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3040 I SÉRIE - NÚMERO 84

desigualdade no acesso a saídas profissionais constituem um quadro propício à criação de dependência. A consagração dos papéis tradicionais dos sexos na família favorecem a violência e o facto de as mulheres não estarem representadas na justa proporção nas instituições políticas faz com que, ao nível das decisões tomadas, não se tenha suficientemente em conta toda esta problemática.
Tendo em conta esta interdependência, uma modificação fundamental não terá êxito senão no seguimento de medidas de harmonização e concertação de vários sectores da sociedade.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vários estudos apontam o espaço da casa/família como aquele onde as mulheres dizem ter sido mais vítimas de actos de violência. Contudo, sabe-se que não se trata de um fenómeno novo, sendo apenas nova a sua visibilidade como fenómeno, bem como novas são as valorizações de alguns actos que no passado eram tidos como fazendo parte do relacionamento dito "normal" entre homem e mulher e hoje, felizmente, são considerados como formas de violência. Gerou-se em tomo da violência familiar um muro de silêncio que só recentemente está a ser quebrado, a que não são, seguramente, alheias as conquistas feitas pelas mulheres ao nível da redefinição do seu papel e da sua nova integração social, passando a tomar maior consciência dos seus direitos e a exigi-los como exercício de cidadania.
É da mais elementar justiça uma saudação e uma palavra de apreço às organizações governamentais e não-govemamentais que têm desenvolvido actividades relevantes no atinente à discussão desta temática e ao apoio de mulheres vítimas de violência.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em estudo recente, de 1995, efectuado pela Universidade Nova de Lisboa e encomendado pela Comissão para a Igualdade dos Direitos das Mulheres, é traçado um quadro da situação da violência contra as mulheres algo preocupante. Este quadro assentou nas seguintes conclusões: as situações mais frequentes de violência correspondem a casos em que os autores são homens; quando as acções se fazem no espaço familiar, são sobretudo os maridos ou companheiros que as praticam; o espaço onde a violência física contra as mulheres é mais frequente é o da casa/família; é notória a falta de reacção das mulheres aos actos de que são vítimas, ou o remeterem-se a simples reacções passivas; são muito pouco frequentes os casos de reacção violenta e de reacções jurídico-penais. Acresce a estas conclusões o facto de mais de 50% das mulheres dizem ter sido alvo de, pelo menos, um acto de violência ou discriminação.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: No relatório apresentado pelo Ministério da Administração Interna no passado dia 8 de Março ressalta um número arrasador que a todos e a todas certamente atormenta: 2889 casos de violência doméstica teriam sido registados na GNR e PSP em, apenas, 4 meses - de Outubro de 1998 a Janeiro de 1999. O número fala por si e é, certamente, a ponta do iceberg. Neste universo, a percentagem de mulheres vítimas de violência é de 81%, sendo a dos homens de 19%. Este último número tornou-se perceptível a partir do momento em que os preconceitos sobre esta matéria se vão diluindo.
Ao apresentar a proposta de lei ora em discussão, o Governo instala mais uma pedra, de valor inquestionável, na edificação do sistema penal português como um sistema culturalmente adequado à realidade portuguesa. Este diploma procede à regulamentação do artigo 14.º da Lei n.º 61/91, de 13 de Agosto, garantindo às mulheres vítimas de violência doméstica o adiantamento por parte do Estado da indemnização devida pelo agressor.
Ainda que sejam os cidadãos do sexo feminino quem mais frequentemente são vítimas de maus tratos e de violência doméstica, optou-se, e muito bem, por um alargamento deste regime a todas as vítimas de violência conjugal, espelhando-se bem a matriz humanista e social que questões desta natureza merecem. O "edifício" dos direitos do Homem deverá estar fundado sobre a dignidade e os valores igualitários de todos os seres humanos.
Em termos de relevância, importa também salientar a previsão de que o Estado antecipe o pagamento devido à vítima, logo a partir da instauração do processo criminal. Esta antecipação revela-se de primordial importância, na medida em que visa conceder à vítima, que na maioria dos casos é a mulher, um apoio económico que contribua para que esta possa sair da situação de dependência relativamente ao agressor.
Por outro lado, a circunstância de ser pressuposto da concessão da indemnização a instauração de um processo criminal constitui um incentivo para que as situações de violência conjugal sejam efectivamente denunciadas, o que, infelizmente, não acontece na maioria dos casos, devido à relação próxima existente entre a vítima e o agressor.
Vale a pena destacar que este diploma articula-se com uma nova redacção do n.º 2 do artigo 152.º do Código Penal, no qual, perante o crime de maus tratos ao cônjuge, se permite ao Ministério Público instaurar o respectivo procedimento criminal, desde que não haja oposição do ofendido.
Certamente, estes são exemplos do adequado caminho a seguir, embora saibamos quanto ele é longo e espinhoso.
Uma concepção aberta de família, que permita que cada um dos seus membros seja responsabilizado perante os outros pela violação de deveres de relação que regem os valores correspondentes aos direitos humanos fundamentais, é o caminho a percorrer. A defesa da família comporta a protecção de todos os seus membros, homens, mulheres, crianças e idosos, contra toda a forma de violência. Cumpre, por isso, tomar efectivas as medidas que permitam reafirmar a família como espaço de dignificação da pessoa e negar, um dia, a verdade da afirmação segundo a qual "a casa é um dos lugares mais perigosos das sociedades modernas".
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Permita-se-me nesta Câmara, como mulher, como mãe e como educadora, congratular-me com o facto de, quer o Governo, quer a oposição, estarem de forma decidida a levantar o véu e o anel silenciador que durante anos caracterizou as relações familiares em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A proposta de lei é um passo positivo na regulamentação de uma lei que é já de