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3 DE ABRIL DE 1997 1947

originariamente previsto, com ablação de limitações ao funcionamento de um sistema de economia mista - de mercado com controle - deslizante para um sistema de mercado aberto, hoje exigência da nossa integrarão comunitária, temperado, ao nível da distribuição, por fortes preocupações de justiça social. Uma terceira revisão, de âmbito restrito, limitou-se a afastar calços constitucionais na roda da nossa adesão à União Europeia.
A partir daí, a Constituição de Abril atingiu um grau de maturidade e um ponto de equilíbrio que reduziram o significado e o âmbito da que está em curso. Nesta, já se não enfrentam bloqueios constitucionais ou embargos políticos dignos de registo. A vida portuguesa, na sua complexidade, tem cabido na sua moldura sem constrangimentos éticos, políticos ou mesmo sociais. Couberam nela governos constitucionais e presidenciais; de maioria absoluta e de maioria relativa; monopartidários ou em coligação; de esquerda, de centro e de direita. A dissolução do Parlamento, a demissão de governos, ou mesmo a sua queda antecipada podem considerar-se excepção. E é patente a inexistência de movimentos de opinião da orla da sublevação popular contra ela.
Discordâncias, sempre as haverá. Mas são mais o reflexo de insatisfações pessoais do que de exigências colectivas.
Srs. Deputados, tendes no torno, à espera do vosso fiar, a revisão em curso. Vai ocorrer o que sempre ocorreu: uns a quererem-na maximalista, outros minimalista, outros assim-assim.
Afastado parece, se bem ajuízo, o risco de um impasse. Desejariam muitos - e eu incluo-me nesses - que a tentativa de afastamento desse risco tivesse tido lugar no cenário "a cinco" da própria Comissão de Revisão.

Aplausos do Deputado do PS Manuel Alegre.

E isso teria sido possível, ainda que por apelo a suplementos de flexibilidade e paciência.
Mas não o entenderam assim as direcções dos dois principais partidos, únicos que podem assegurar a maioria de votos necessária a que a revisão se faça. Optaram por entender-se a céu aberto, de preferência a entenderem-se por debaixo da mesa, simulando que o faziam em cima dela. Nestas emergências, o recurso à simulação - que também dá pelo nome de hipocrisia não é tão raro quanto isso.
Se considerarmos que a opinião de todos é relevante, mas que só o voto de dois o é, e que as dificuldades do processo se concentram assim na vontade destes, tenho de reconhecer que afinal lamento o que, de certo modo, decorre da natureza das coisas.
Compreendo que os que defendem o statu quo constitucional, propendam a defender, para a sua alteração, os caminhos que assegurem um grau maior de imobilismo e dificuldade. Os que, pelo contrário, defendem a subversão do aquis constitucional vêem com maus olhos a sua marginalizarão da fase verdadeiramente decisória, convictos a justo título de que poderiam influenciar as decisões. Os que se situam entre esses dois extremos e querem impor a sua marca nos equilíbrios a estabelecer, tendem a prezar mais os círculos fechados do que a discussão aberta. É natural que seja assim.
Daí que a história se repita. Sempre que os dois principais partidos cederam à tentação de circunscrever a si próprios o núcleo dos decisores relevantes dirão que são os resultados eleitorais que ditam esse constrangimento mas o argumento, tendo lógica quantitativa, não tem tanta quantidade lógica.
Não me cabe ajuizar - pelo menos neste momento sobre o mérito ou demérito do essencial da revisão que se desenha. Mas uma coisa podemos ter desde já por certa: a próxima revisão também não será descaracterizante. Respeita os limites materiais de revisão e, para além desse respeito, deixa inalterada a constituição material. Muito provavelmente, vai acontecer o que sempre aconteceu: ser a revisão considerada má até que, após a sua aprovação, todos a julguem boa e voltem a rever-se, globalmente, na Constituição de todos nós. Partos constitucionais sem dor é que é milagre de que não há notícia.

Risos do PS e do PSD.

Pode questionar-se durante quanto tempo vai o essencial da identidade caracterial do povo português manter-se fiel à herança histórica com a qual se conformou.
A dúvida tem esta explicação: o mundo está registando mutações abissais de realidades, valores e comportamentos. Na origem delas estão saltos tecnológicos que tudo subvertem e os modelos organizativos e institucionais do passado começam a revelar preocupantes sinais de desadequação. Pior do que isso, apavorantes sintomas de incapacidade de aggiornamento. "Num mundo que muda - já lembrava Ripert - não são admissíveis verdades eternas".
Continuamos no entanto a pensar, a funcionar e a agir como se tudo continuasse a ser o que foi, mas já não é. Continuam a existir constituições que cheiram a Montesquieu, a Adam Smith, à Rerum Novarum e a Jean Monnet, enquanto que a realidade de hoje, em acelerado processo de subversão e mundialização, rejeita os mitos confortáveis desses pais do próximo passado e rebenta pelas costuras do constitucionalismo do presente.
Quero dizer com isto que, mais do que nunca, temos de estar preparados para evoluir e mudar, de olfacto apurado para o cheiro dos cadáveres institucionais, sistémicos, valorativos e comportamentais a que continuamos agarrados, que bem podem ser alguns dos pilares constitucionais que temos por duráveis. Precisamos, mais do que nunca, de antenas prospectivas da realidade do futuro e de rejeitar, mais do que nunca, o espírito dogmático e conservador.
Começo a ter a dolorosa intuição de que o futuro previsível não cabe nas constituições do presente. Mas esta não é uma premonição própria para dias de consagração e de festa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Convidados: Salgado Zenha e Sá Carneiro foram dotados daquela capacidade de antecipação do futuro que torna os homens grandes.
Em plena ditadura, anteciparam - lutando por ele um futuro de liberdade e democracia; por entre os excessos de Abril, lutaram por equilíbrio e moderação. E quando a liberdade e a democracia, por momentos, estiveram de novo em risco, bateram-se uma vez mais por elas. Figuram, por direito próprio, na galeria dos mais nobres pais do moderno Estado de direito português.