29 DE JANEIRO DE 1999 1521
A matéria relativa à identificação civil rege-se, actualmente, por disposições dispersas, desactualizadas e com grandes lacunas de regulamentação. Decorre de dois decretos-leis de 1976, que foram objecto de múltiplas alterações nos seus mais de 20 anos de vigência
É, pois, premente a necessidade de reunir num único e actualizado instrumento legal toda a matéria respeitante à identificação civil. Esta necessidade já foi, aliás, sentida em 1991, o que levou esta Assembleia a aprovar a Lei n.º 12/91, de 21 de Maio, que, contudo, não chegou a entrar em vigor por nunca ter sido publicado o respectivo regulamento.
Esta necessidade mostra-se ainda mais imperiosa, porquanto as soluções consagradas na Lei n.º 12/91 se apresentam já, elas mesmas, desactualizadas, em consequência de alterações significativas ocorridas nos últimos 8 anos.
A diferente natureza e as finalidades específicas da identificação civil e da identificação criminal conduziram à extinção do Centro de Identificação Civil e Criminal, operada pelo Decreto-Lei n.º 148/93, de 3 de Maio, que separou os serviços de identificação civil e de identificação criminal - entregando os primeiros à Direcção-Geral dos Registos e do Notariado e os segundos à Direcção-Geral dos Serviços Judiciários -, pelo que, também em termos orgânicos, deixou de haver razão justificativa para a regulação conjunta destas matérias, adoptada pela Lei n.º 12/91.
E estando já aprovada e publicada, em 18 de Agosto, do ano transacto, a Lei n.º 57/98, relativa à identificação criminal, em vigor desde 1 de Janeiro do corrente ano, por virtude da publicação e entrada em vigor do respectivo regulamento (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 381/98, de 27 de Novembro), cremos ser tempo de estabelecer, também num único diploma, o quadro normativo regulador da identificação civil.
A presente proposta abrange toda esta matéria e apresenta a dupla vantagem de dispensar diploma regulamentar subsequente e de evitar os notórios inconvenientes de legislação dispersa, com o inevitável protelamento de soluções de futura regulamentação.
Nas alterações introduzidas sobressaem as relativas ao bilhete de identidade, com reflexos no seu conteúdo, formato e características.
Com efeito, as mudanças ocorridas nas últimas décadas e as exigências decorrentes da adesão de Portugal à Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, que - noto - cria um espaço de liberdade de circulação das pessoas, tornaram inadequado o sistema em vigor, exigindo que o, bilhete de identidade constitua um elemento de identificação seguro, quer em Portugal, quer em novos espaços abertos, como é o espaço Shengen, dotado de características que hoje são comuns à generalidade dos países da União Europeia.
Impõe-se, por conseguinte, obter para o documento uma segurança acrescida, de que carece, e eliminar os elementos identificativos que se revelam sem utilidade significativa.
Quanto à segurança física do bilhete de identidade, esta assenta, particularmente, na impossibilidade de substituição da fotografia, uma vez que esta será digitalizada e inserida no próprio documento, e na inserção da assinatura igualmente digitalizada. Quer a fotografia quer a assinatura ficarão registadas em base de dados multimedia, o que permitirá, na renovação do bilhete de identidade, comparação simples, imediata e fiável com a fotografa e assinatura constantes de bilhetes anteriormente emitidos ao mesmo titular, possibilidade que hoje não existe.
Por outro lado, no que respeita ao conteúdo do bilhete de identidade, elimina-se a impressão digital e a referência à filiação, ao estado civil e à altura do titular, sem prejuízo da inserção de tais menções - com excepção da altura - no impresso do pedido, elementos que ficarão inseridos na base de dados dos pedidos.
A eliminação destes elementos, que foi devidamente ponderada, restringe o conteúdo do bilhete de identidade ao necessário e suficiente para garantir a identificação da pessoa, isto é, a sua individualização e diferenciação relativamente às demais. Corresponde ao reconhecimento de que aqueles elementos de pouco ou nada servem no próprio documento, pois referem-se a dados acessórios, mutáveis e desnecessários à finalidade do bilhete de identidade. Note-se, aliás, que também não estão presentes na generalidade dos países da União Europeia. Acresce que a comparação dactiloscopia, necessária em caso de suspeita de falsificação, fica sempre garantida através da sua recolha no impresso do pedido de bilhete de identidade.
Sem prejuízo das garantias de segurança na emissão do documento de identificação, considerou-se oportuno introduzir normas que permitem a simplificação dos actuais procedimentos e formalidades, por forma a imprimir maior celeridade na obtenção do bilhete de identidade, das quais me permito destacar as seguintes.
As certidões de assentos de nascimento destinadas a instruir os pedidos de bilhete de identidade deixam de estar sujeitas a prazo quando respeitantes a menores de 16 anos e, nos restantes casos, o prazo de validade é aumentado de 6 para 12 meses, o que se justifica por os elementos de identificação que a certidão se destina a comprovar serem tendencialmente inalteráveis, e em relação às certidões respeitantes a menores de 16 anos por não haver lugar a recolha do estado civil na base de dados da identificação civil;
Admissibilidade de emissão de bilhete de identidade provisório, sem a menção de cidadão nacional, com a validade de um ano, quando a nacionalidade do requerente suscita dúvidas, permitindo-se, assim, que, em inúmeros casos de solicitação do bilhete de identidade de cidadão português, enquanto a situação é definida, o interessado seja portador de documento de identificação e não seja prejudicado na sua vida por, eventualmente, o não possuir;
Possibilidade de envio do bilhete de identidade ao respectivo titular por via postal e de remessa de certidões aos serviços de identificação civil por meio de telecópia, desde que o emitente seja um serviço público português.
A proposta inclui, finalmente, normas de protecção de dados pessoais, em harmonia com a Convenção n.º 108 do Conselho da Europa e com a Lei de Protecção de Dados Pessoais.
Quanto a este ponto, permito-me frisar a necessidade de proceder à actualização das remissões face à revogação da Lei n.º 10/91, de 29 de Abril, pela Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro, aprovada por esta Câmara já depois de apresentada esta proposta de lei.
A aprovação deste diploma permitirá, assim, atingir dois grandes objectivos: por um lado, uma actualização legislativa, com superação das lacunas manifestas actualmente existentes, nomeadamente no que se refere ao regime da base de dados de identificação civil, e a regulamentação unitária de toda esta matéria; por outro lado, uma efectiva modernização e simplificação dos procedimentos de emissão do bilhete de identidade, com manifestas vantagens de celeridade para o cidadão e um reforço inegável da segurança do bilhete de identidade.