpulos, actuam neste sector.