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2311 | I Série - Número 58 | 10 De Março De 2001

«acorrentado» à escola de violência que a televisão é, e que muito mais será no dia em que o tal dinheiro sujo tiver acesso ao seu domínio.
Sabemos isto ou estamos a dormir? Sabemos ou não que debalde combateremos com êxito a violência sem combatermos o modelo económico, social e particularmente televisivo que a determina? Sabemos ou não que não é a discretear doutamente sobre modelos policiais e prisionais, ou com argúcias jurídicas e judiciárias que venceremos o inimigo de dentro em que a moderna criminalidade se transformou? Sabemos ou não que a TV, o cinema, a música moderna, e sobretudo a rua, em certa medida são um hino à violência e eficacíssimas escolas da sua aprendizagem?
Sabemos ou não que, como já alguém afirmou, «após 24 imagens de cenas violentas, a 25.ª será real»? Sabemos ou não que a liberdade de ter fome não é liberdade? Que competir sem regras não é igualdade? E que o amor do próximo perdeu a chave do inferno em que as cidades modernas se transformaram? Sabemos ou não que a violência não é uma fatalidade, e que as suas causas próximas e remotas podem e devem ser combatidas?
Se sabemos, como explicar a quase resignação dos responsáveis políticos de todo o Mundo? Acaso se deixaram conquistar pela resposta única dos Estados Unidos da América, com a sua «tolerância zero», os seus quase 2 milhões de encarcerados, e os seus cerca de 3000 mortos adiados do «açougue» que dá pelo nome de «corredor da morte»?
Creio não exagerar. Mesmo agora, face a essa primeira tentativa de criação de uma jurisdição supranacional de «combate aos crimes mais graves que afectam a humanidade», que é o Tribunal Penal Internacional, países que se reclamam da liderança do Mundo globalizado de hoje, e da defesa dos Direitos do Homem, empenharam-se em que ficassem de fora da sua jurisdição os crimes contra os tráficos ilícitos: de drogas, de armas, de empregos, etc.
Pergunto-me porquê. E só encontro uma explicação revoltante: apesar de ilícitos, esses tráficos são «negócio». E a contemplação do espírito de lucro que a eles preside, e os jogos de interesses a eles ligados, são mais fortes do que o imperativo da sua eficaz repressão.
Por outra ordem de razões - aliás, inversa! -, não faltam na opinião pública dos países que assinaram o tratado que cria aquele Tribunal, e cuidam agora da sua ratificação, responsáveis políticos que, concordando embora com a necessidade dele, lhe opõem a reserva principológica de que prevê, entre as penas a aplicar por ele, a pena de prisão perpétua. Pena essa que todos os países da União Europeia actualmente admitem, menos Portugal e Espanha, sendo que esta admite cúmulos de penas que não raro ultrapassam os 100 anos! Estas penas, é claro, não são perpétuas! Os limites da esperança de vida encarregam-se de aliviar a consciência dos que as defendem.
De algum modo inversamente, o tratado que institui o Tribunal Penal Internacional obriga à revisão da pena perpétua, quando aplicada, decorridos que sejam 25 anos. Não, decerto, para aumentar a sua duração efectiva! Ainda se não inventou um tribunal que tenha jurisdição penal para lá do fim da vida!
Por vezes, temos de optar entre valores que não conseguimos conciliar. Eu também abomino a prisão perpétua. Quase tanto como a pena de morte! Acho-a desumana e inútil. Mas, colocado entre aprovar o tratado com ela - já que não admite reservas - e aceitar que o meu País fique de fora do tratado, a beneficiar do combate de outros a crimes que também nos afectam, não sou capaz de resistir ao impulso de privilegiar esse combate. Trata-se de travar um inimigo que, se puder completar o processo em marcha do seu triunfo, saltará, não apenas sobre a proibição da pena perpétua, como sobre todos os princípios e valores da minha civilização. Assim sendo, porque o pouparei em nome deles?
Creio, Sr. Presidente, que este tópico ilustra bem a justificação da esperança reforçada que depositamos na jornada presidencial que hoje começa.
A prática das presidências abertas, em visita ao nosso País, que se revelou um êxito político e democrático, pode agora ter, em alguma medida, de ceder a vez à prática das presidências abertas à auscultação do futuro.
Faço questão em que Vossa Excelência aceite estas observações como homenagem de quem o considera à altura de todos os desafios. Temos todos - Presidente, Assembleia, Governo, Tribunais e sociedade civil - de nos empenhar, mais do que nunca, na gestão das mudanças que são ou se revelem necessárias. Temos de fazer essa gestão de forma integrada, nomeadamente estimulando e institucionalizando modelos de participação dos cidadãos que substituam os movimentos sociais espontâneos que cada vez mais irrompem pelas frinchas de proibições desactualizadas e inúteis. É difícil - todos o sabemos - governar em regime de livre opinião. Mas é ainda mais difícil governar tentando reprimir essa liberdade. Por agora, os governos enfrentam apenas as exigências da sua própria sociedade civil. Mas não demora que tenham de enfrentar as exigências da sociedade civil global que desponta. O debate político não pode continuar a ser, ou quase, um monopólio dos média. Devem nele participar, nomeadamente, os críticos da classe política. Os que presumem uma autoridade que talvez não tenham. Criticar é fácil. Maldizer facílimo. Decidir não tanto. Devem também ser convocados os cientistas, para ajudarem a resolver os problemas económicos, sociais e políticos que involuntariamente criam. Não basta que descubram como se divide o átomo ou se decifra o código genético. Têm de nos ajudar também a alimentar a população, a combater a insegurança e o desemprego, e a controlar a agressividade. Não basta inventar a televisão, a Internet, a telemática, a microelectrónica, a robótica e outras maravilhas fatais da nossa idade. Têm de nos leccionar sobre as transformações e adaptações económicas, sociais, culturais e políticas que essa «revolução» exige, para que a terra continue rodando, connosco à superfície dela. Sem isso, a opinião pública continuará a ser injusta, quando não cruel, para os responsáveis políticos. Escolhe-os e depois abandona-os. Põe-os no pedestal e depois derruba-os. Quer participar, influir, até onde possível decidir? Os políticos conscientes e não desatentos não desejam outra coisa! Faça-se então esse pacto! Ainda vamos a tempo. O pior - já se disse - também não é seguro.
Ex.mas Autoridades e Srs. Convidados, os meus sinceros agradecimentos por terdes aceitado testemunhar e abrilhantar esta cerimónia tão rica de significado.
Sr. Cardeal-Patriarca, Eminência, é uma honra muito especial para a Assembleia da República podermos ter Vossa Eminência connosco no acto solene da posse de Sua Excelência o Presidente da República.
Sr. Presidente da República, Excelência, hoje é, para esta Assembleia, e para o universo dos eleitores que representa, um dia jubiloso. E, no entanto, ensombrado pela tragé