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I SÉRIE-NÚMERO 49 1798

Espero, pois, que hoje nos responda às seguintes questões: quais são as vantagens para o Teatro Nacional de São Carlos e para a Orquestra Sinfónica Portuguesa desta nova orgânica? Como explicar um modelo redutor da rentabilidade cultural de instituições que, sendo únicas e muito onerosas, devem ser agilizadas e rentabilizadas ao máximo?
É que se V. Ex ª, Sr. Ministro, foi movido por um instinto destruidor de fundações públicas, era bom que nos dissesse agora e aqui se a sua substituição por «Conteúdos, S.A.» - em geral!... - resolve ou não o problema da cultura nacional.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Uma vez que não há pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas, Srs. Deputados: Este debate de urgência, proposto pelo CDS-PP, não sendo um acto de contrição, quer pelo silêncio que assumiu perante a extinção das orquestras sinfónicas da RDP e do Teatro Nacional de São Carlos, quer pelo silêncio que assumiu desde o início até ao término do processo de extinção, em 1992, da empresa pública que geria o Teatro Nacional de São Carlos, quer pelo silêncio que assumiu em face dos direitos fundamentais dos trabalhadores da empresa pública que foram gravemente preteridos, com a substituição dos respectivos contratos de trabalho por contratos precários, só pode ser um concerto sem instrumentos e sem músicos ou uma ópera sem cantores e sem cenários.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas, Srs. Deputados: É indiscutivelmente importante avaliar, nesta sede, se as opções de política cultural deste Governo, particularmente na área da música e da ópera, têm vindo a constituir as melhores respostas não só para a defesa e valorização do património existente como para o seu desenvolvimento.
É importante avaliar se os objectivos traçados resultaram do diálogo com os profissionais que a estas áreas estão ligados e do conhecimento das necessidades, das apetências e da formação dos públicos existentes e dos públicos a conquistar. E é fundamental que esta avaliação aconteça para que não seja possível afirmar-se hoje, como afirmou Alexandre Delgado, em Junho de 1992, a propósito da destruição de duas orquestras sinfónicas e de uma ópera, que o Estado «.conseguiu tornar-nos, em três anos, o mais imponente deserto sinfónico do continente europeu; o mais extraordinário fenómeno de autofagia cultural da segunda metade do século XX. A manter-se o ritmo actual de destruição de orquestras, e caso Lisboa e Porto não sejam dotadas, com urgência, de dois grandes aparelhos sinfónicos, os corredores do Metropolitano não serão suficientes para albergar tantas gerações de músicos desempregados.».
Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas, Srs. Deputados: A lei do lucro das indústrias de produção cultural tem-se sobreposto muitas vezes ao desenvolvimento e democratização da cultura.
O economicismo tem sido, frequentemente, o vector determinante das opções culturais.

Mecenatos e fundações, financiamentos indefinidos e agentes culturais votados ao ostracismo têm constituído estratégias destruidoras do nosso tecido artístico.
E foi com este cenário que o PSD encerrou a empresa pública que geria o Teatro Nacional de São Cárlos, transformando-a em fundação, despedindo os trabalhadores e sujeitando-os, posteriormente, a provas de avaliação, para, mais tarde, oferecer, a alguns, contratos a termo certo e algumas câmaras de vídeo que os vigiavam durante o trabalho e, a outros, o desemprego.
Convenhamos que é difícil uma melhor encenação operática. Seria cómica, se não fosse trágica. Trágica para o país e, particularmente, para todos aqueles que, transformados em peças do jogo económico, eram lançados no desemprego, depois de anos e anos de trabalho.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Foram muitos e muitos os músicos despedidos que se viram obrigados, em nome da sobrevivência, a tocar em bares e em restaurantes. E consta que alguns responsáveis por toda esta barbárie cultural lhes terão proposto que tocassem também em casamentos e baptizados.
Sr. Presidente, Sr.ªl Deputadas, Srs. Deputados: De tudo isto se lembram, ainda hoje, os trabalhadores que voltaram ao Teatro Nacional de São Carlos ou aqueles que se viram obrigados a iniciar outros trajectos profissionais. Porque nem sempre é curta a memória, também se lembram dos responsáveis, dos que ignoraram as suas expectativas, dos que, através de decretos e de comissões liquidatárias, do reinado do terror, das humilhações e das decisões autoritárias e unilaterais, marcaram o seu dia-a-dia.
Cronologicamente ultrapassada mas não branqueada esta página da história artística nacional, há que avaliar hoje os reflexos do restabelecimento do Teatro Nacional de São Carlos, segundo o Decreto-Lei n.º 88/98, «como organismo de direito público, ao qual é expressamente cometida uma missão de serviço público cultural no domínio da ópera e demais ramos de actividade lírica e músico-teatral, bem como no da actividade sinfónica e coral-sinfónica».
Definido o estatuto e os objectivos do Teatro Nacional de São Carlos, enuncia ainda o Decreto-Lei de Abril de 1998, que «O Teatro Nacional de São Carlos assume-se, deste modo, como instrumento privilegiado na prossecução dos objectivos de desenvolvimento artístico e cultural que constituem responsabilidade inalienável do Estado, em articulação com os demais organismos públicos de produção no sector das artes do espectáculo e com a rede pública de formação artística especializada.».
Mas, Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas e Srs. Deputados, era o mínimo que este Governo poderia fazer, depois da azáfama demissionista do Estado na formação dos valores culturais nacionais, depois da azáfama destruidora de estruturas estáveis de produção cultural, depois da azáfama de constituição de estruturas empresariais destinadas á colocar no mercado os produtos culturais mais vendáveis.
Publicado o decreto, definidas as unidades orgânicas que integram o Teatro Nacional de São Carlos, eis que surgem, com o apoio de algumas luzes da ribalta, desfocadas, é certo, os carrascos de outrora, clamando hoje por justiça, defendendo os direitos laborais e valorizando o património nacional existente.