6 DE MARÇO DE 1998 1535
dianos, um país onde os atentados à paisagem e ao equilíbrio ecológico são uma constante.
Estas são razões mais do que suficientes para compreender a importância de uma lei de bases do ordenamento do território, pela qual, durante anos. Os Verdes pugnaram: uma lei de ordenamento do território que viesse articular os princípios há mais de uma década previstos na Lei de Bases do Ambiente (mas nem por isso desactualizados) e definir o processo integrado de organização do espaço biofísico com base em critérios claramente definidos, de modo a permitir uma ocupação humana e de actividades que garantam uma gestão racional dos recursos naturais e a sua capacidade de auto-regeneração, que assegure uma utilização do solo de acordo com as suas potencialidades e a valorização do património natural e cultural, que propicie o envolvimento e participação dos cidadãos neste processo com mecanismos eficazes, que favoreça um novo tipo de estabilidade ecológica na sociedade.
Razões para compreender a importância deste debate, que aliás, a viva discussão pública que o antecedeu, com eloquência, evidenciou; razões para compreender a expectativa que, ao fim da tantos anos, em torno deste diploma se gerou; razões para compreender uma certa decepção face à proposta apresentada e à filosofia que a inspira. Uma decepção que esperamos possa ser alterada, já que pouco o foi no fim da discussão pública, no processo de discussão agora iniciado. Um processo para Os Verdes demasiado importante para que se possa fechar às criticas, antes precisa de as incorporar e preencher as grandes lacunas e ambiguidades que a proposta de lei traz consigo.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Se é certo que a proposta de lei é um contributo para melhorar o enquadramento do processo de planeamento em Portugal, designadamente na tentativa de articular num único diploma todos os princípios, instrumentos, intervenientes e respectivas responsabilidades, de tipificar a natureza e o nível dos diferentes instrumentos aplicáveis como os planos, programas e esquemas, de estimular o direito de participação pública dos cidadãos, certo é também que o diploma não equaciona, e, quando o faz, resolve, com ambiguidade ou mal, questões fundamentais que a experiência em Portugal revela incontornáveis e que é forçoso alterar. A saber: a desarticulação total das políticas sectoriais incapaz de garantir o desenvolvimento sustentado; a completa ineficácia de medidas regulamentares relativas aos recursos hídricos e florestais; a inadequada utilização dos vários níveis de planeamento e gestão; os excessos de avidez especulativa, a falta de sensibilidade estética, e o empobrecimento constante da paisagem; a ausência de uma visão integrada, de prevenção e de longo prazo, de modo a evitar o divórcio insustentável entre o ambiente e o ordenamento do território e a necessidade urgente de inverter radicalmente a actual lógica. Questões que o diploma, embora, de algum modo. enuncie não resolve adequadamente, revelando-se, a este nível pobre. pouco consistente e incapaz de incorporar novos conceitos.
Uma necessidade de alteração que assim ficará comprometida ao não se entender (como é visível no diploma em discussão) o ordenamento do território como um sistema, mas tão só como um meio de instalar no território determinadas actividades; uma alteração que ficará comprometida ao considerar-se, como chocantemente se faz, de modo parcelar, o ambiente como uma componente entre tantas outras, quase silenciada, com caracter residual, sem compreender que ele é um elemento estruturante da organização da sociedade, logo, uma constante que tem de pautar todo o desenvolvimento humano e ecologicamente equilibrado; uma alteração que Ficará comprometida se se teimar persistir na dicotomia redutora entre o rural e o urbano, teimando num conceito hoje totalmente ultrapassado; uma alteração que ficará comprometida se o solo, embora recurso escasso que é, continuar a não obedecer a critérios muito precisos de ocupação, de acordo com as suas características e se nele se persistir ignorar coisas tão importantes como a Reserva Ecológica Nacional, a Reserva Agrícola Nacional, a Rede de Áreas Protegidas e a futura Rede Natura 2000, ciclicamente fazendo pagar com dinheiros públicos erros privados, como recentemente ocorreu com gastos no litoral algarvio e na recuperação, após as cheias, de construções, por ocupações que nalgumas áreas nunca deviam ter existido.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O universo de questões que a lei de bases do ordenamento do território nos coloca é imenso! São questões que se prendem com aspectos que vão desde a manutenção de regimes de excepção mal clarificados nos chamados planos especiais à incompreensível desvalorização dos planos de pormenor. passando pela não referência a meios técnicos - como dados cartográficos e cadastros, entre outros, que pura e simplesmente não são mencionados.
Mas as questões em causa prendem-se, acima de tudo. com a ausência de diplomas fundamentais para a definição de uma arquitectura coerente do ordenamento do território em Portugal e para a sua discussão efectiva: a lei de expropriações e o regime de ocupação de solos. Dois diplomas sem os quais a discussão de hoje corre o sério risco de se tornar um exercício abstracto, que importa, de todo em todo, evitar. Propostas de lei em falta e que, a par de uma nova Lei de Finanças Locais, também ela ausente (essencial para pôr cobro à insustentável situação de fazer do betão forma perversa de financiamento das autarquias), permitam uma abordagem coerente, global e séria dos diferentes problemas e que permitam a elaboração de uma lei de bases do ordenamento do território que dê resposta aos importantes desafios colocados e ponha termo à permanente degradação dos bens patrimoniais comuns para servir vulgares interesses privados e que, no fundo, dê resposta aos importantes desafios colocados. Respostas que tardam e é preciso encontrar em nome da qualidade de vida dos cidadãos, em nome da solidariedade entre gerações, em nome do direito ao futuro e a um desenvolvimento ecologicamente sustentável.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dado o adiantado da hora vou reduzir drasticamente a minha intervenção, mas não posso deixar de fazer algumas observações a propósito da intervenção do nosso querido colega e amigo, Jorge Góes. quando se referiu ao activismo político e fez algumas considerações sobre as nossas convicções.
Em relação ao activismo político, devo dizer que é o mesmo de sempre, e ainda bem que V. Ex.ª o mencionou. o que só prova que tem estado atento nestes anos de democracia ao activismo político dos outros.