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21 DE N7A10 DE 1998 2459

cultural.
Exigir-se-iam ao Governo soluções reais para problemas reais. É urgente que essas soluções apareçam.
Sr. Ministro, pequenos remendos, pequenas operações cosméticas não resolvem os graves problemas da Justiça portuguesa, antes os perpetuam e fortalecem.
Os portugueses não acreditam ri á Justiça portuguesa!
É urgente devolver aos portugueses confiança na justiça e coloca-la, efectivamente, ao serviço dos portugueses.
Neste quadro, que é grave, de solução difícil, que exige o esforço empenhado e persistente de todos os profissionais de justiça e dos próprios cidadãos, no quadro de uma solução fortemente consensual e mobilizadora, caberia ao Governo, ao menos por uma questão de mínima razoabilidade, apresentar hoje a esta Assembleia um conjunto de diplomas que contivessem virtualidades mínimas de serem um inicio de soluções definitivas para toda esta complexa problemática.

O Sr. José Magalhães (PS): - E então não o fez?!...

O Orador: - Já lá vamos.
A importância do momento não permitiria outra coisa. O anúncio feito nesta Câmara, há semanas, pelo Sr. PrimeiroMinistro, como a reforma das reformas, não faria supor coisa diferente.
Mas, muito pelo contrário, o Governo apresenta-se a defender nesta Assembleia estas duas propostas de lei num clima único de choque, de clivagem, de adversidade até, entre as duas magistraturas, as quais a bondade da reforma deveria, de sobremaneira, e mobilizar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas isso é da responsabilidade do Governo?!...

O Orador: - Politicamente o Governo não acertou.
Politicamente o Governo perdeu.
Perdeu porque, por sua exclusiva responsabilidade, transformou duas propostas de lei no máximo divisor comum das duas magistraturas, vitimando, desde já e definitivamente, qualquer solução que em circunstância alguma pode prescindir do consenso e conjugação de esforços de todos.
Mas perde também pelo valor intrínseco das propostas. Assim, a proposta de reforma do Código Processo Penal mais não é do que a desresponsabilização do Estado e do Governo, como e enquanto legislador, pela administração da justiça.
A par de medidas virtualmente positivas, que removem situações que, presentemente, constituem inexplicáveis obstáculos da justiça penal, a sua implementação prática é, no entanto, susceptível de redundar, por timidez do figurino adoptado, numa decepção bem evitável. É o exemplo da possibilidade de julgamento na ausência do arguido.
Avança também com alternativas surpreendentes, surpreendentes por mal concebidas e surpreendentes por serem susceptíveis de conduzir a situações de ruptura.
Um caso paradigmático: o regime de processo sumaríssimo agora com aplicação a crimes com moldura penal igual ou inferior a três anos de prisão.
Imagine-se que há acordo entre o Ministério Público e o arguido a propósito da aplicação de determinada pena, mas que o juiz não homologa o acordo, fazendo seguir o processo para julgamento.
Sr. Ministro, qual é a situação do arguido ao ser julgado? Que julgamento vai acontecer? O que é feito do princípio constitucional da presunção de inocência ao julgar-se um arguido que implicitamente já confessou, não o querendo, e até já acordou com a medida da pena? O Estado já era mau parceiro económico, o Estado é mau pagador; temos agora a versão do Estado manhoso.
E ao invés, nos casos em que o juiz homologa o acordo entre o Ministério Público e o arguido, onde está a transparência, a pedagogia da justiça ao "acertar em gabinete" penas para crimes tão. graves como o são, por exemplo, o de abuso sexual de crianças, o de estupro com menores, os actos homossexuais com menores, a violação de domicílio com agravamento, a omissão de auxílio, o furto, a burla, o abuso de confiança, a usurpação de coisa imóvel com violência, etc.?
Entende-se este regime nos crimes de injuria e difamação, mas não se pode confundir celeridade processual com desresponsabilização do Estado na administração da justiça, patrocinando, desta forma, "negócios judiciais" formados demasiadamente longe dos portugueses.
Para nós, Sr. Ministro, o Direito Penal, pelos motivos expostos no início, é' um ramo demasiadamente sério para que possa tratado de forma demasiadamente leve. As bagatelas e os casos menores de criminalidade existem, em bom rigor. Nada em Direito Penal é de menor importância!
Mas a filosofia chave desta proposta é, exactamente, o uso excessivo da negociação, mesmo desprotegendo os direitos mínimos do arguido e dos cidadãos.
O processo sumaríssimo, o processo abreviado, o regime
de suspensão provisório do processo, o limbo da culpa, como há pouco referi, e o encorajamento da confissão.
Perante isto percebe-se agora, com clareza, o espanto e o aparente repúdio pelas nossas propostas de agravamento das penas por parte de V. Ex.ª: por causa dos direitos dos cidadãos e de uma determinada concepção de pedagogia cívica não é, uma vez que V. Ex.ª não hesita em fazer julgar portugueses despidos dos mais essenciais direitos reconhecidos. Será, seguramente, o terror de ter de suportar os custos de uma aplicação consentânea da justiça, mas susceptível de estragar os seus gráficos, os seus custos, as previsões do Governo.
A convergência nominal chegou à Justiça!
Mas chegou à Justiça com as piores implicações e consequências: o Estado enjeita as suas responsabilidades mais sagradas, que também são os seus deveres primeiros.
Por outro lado, com a proposta da lei orgânica do Ministério Público, conjugada com as novas atribuições daquela magistratura no projecto de revisão do Código de Processo Penal, acontece um dos maiores choques entre as magistraturas do Ministério Público, a judicial e, ainda, a Polícia Judiciária, que V. Ex.ª deveria ter sabido evitar. É claro o reforço do papel do Ministério Público pela sua nova estruturação e organização sem paralelo nos juízos de instrução e pelo aumento de poderes conferidos em sede de inquérito, na aplicação de medidas de coacção, de desjurisdicionalização do despacho de acusação, de determinação de medidas depena em tribunal singular e de outras mais.