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3 DE ABRIL DE 1997 1941

uma vez foi consensualizada. A falta, afinal de contas, não é grave.
Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Convidados: Realizando-se hoje o descerramento dos bustos dos ex-Deputados Salgado Zenha e Sá Carneiro, gostaria de evocar a sua memória e cumprimentar os seus familiares.
Comemoramos hoje 21 anos da aprovação da nossa Lei Fundamental, aprovada na Assembleia Constituinte por Deputados que aqui saudamos, mas escrita também nas ruas, nas fábricas e nos campos, nos escritórios e nas empresas, nas escolas, nas prisões, na clandestinidade e no exílio. A todos os que participaram dessa forma na escrita da Constituição da República Portuguesa queremos também saudar e apresentar a homenagem do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Esta é a Lei Fundamental da liberdade conquistada, da promessa da igualdade real de direitos e de estatuto. Acusam-na de ter "marcas semânticas" do 25 de Abril. Ainda bem que as tem. Não há muitas maneiras de dizer sonho e liberdade, participação e igualdade, democracia no país e no quotidiano, direito à educação, à saúde, a reformas dignas, ao ambiente, à habitação, numa palavra, direito à dignidade de cada um e de todo um país.
Alguns querem, a pretexto do consenso e da modernidade, uma Constituição mínima, da família das constituições liberais do século XIX. Nós respondemos que a modernidade da Constituição consiste em garantir os direitos e as conquistas obtidas no penoso caminho da luta do povo. Um caminho que permitiu incorporar mais e mais direitos fundamentais e somar aos direitos, liberdades e garantias clássicos os direitos dos trabalhadores e os direitos sociais, os direitos de participação, os chamados "novos direitos", como o direito ao ambiente.
Aqui reafirmamos que todos estes direitos devem ser cumpridos e levados à prática. É a política dos governos que se deve conformar com a Lei Fundamental e não a Constituição que deve ser reescrita de acordo com as orientações de direita dos governos que a violam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A Lei Fundamental pode ser o campo da liberdade e de um projecto transformador e de desenvolvimento do País; um projecto que não confunde abertura à Europa e ao mundo com dependência e abdicação face ao neoliberalismo e a centros burocráticos instrumentalizados pelas multinacionais.
Definitivamente, somos parte de um povo que não quer a terra de que falava o médico do Ensaio Sobre a Cegueira, de Saramago, quando dizia: "Somos feitos metade de indiferença, metade de ruindade". Queremos antes um país livre e de gente livre, em que haja campo para expandir a generosidade e solidariedade; um país em que o humanismo esteja no centro das preocupações; um país de empregos dignos, de trabalho com direitos, de representação eleitoral justa, de poder local forte e democrático.
Comemorar a Constituição não é apenas lembrar os caminhos percorridos e os caminhos prometidos; é também ponderar o momento que vivemos e o que está preparado para nos ser imposto.
Digamos claramente: o espírito da Constituição, que aponta para uma democracia aberta, real e plural, é negado pelo conteúdo e pela forma do acordo com que o PS e o PSD pretendem condicionar a revisão constitucional.
Digamos ainda mais claramente: o debate público e aberto, o confronto de ideias e o pluralismo, que constituem das mais importantes potencialidades dos parlamentos, foram substituídos pela interrupção por 100 dias do funcionamento da Comissão Eventual de Revisão Constitucional e por acordos secretos de restritos directórios partidários. Secretos para os Deputados dos outros partidos, secretos para a opinião pública, secretos, porventura, para muitos Deputados dos próprios partidos que estabeleceram o acordo.
Nem a dignidade da Assembleia da República, dos Deputados ou da vida política saiu favorecida com esta vergonhosa operação negocial.
Muito menos poderemos concordar com muitas das alterações acordadas. Apenas alguns exemplos: é desvirtuar a ideia de Constituição remeter para leis ordinárias aspectos fundamentais do sistema político, como o sistema eleitoral da Assembleia da República e das câmaras municipais.
É igualmente inadmissível, entre outros aspectos, pretender atentar contra a proporcionalidade da conversão de votos em mandatos, prejudicando a representação de partidos, regiões, sectores e camadas sociais, que, assim, ficam mais longe dos Deputados e do Parlamento; liquidar o pluralismo das câmaras; limitar direitos dos trabalhadores; adulterar o actual modelo de Estado unitário com regiões autónomas, afectando também o estatuto do Presidente da República.
Sabemos todos, igualmente, que foi estabelecido um acordo entre o PS, o PSD e o PP para criar dificuldades ou mesmo impossibilitar a regionalização. Denunciamos o manobrismo da proclamação de datas para instituir as regiões por quem fez acordos para adiar, dificultar ou mesmo impossibilitar esse objectivo.
Os mesmos que proclamaram que os Deputados e o referendo orgânico dos municípios não teriam legitimidade para instituir as regiões pretenderam inviabilizar a alteração da Constituição que permitiria o referendo sobre a Moeda única, uma das transformações com mais consequências para o nosso futuro colectivo. Nesta matéria, parece que já não se colocaria a questão da falta de legitimidade da Assembleia da República para decidir.
Em relação a estas e outras alterações negativas da Constituição não vale o argumento, que já foi usado, de que, apesar de tudo, com o que sobraria após a revisão, continuaríamos a ter uma boa Lei Fundamental. O que é importante é que cada alteração negativa acordada interpela-nos e responsabiliza todos e cada um de nós e não pode ser branqueada, seja de que forma for.

Vozes do PCP: - Muito bem!