14 DE JANEIRO DE 1999 1249
elemento definidor do universo eleitoral, depende, em larga medida, a própria fidedignidade dos actos eleitorais.
A definição dos princípios que ainda hoje enformam, e bem, o recenseamento eleitoral em Portugal remonta aos primeiros tempos do nosso regime democrático A garantia de um recenseamento realizado de forma correcta, amplamente participada e com condições suficientes de fiscalização por parte de todos os cidadãos assumiu-se, desde logo, como um dos princípios basilares do direito eleitoral democrático que importa hoje, e sempre, salvaguardar.
Princípio que importa salvaguardar tanto mais quanto é certo que as vicissitudes dos tempos que vão correndo têm tornado mais complexas as operações de recenseamento eleitoral, e quanto mais complexas essas operações se tornam mais importante se revela a criação de garantias acrescidas da sua genuinidade e fidedignidade.
Resulta essa complexidade do facto de integrarem, hoje, o recenseamento eleitoral cidadãos em situações diversas quanto à sua capacidade eleitoral activa c passiva, o que constitui um facto relativamente novo Para além dos cidadãos nacionais maiores de 18 anos, residentes em Portugal e recenseados no território nacional e dos cidadãos nacionais, residentes no estrangeiro e em Macau e aí recenseados, outras situações vieram, nos últimos anos, a integrar o recenseamento eleitoral.
Primeiro, passou a admitir-se a declaração antecipada da intenção de recenseamento junto das embaixadas e postos consulares por parte de cidadãos residentes no estrangeiro, havendo que cuidar da correcção da sua transposição efectiva para o recenseamento eleitoral Depois, passou a admitir-se o recenseamento de cidadãos estrangeiros residentes em Portugal, quer cidadãos da União Europeia, quer cidadãos de países da CPLP, quer de outros países, comportando situações diversas quanto a respectiva capacidade eleitoral Depois, passou a existir o recenseamento provisório para os cidadãos com 17 anos, que não completassem os 18 até ao final do período legal de inscrição, que se converte em definitiva à data em que completam essa idade.
Em suma o recenseamento foi-se tornando mais complexo na sua elaboração e, evidentemente, também no controlo do rigor com que é efectuado.
Acresce que as possibilidades técnicas hoje existentes, através do recurso à informatização, permite, não direi simplificar, mas agilizar a actualização do recenseamento eleitoral. Existe, hoje, uma base de dados centralizada relativa ao recenseamento, criada por lei especial desta Assembleia, e existe a possibilidade de utilizar meios informáticos para garantir a actualidade do recenseamento e superar a regra da actualização anual que ainda hoje vigora.
É, portanto, útil e pertinente, do nosso ponto de vista, reexaminar a lei do recenseamento eleitoral, não para alterar os princípios em que assenta, mas para encontrar formas de os garantir com maior celeridade e eficácia
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É importante garantir a existência de um recenseamento eleitoral permanentemente actualizado. É importante regular a utilização da base de dados do recenseamento já existente e a sua fiscalização. É importante também examinar todo o edifício legislativo do recenseamento, por forma a unificar num só diploma toda uma serie de contribuições legislativas avulsas que foram, entretanto, acrescendo ao sistema.
Posto isto, importa também dizer que, do nosso ponto de vista, a proposta de lei do Governo não resolve bem todos os problemas que são suscitados. Aliás, o conjunto de propostas que, hoje mesmo, nos chegaram da parte do Governo, já como contribuição para o debate na especialidade, é bem o reconhecimento desse facto. Não houve ainda tempo para apreciar essas propostas com a merecida atenção, o que será feito muito em breve, mas regista-se a sua apresentação ainda antes deste debate.
Relativamente ao texto originário da proposta de lei - e penso que as questões que vou suscitar não ficam resolvidas mesmo com as propostas agora apresentadas -, importa levantar alguns problemas que devem ser ponderadamente analisados e resolvidos, na especialidade.
O primeiro problema diz respeito ao recenseamento provisório dos cidadãos com 17 anos. Este instituto foi criado, como todos nos lembramos, para resolver um problema que decorria da anualidade da actualização do recenseamento: quem completasse 18 anos depois do último dia do mês de Maio de cada ano, só poderia recensear-se durante o mês de Maio do ano seguinte, o que, somado ao período de inalterabilidade dos cadernos eleitorais que precede cada acto eleitoral, fazia com que, em algumas eleições, só aos 19 anos se pudesse votar e, em casos limite, mesmo cidadãos já com 19 anos ficavam impedidos, na prática, de exercer o seu direito de voto.
Este problema foi resolvido - e bem resolvido - com uma lei especial que criou o recenseamento provisório. O que acontece nesta proposta de lei é que o mecanismo do recenseamento provisório é transposto para o futuro articulado, sem ter em consideração que, no mesmo diploma, se propõe que a actualização do recenseamento passe a ser mensal. E, portanto, se continua a ser indispensável encontrar um mecanismo de salvaguarda do direito de voto dos cidadãos que completem 18 anos até ao dia de uma eleição, já não faz sentido que se mantenha o recenseamento provisório generalizado de todos os cidadãos com 17 anos, que seria desnecessário para a grande maioria, com a agravante de subsistirem ambiguidades quanto à sua obrigatoriedade. Este é um primeiro problema que importa, na especialidade, analisar com cuidado
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A segunda questão que queremos suscitar diz respeito à introdução na lei do recenseamento de disposições que lhe são alheias e que visam atingir fins que são estranhos ao recenseamento eleitoral. Não faz sentido que passe a ser necessário exibir o cartão de eleitor para renovar o bilhete de identidade. As exigências quanto à renovação do bilhete de identidade é matéria a discutir em sede de legislação sobre a identificação civil; não é matéria que diga respeito ao recenseamento eleitoral.
Assim como não faz sentido proceder a interconexões com a base de dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) para detecção de irregularidades, quando os eleitores já são obrigados a apresentar documentação emanada do SEF para efeitos de recenseamento. Há aqui uma mais que duplicação de exigências. Um cidadão estrangeiro que possa e queira recensear-se tem de apresentar, primeiro, a autorização de residência, segundo, um documento passado pelo SEF que certifique o tempo mínimo de residência em Portugal, terceiro, uma declaração formal de onde conste a nacionalidade e o endereço no território nacional (a confirmar pela