2508 I SÉRIE - NÚMERO 68
Este Governo não reforma e, sobretudo, não prepara o futuro. Exibe e ocupa o poder, mas não o exerce. Tem um mandato para cumprir e um programa para realizar. Não honra o mandato que recebeu e, mais grave, não cumpre o Programa a que se obrigou.
Este Governo navega à vista, sem rumo, sem orientação estratégica e sem ideal. Não age, quando muito, reage, de forma pontual, casuística e quantas vezes contraditória. Cria ilusões no presente e compromete o futuro, hipotecando as próximas gerações.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.
O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados: Estão hoje em debate três propostas de lei distintas quanto à matéria mas com incidência no mundo laborai e, em particular, com importância no campo das relações de trabalho.
Na proposta de lei n.º 202/VII, sob a epígrafe «Define o regime jurídico do trabalho a tempo parcial e estabelece incentivos à sua dinamização», encontramos uma iniciativa legislativa com a qual o Governo se propõe regulamentar a prestação de trabalho a tempo parcial. E acrescenta o Governo que, com esta iniciativa, visa sobretudo melhorar o mercado do emprego e reduzir o desemprego, com a devida salvaguarda dos direitos dos trabalhadores.
Importa, desde já, manifestar que o PSD considera positivo incentivar o trabalho a tempo parcial, desde que voluntário e reversível e quando dai resulte a contratação de novos trabalhadores, o que deve ser enquadrado no âmbito das políticas de emprego. Nessas condições, entendemos até que ao trabalho a tempo parcial é conferido um desejável alcance de índole social.
Todavia, a proposta de lei apresentada baseia-se num tipo de aproximação totalmente decepcionante, na medida em que não aponta para o rompimento com o carácter residual que ainda é atribuído ao trabalho a tempo parcial e não explora o seu potencial de medida de política activa de emprego. Aliás, a proposta em questão, na versão que é apresentada, afigura-se mesmo algo desequilibrada e pouco ambiciosa, se analisada na óptica geral da legislação laborai e do mercado de emprego, enquanto expressão jurídica do posicionamento relativo do Estado face ao relacionamento entre empregadores e empregados e de regulação dos conflitos de interesses que nesse contexto se estabelecem.
Desequilibrada, porque não exprime uma preocupação em dignificar o trabalho a tempo parcial e conferir-lhe uma acentuada dimensão social, ao passo que, pelo contrário, é muito detalhada ao nível dos aspectos processuais e de regulamentação dos incentivos as empresas. Pouco ambiciosa, porque é praticamente omissa quanto ao papel que um adequado regime de dinamização do trabalho a tempo parcial poderia ter em domínios tão decisivos como, a título meramente exemplificativo, passo a enumerar: o acesso ao emprego dos desempregados mais idosos; o combate ao desemprego de longa duração; a conciliação entre a actividade e carreira profissional e a vida familiar, designadamente no acompanhamento dos filhos, de idosos ou de deficientes, em especial no que respeita às mulheres; o apoio à contratação, ainda que parcial, de quadros para pequenas e médias empresas; a conciliação entre a carreira profissional e valorização pessoal e profissional, designadamente por parte dos trabalhadores-estudantes.
Consideramos, isso sim, que será de assumir uma atitude positiva face ao trabalho a tempo parcial, afirmando o seu significado no combate ao desemprego e valorizando socialmente a opção por esta forma de emprego, não apenas por parte das empresas mas, sobretudo, por parte dos trabalhadores, desde que tal opção seja efectivamente voluntária e reversível, e isso não decorre da proposta de lei que está em apreciação.
Na verdade, a expressão máxima de um direito fundamental, como é o direito do trabalho, obriga o Estado e, por conseguinte, o Governo a executar políticas de pleno emprego e a promover a igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, nomeadamente, quanto ao acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais. Acresce que qualquer contrato de trabalho, figura típica que caracteriza uma relação laborai entre empregador e empregado, deve significar a sua natureza duradoura e acentuar uma vertente de estabilidade, aspectos determinantes para ambas as partes no que concerne aos objectivos e à necessária realização pessoal e profissional do trabalhador.
Ora, a proposta de lei que hoje nos é apresentada pelo Governo e aqui debatemos, para além de não significar qualquer mais-valia no campo da legislação laborai, vem, ao invés, propor um normativo indiciador de maior instabilidade no campo do trabalho, associada a uma maior precariedade nas relações contratuais de trabalho.
Vejamos: como consta da própria epígrafe, a proposta de lei procura estabelecer um conjunto de incentivos (ou, como hoje já foi aqui designado, de estímulos) à dinamização do trabalho a tempo parcial. Neste ponto, a concessão de incentivos fica delimitada ao facto de o número semanal de horas de trabalho a tempo parcial prestado pelo trabalhador não poder ser inferior a 20% nem superior a 75% da duração normal do trabalho a tempo completo. Donde, haverá sempre a tendência para celebrar contratos a tempo parcial que permitam a concessão de benefícios, o mesmo é dizer que o tempo de prestação de actividade não seja superior a 75%.
Por outro lado, e embora possa acarretar implicações na gestão de pessoal, a proposta de lei vem «empurrar» as entidades empregadoras para uma política de recursos humanos assente em horários de trabalho a tempo parcial, pois resulta evidente a possibilidade de os custos com o pessoal virem, desse modo, a diminuir de forma significativa. Neste particular, basta ter como exemplo o trabalhador que reduz o seu horário de trabalho em 50%, permitindo a admissão, a termo ou sem termo, de um ou dois outros, o que corresponde a uma concessão de benefícios pelas duas ou três novas situações laborais.
Mas se não perfilhamos tal situação, bem mais grave é aquilo que, de forma clara e inequívoca, estabelece a proposta de lei quanto aos incentivos à contratação de trabalhadores. É que, perante os incentivos que são criados para a admissão de novos trabalhadores a termo certo (e repito, a termo certo), as empresas estão, uma vez mais, a ser como que «empurradas» para aquilo a que chamaremos uma absoluta indispensabilidade de alterar os contratos de trabalho em vigor, no que respeita ao período de trabalho, como pressuposto objectivo de diminuir os custos com a rubrica «Pessoal». E isto é, efectivamente, grave. É muito grave!
Concretamente, é grave para as entidades empregadoras que se vêm forçadas a optar por uma política de pessoal