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3 DE ABRIL DE 1997 1945

Consolidadas as instituições representativas, reorganizada a vida económica e garantidos os direitos fundamentais dos trabalhadores, ficou aberto o caminho, na década de 80, a duas revisões constitucionais, as quais, longe de empobrecerem ou violarem os princípios fundamentais da Constituição de 1976, mais não fizeram do que dispensar algumas válvulas de segurança do sistema então montado, numa salutar confirmação da maturidade democrática do regime instituído por força da Revolução do 25 de Abril.
Com efeito, tanto a aceitação de um Conselho da Revolução, até 1982, como a aposta num forte sector público da economia, até 1989, foram sempre por nós entendidas não como princípios imutáveis da arquitectura institucional do Estado ou da organização económica da sociedade mas, sim, como benéficas e úteis almofadas de protecção de uma democracia cujo parto não foi fácil.
De facto, só por ingenuidade ou má fé se poderia pretender que um país saído de uma longa ditadura, apoiada num velho e conservador patronato que prosperou à sua sombra, e tendo acabado de experimentar em ano e meio o choque de projectos de sociedade tão antagónicos como aqueles que se defrontaram entre nós, seria capaz de singrar despreocupadamente e em segurança as rotas de cruzeiro das consolidadas democracias europeias, sem recorrer a dispositivos políticos e económicas preventores do risco de involuções antidemocráticas.
As revisões constitucionais nunca foram, pois, para os socialistas, actos de ruptura com a Constituição de 1976 que configurassem atitudes de arrependimento tardio em relação a alguns dos seus mecanismos instrumentais. Nem tão pouco pretextos para ceder à tentação de reinventar a Constituição, que ciclicamente acomete os que, bem no íntimo, não se reconhecem no essencial do labor dos constituintes.
As revisões constitucionais serão, antes, e sempre, para nós, fruto da necessidade de alargar e melhorar os meios que, em cada circunstância histórica e em função da experiência adquirida, permitem uma mais plena afirmação da cidadania e um mais democrático exercício do poder político, no pleno respeito pelos princípios fundamentais da Constituição de 1976, sem cairmos, porém, no exagero das revisões consecutivas e a todo custo, ditadas quer por propósitos de guerrilha partidária quer por excessivos perfeccionismos, quiçá obedecendo mais a desejos de exibicionismo retórico de uma constitucionalite aguda do que a efectivos anseios da sociedade civil. Porque se há um valor democrático que importa igualmente preservar, ele é o da estabilidade constitucional, inequívoco sinal de maturidade e normalidade na vida política de um país e mesmo de respeito e admiração pelo seu património histórico de valores e princípios democráticos.
Houve mesmo, por isso, quem nas nossas fileiras questionasse a utilidade e a necessidade da actual revisão constitucional, sobretudo na presente conjuntura política em que a nova maioria socialista tem contribuído para dissipar os temores suscitados pela prática política da velha maioria cavaquista. Apesar disso, o PS entendeu que a crise de legitimação que, nesta viragem de século, espreita as democracias ocidentais, justificava a introdução no texto constitucional de alguns salutares dispositivos preventores, do perigo de um crescente divórcio entre as instituições e os cidadãos, perigo esse porventura não eliminável apenas por via de um diferente estilo de governação.
Por isso, partimos para a actual revisão animados pelo propósito de responder a esse desafio, mais cultural que juridicista, de promover o revigoramento e aprofundamento da dinâmica participativa do regime democrático, cientes de que assim poderíamos contribuir para evitar a desvinculação social dos cidadãos em relação ao espaço público, com a consequente emergência de indesejáveis pulsões populistas, frutos tantas vezes de um individualismo atomista e egotista.
O acordo de revisão constitucional entretanto alcançado com o PSD veio criar as condições políticas necessárias para que tal propósito se veja satisfeito. Com efeito, para além de positivos aperfeiçoamentos do regime constitucional de direitos, liberdades e garantias, o acordo contempla uma indesmentível abertura do sistema político aos cidadãos, na base de um novo equilíbrio entre uma democracia representativa reforçada na sua componente parlamentar e formas de iniciativa e participação directa dos cidadãos, e viabiliza ainda reformas descentralizadoras e impulsionadoras de uma maior transparência no exercício do poder, sem que, obviamente, ponha em causa qualquer dos princípios fundamentais da Constituição de 1976, a começar pelo sistema de representação proporcional, o qual é, aliás, não o esqueçamos, um dos limites materiais de revisão.
Não esperem, porém, de nós, no momento presente, exercícios contabilísticos sobre o deve e haver de tal acordo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Porque apesar do papel determinante sempre desempenhado pelo PS desde a Constituinte, entendemos que nem a Constituição nem qualquer das suas revisões deve ser objecto de apropriação partidária. Quem se empenha em retirar dividendos partidários de um acordo de revisão constitucional só demonstra duas coisas: primeiro, que não tem sentido de Estado; segundo, que continua a ter um enorme défice de credibilidade política, que assim se esforça por colmatar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A actual revisão constitucional não se esgota, porém, no acordo alcançado entre o PS e o PSD. Por um lado, seria desejável que muitas das suas soluções viessem a obter o acolhimento de todas as forças partidárias sinceramente empenhadas no reforço dos direitos dos cidadãos e no melhoramento dos mecanismos da democracia participativa. Por outro lado, existe ainda um amplo campo de consenso interpartidário em muitas matérias não contempladas no acordo.
Seria lamentável que o alargamento do consenso da revisão constitucional acabasse por ser inviabilizado em função de motivações de pura guerrilha partidária, ditadas mais por cálculos políticos interesseiros do que por sinceras objecções ideológicas.
Pela nossa parte, a celeridade que importa imprimir desde já à conclusão do processo de revisão não será impeditiva da necessária abertura a um tal consenso alargado, na certeza de que o País carece agora de um longo ciclo de estabilidade constitucional, que esta revisão deveria proporcionar.