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I SÉRIE-NÚMERO 46 1702

A verdade, também, é que nem os avanços científicos se encontram ao dispor das mulheres nos centros de saúde. A contracepção de emergência, aquela que, com elevada taxa de eficácia, evita o recurso ao aborto, não existe nos centros de saúde. Sendo um método contraceptivo, já disponível no mercado pela combinação de diversas pílulas, entendemos ser necessário organizar os centros de saúde por forma a que as mulheres possam recorrer àquele método em tempo útil, que lhes evitará, na maioria dos casos, a queda nos meandros do aborto clandestino, com todo o rol de indignidades em que se encontra bem colocada a indignidade do Estado.
Apesar das reservas colocadas no inquérito à fecundidade, dado o melindre sentido pelos inquiridos na resposta às questões colocadas, afirma-se no relatório preliminar que os valores obtidos relativamente ao número de abortos, apesar de eventualmente subavaliados, indicam que entre 10% a 40% das gravidezes ocorridas entre os 35 e os 44 anos terminaram em interrupção voluntária da gravidez. E depois dos 45 anos, em cada 100 gravidezes, quase 70 acabaram em aborto. Ainda segundo o referido inquérito, os ratio mais elevados são obtidos até aos 19 anos. Em cada 1000 gravidezes ocorridas entre os 15 e os 19 anos, cerca de 100 terminam em interrupção voluntária da gravidez.
E termina o relatório preliminar do inquérito: «Existindo gravidez, a IVG continua a constituir, no entanto, um último recurso, no caso de não se pretender ter o filho.».
Estas, com outras razões já sabidas e consabidas, determinam o PCP a apresentar, na próxima legislatura, o seu projecto de lei sobre a despenalização do aborto a pedido da mulher.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sendo o planeamento familiar um direito indissociável das várias vertentes dos direitos sexuais e reprodutivos, como atrás enunciei, importará deixar, de forma telegráfica, ainda que o Governo não esteja presente, algumas questões.
Como pode o Governo garantir aqueles direitos, quando se apresta para fazer aprovar um diploma que colocará as mulheres na situação de trabalhadoras a tempo parcial com salário reduzido, aumentando a taxa de feminização da pobreza? O direito à adopção de decisões em questões que têm a ver com a saúde reprodutiva não passará, assim, de um mero simulacro de direito.
Como pode o Governo garantir o direito à liberdade de decisão, se se apresta para aprovar um diploma segundo o qual será descontado nas férias o tempo utilizado nas consultas médicas para acompanhamento dos filhos e para acesso ao planeamento familiar?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP). - Muito bem!

A Oradora: - Como pode o Governo garantir este direito, se a maioria das mulheres portuguesas continua a ocupar a enorme faixa da população portuguesa - cerca de 80% - que se fica pelo ensino básico?
Como quer o Governo garantir a segurança sexual e reprodutiva, se, passados 4 anos - a acrescer aos 4 anos do Govérno do PSD, de 1991 a 1995 -, ainda não regulamentou a lei que estabelece uma protecção especial às mulheres vítimas de crimes violentos, que, tendo sido aprovada por unanimidade, surgiu, sem qualquer alteração, de um projecto de lei do PCP?

Quando pensa o Governo pôr em execução a lei que garante os alimentos devidos a menores, nascida de um projecto de lei do PCP?
Como pode o Governo garantir a igualdade entre mulheres e homens, se toda a sua política na área laborai assenta na mais feroz desregulamentação do trabalho?
Ou seja, e em conclusão, como pode o Governo garantir os direitos sociais e reprodutivos, se a sua política assenta na desresponsabilização do Estado relativamente às funções sociais?

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carmem Francisco.

A Sr.ª Carmem Francisco (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quase um ano volvido sobre a discussão nesta Assembleia dos projectos de lei do PCP e do PS sobre a interrupção voluntária da gravidez, e depois de um referendo cuja campanha pouco ou nada serviu para o esclarecimento da população, volta a Plenário o assunto do planeamento familiar.
O contexto actual em que se insere este debate é também o de uma discussão em torno da participação das mulheres na vida política, participação essa que não pode ser desligada de um conjunto de questões mais vastas, onde se insere, nomeadamente, a efectiva eliminação do todas as formas de discriminação baseadas no sexo. E a questão da educação sexual e do planeamento familiar não é, para Os Verdes, uma questão menor.
Dizia Ana Nunes de Almeida, por ocasião das últimas comemorações do Dia Internacional da Mulher, que «o planeamento familiar instala-se nos projectos conjugais ou individuais e encoraja relações de igualdade entre os sexos. Afecta, profundamente, os horizontes da construção das identidades femininas: a maternidade deixa de ser um destino biológico a cumprir e torna-se uma escolha - escolha de viver essa identidade (ser ou não ser mãe), escolha sobre o número de filhos e o calendário dos seus nascimentos; o casamento, a conjugalidade não implicam a procriação; a experiência da sexualidade não traz o risco da gravidez indesejada. Há umas décadas atrás, era dificil imaginar uma tão grande mudança em tão pouco tempo.».
A Plataforma de Acção da IV Conferência Mundial nas Nações Unidas sobre as Mulheres sublinha o fundamental papel para a igualdade que é jogado pela capacidade das mulheres de controlar todos os aspectos da sua própria fecundidade. Este é um direito de todas as mulheres do mundo. Mas, como no resto do mundo, factores existem, ainda hoje, em Portugal que impedem o cumprimento da universalidade deste direito.
Para esta Plataforma «a saúde reprodutiva é um estado de completo bem-estar fisico, mental e social, e não a mera ausência de doença ou enfermidade, em todos os aspectos relacionados com o sistema reprodutivo e com as suas funções e processos. Em consequência, a saúde reprodutiva implica a capacidade de desfrutar de uma vida sexual satisfatória e sem riscos, bem como a capacidade de procriar e a liberdade de decidir se, quando e com que espaçamento se deseja ter filhos. Nesta última condição está implícito o direito das mulheres e dos homens a serem informados e a terem acesso aos métodos de planeamento familiar da sua escolha que sejam seguros, eficazes, acessíveis e bem aceites, bem como a outros métodos para a regulação da fecundidade que não sejam ilegais;