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1205 | I Série - Número 30 | 15 de Dezembro de 2000

 

permite, porventura, uma análise mais aprofundada e uma discussão mais aberta, mais serena, mais franca e, seguramente, mais interessante.
Passo, então, àquilo que vos quero dizer, deixando agora de fora o conjunto de temas, embora relevantes, que foram tratados em Nice, como sejam os avanços nas questões económicas e sociais que se seguiram à Cimeira de Lisboa, a proclamação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, a Agenda Social Europeia, os problemas do emprego e da sociedade da informação, bem como os progressos registados no domínio do estabelecimento de uma política comum de segurança e de defesa.
Também não vou referir tópicos extremamente importantes, em especial para Portugal, como o facto de termos conseguido que não haja penalização para o nosso país, em matéria de quotas leiteiras, durante quatro anos, retroactivos a 1999, descontando à produção nacional o autoconsumo dos Açores, ou o igualmente importante tema das medidas tomadas em relação aos pescadores, no caso de continuar o impasse nas negociações com Marrocos até ao fim do ano
Pondo tudo isto de parte, penso que vale a pena concentrarmos o essencial do nosso debate sobre a Conferência Intergovernamental e, através dela, sobre o que se perspectiva em relação ao futuro da Europa.
Quero falar-vos aqui com toda a abertura. Devo dizer-vos que encarei com a maior preocupação esta Cimeira de Nice e que não tenho dúvidas de que a negociação da Conferência Intergovernamental foi a mais difícil e complexa em que Portugal se envolveu, nos últimos anos, no âmbito europeu.
A primeira preocupação é a de que todos nós vimos sentindo, desde o final da «guerra fria», uma tendência para o recrudescimento dos egoísmos nacionais. Esta tendência é algo que nos compete combater, com a maior energia.
Numa União em que há países de dimensão variável e em que Portugal tem a dimensão e o peso económico que tem, uma lógica de afirmação dos egoísmos nacionais é sempre contrária aos interesses de Portugal no seio da União Europeia.
Por isso, a primeira preocupação fundamental da nossa estratégia, para Nice e pós-Nice, é a de combater a tendência de afirmação de egoísmos nacionais e, dentro de cada país, as lógicas de populismo nacionalista, de xenofobia, de racismo e de outras tendências irracionais que tendem a afirmar-se de novo nas sociedades ocidentais.
Mas, neste pano de fundo, o que estava em jogo nesta Conferência Intergovernamental era uma de duas possibilidades. A primeira possibilidade correspondia a uma perversão do que é hoje o funcionamento da União Europeia. Uma mudança qualitativa real no funcionamento da União Europeia seguramente não se traduziria por mais Europa, mas, necessariamente, por menos Portugal, dentro da Europa. E essa mudança, que foi esboçada, apresentada, defendida por muitos no quadro europeu, durante muito tempo, tinha três pilares essenciais.
Por um lado, um enfraquecimento da Comissão, dando mais poderes ao Conselho Europeu e reduzindo ao máximo o papel da Comissão para, no limite, a transformar numa espécie de secretariado do Conselho, sendo a Comissão, como sabemos, com o seu poder específico de iniciativa, a garante dos Tratados e um órgão essencial da coesão da União e do carácter europeu da mesma. O segundo aspecto era a redução da Comissão a uma dimensão tal que muitos países poderiam ficar, desde já, sem representação na mesma. O terceiro aspecto era uma reponderação de votos a favor dos países de maior dimensão, que tornava a capacidade de intervenção de países como Portugal no processo decisório praticamente inexistente.
Era a lógica da intergovernamentalização da União Europeia numa perspectiva de directório das grandes potências. E foi esta lógica que Portugal procurou afrontar desde o primeiro momento, desde o tempo em que, com a presidência da União Europeia, preparámos grande parte do debate da Conferência Intergovernamental, balizando, no sentido de limitar o caminho àqueles que procuravam encaminhar a União nessa direcção e, depois, em todo o processo negocial que se seguiu.
Quero dizer que é para mim, como Primeiro-Ministro, particularmente gratificante ter verificado que o Parlamento português esteve atento a este risco, tomou posições, e que os partidos da oposição tiveram um papel útil no sentido de criar uma dinâmica que nos ajudasse a inverter esta lógica na preparação das decisões que conduziram ao Tratado de Nice. Para nós, era essencial que de Nice saísse «mais Europa e mais Portugal dentro da Europa» e não, eventualmente até, «menos Europa e menos Portugal dentro da Europa», como se chegava a esboçar no projecto de muitos.
Temos de ser realistas na análise do que foi conseguido. Em Nice, não se alcançou muito mais Europa. Em Nice, não se avançou muito no aprofundamento da União Europeia. Avançou-se, no entanto, alguma coisa de importante.
Sou dos que defendem que, numa União Europeia que vai alargar-se, que vai ter 27 membros, ou talvez mais, com carácter muito heterogéneo, é vital, para Portugal, que possa haver um núcleo duro de aprofundamento da União Europeia, desde que Portugal o integre permanentemente e em todas as suas direcções e valências. Por isso, batemo-nos, durante a nossa presidência, por incluir, dentro da agenda da Conferência Intergovernamental, as cooperações reforçadas. Congratulamo-nos, pois, pelo facto de elas terem sido aprovadas, e nos termos em que o foram: no respeito dos tratados, do papel da Comissão, com a garantia de não discriminação e com todas as possibilidades para que Portugal possa estar presente em todas elas, no futuro, como é, em meu entender, essencial para a defesa dos interesses vitais do nosso País.
Em segundo lugar, há um pouco mais Europa, embora bastante menos do que muitos desejariam, naquilo que tem a ver com as decisões tomadas por maioria qualificada no Conselho. De facto, é limitado o progresso feito nesse domínio e, porventura, nalguns aspectos, alguns poderão considerar que isso até é bom para Portugal.
Houve uma área em que tivemos uma preocupação fundamental: a coesão. Nessa área, a passagem à maioria qualificada só será feita depois de aprovadas as perspectivas financeiras a partir de 2007, ou seja, só terá efeitos, na prática, a partir de 2013/2014.
Fizeram-se alguns progressos, mas não houve, nesta matéria, uma alteração qualitativa no funcionamento da União.
Por isso, as questões que decisivamente marcaram a Cimeira de Nice tiveram a ver com a estrutura de poder dentro da União. Nesta matéria, quero dizer-vos que a primeira forma de marcar uma presença de mais Portugal na Europa foi através do protagonismo que procurámos imprimir, no sentido de liderar a garantia da defesa de inte