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30 DE ABRIL DE 1998 2179

O Orador: - Ninguém pode ignorar o alto preço que a concessionária do serviço público foi obrigada a pagar para viabilizar a configuração do actual panorama televisivo. Desde logo, ao ser esbulhada de todo o vasto património que constituía, até à criação da TDP, a sua rede própria de transmissão e difusão de sinal televisivo, hoje integrada na Portugal Telecom e por cuja utilização a RTP paga, sem que se perceba com que critério, muito mais do que qualquer outro operador. Isto para além de ter perdido a taxa de televisão, que constituía, como se sabe, uma fonte de receita do serviço público e para a qual não foi estabelecida nenhuma contrapartida específica.
Ninguém ignora que a implantação dos novos operadores no mercado publicitário não se deveu apenas a conhecidas tácticas de dumping, mas também a uma política deliberada, decidida já pelo actual Governo, de abdicar voluntariamente de uma fatia do mercado publicitário, como forma de subsidiar indirectamente os operadores privados.
Ninguém ignora que os Governos, tanto o anterior como o actual, têm fechado os olhos perante as mais grosseiras violações das regras aplicáveis à inserção de publicidade nas televisões, que manifestam em muitas situações o mais completo desrespeito para com os espectadores.
Ninguém ignora que os operadores têm beneficiado de uma situação de quase total desregulação da actividade de televisão e de um inadmissível laxismo da parte do poder político, que tem pactuado com violações grosseiras das leis do país, como nos célebres casos da não transmissão de tempos de antena eleitorais ou da divulgação de sondagens no próprio dia das eleições antes do fecho das umas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na exposição de motivos da proposta de lei o Governo fundamenta em razões tecnológicas a necessidade de alterar de novo o quadro legal da televisão em Portugal. Afirma-se que, com a evolução tecnológica do sector foi ultrapassada a limitação constituída pela exiguidade do espectro radioeléctrico, deixando de fazer sentido as restrições vigentes ao exercício da actividade de televisão.
Esta evolução tecnológica é um facto indiscutível, mas mal andará o legislador se considerar que as opções numa matéria como esta podem ser remetidas exclusivamente para as circunstâncias ditadas pela evolução tecnológica.
Não é assim! A questão da necessidade de licenciamento, do nosso ponto de vista, não decorre exclusivamente do problema da limitação do espectro radioeléctrico. Não visa dar resposta a questões tecnológicas mas de conteúdos. Um canal generalista difundido por cabo não pode deixar de dar garantias de cumprimento das obrigações legais dos canais generalistas, em termos legalmente previstos.
As regras de acesso à actividade de televisão não podem ser as mesmas que regulam a venda de um qualquer electrodoméstico. A televisão é uma indústria de conteúdos. Os frigoríficos congelam alimentos, mas as televisões informam cidadãos, trabalham consciências, impõem gostos e valores e determinam comportamentos sociais.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quem está na corrida ao aproveitamento das novas possibilidades tecnológicas ao nível da televisão não são os cidadãos comuns. São, mais uma vez, os grandes grupos multimédia, apostados em conquistar mais poder económico e mais influência social destinada a consolidar esse mesmo poder.

É neste quadro, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, hoje mais do que nunca, importa consolidar o serviço público de televisão e contrariar os propósitos dos que se lhe opõem. Secundando, aliás, a conclusão extraída pela Comissão de Reflexão sobre o Futuro da Televisão, de que «no contexto da previsível diversificação de canais, caberá ao serviço público de televisão uma responsabilidade acrescida no desempenho das suas missões».

O Sr. António Reis (PS): - Muito bem!

O Orador: - Na nossa concepção, o serviço público de televisão não pode limitar-se a ser um serviço que o Estado pague à peça. O serviço público de televisão é, acima de tudo, um instrumento decisivo para os cidadãos. É, ou deve ser, um espaço livre das pressões das audiências e do domínio do poder económico, salvaguardada que seja a sua viabilidade, a sua estabilidade e a sua democraticidade.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não nos conformamos também, por isso, com uma concepção assente numa suposta vocação minoritária ou elitista do serviço público, de programação quase confidencial.
Como já alguém disse, não há serviço público sem público e não é inevitável que a conquista do público tenha de ser feita à custa da falta de qualidade ou da exploração do sensacionalismo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Acreditamos, pelo contrário, que com o incentivo da produção nacional e com a valorização do nosso património e dos novos valores artísticos, culturais e criativos, é possível ter uma boa televisão de serviço público, para o público e com público.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O serviço público de televisão não é um resquício do passado. É antes, uma exigência do futuro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei do Governo contém aspectos que consideramos positivos. Saliento quatro desses aspectos: em primeiro lugar, a adopção de algumas normas destinadas a dar alguma transparência à titularidade de participações sociais em operadores de televisão; segundo, a regulação da aquisição de direitos exclusivos que incidam sobre a transmissão de acontecimentos que sejam objecto de interesse generalizado do público, por forma a permitir a transmissão por outros operadores caso os titulares dos direitos exclusivos não emitam em regime aberto ou não assegurem a cobertura nacional, bem como a permitir, em qualquer caso, a recolha de extractos informativos desses acontecimentos por parte de todos os operadores; terceiro, o estabelecimento de quotas mínimas de transmissão de produções televisivas nacionais e em língua portuguesa, bem como a adopção de medidas de incentivo à produção nacional; quarto, a consagração de medidas de salvaguarda do património audiovisual, quer através da obrigatoriedade de a concessionária do serviço público conservar e actualizar os arquivos audiovisuais e facultar o seu acesso, quer através da obrigatoriedade de todos os operadores organizarem os respectivos arquivos audiovisuais.