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2449 | I Série - Número 044 | 29 de Janeiro de 2004

 

"A verdade é que, por razões que têm muito que ver com a burocracia dos Estados Unidos, acordámos numa questão em que toda a gente pudesse concordar, que foi a das armas de destruição maciça como razão central." Dias depois, Wolfowitz completaria o seu raciocínio: "Vejamos as coisas com simplicidade. A diferença mais importante entre a Coreia do Norte e o Iraque é que, economicamente, nós não tínhamos qualquer escolha no Iraque. O país nada num mar de petróleo."
As coisas pioram um bocado para os defensores da guerra quando uma das suas mentiras de maior impacto público implode a partir de informações vindas de dentro da própria diplomacia da coligação e dos seus serviços secretos. Refiro-me à história do programa nuclear iraquiano, um emaranhado de fraudes sobre o qual o Director da CIA, George Tenet, colocou a sua assinatura, ao aprovar o relatório da National Intelligence Estimate, elaborado pelos serviços secretos norte-americanos, em Outubro de 2002. Nele se referem as famosas aquisições iraquianas de urânio na Nigéria e a fabricação de programas e de software. Para a fabricação desse relatório, foi preciso passar por cima das informações compiladas pelo antigo embaixador Joseph Wilson, enviado à Nigéria pelo governo norte-americano. No seu regresso, Wilson garantia que tudo não passava de uma fraude. Mas a história, essa história, sobreviveu! Aliás, a única consequência das informações de Wilson foi que, sempre que se referiu ao suposto programa nuclear iraquiano, Bush tomou a precaução de remeter para a Grã-Bretanha a origem das alegações: "O governo britânico teve informações de que Saddam Hussein tentou comprar recentemente grandes quantidades de urânio em África"; as declarações de Colin Powell, Condoleezza Rice ou Donald Rumsfeld inundaram os meios de comunicação social, anunciando o perigo do armagedão nuclear a partir de Bagdade.
Em Março de 2003, nas vésperas da invasão, a Agência Internacional de Energia Atómica declarava que os documentos eram forjados, mas nada disso serviu para refrear os ânimos belicistas.
David Kay, conselheiro da CIA no cartão de visita, chegou a Bagdade no início da ocupação, chefiando o Grupo de Pesquisa no Iraque - cerca de 1200 agentes que se dedicaram durante meses à busca de armas de destruição massiva. Antigo inspector da ONU, presente no Iraque logo após a primeira guerra do Golfo, Kay estava mesmo empenhado em encontrar qualquer coisa. Antes da invasão, destacou-se como comentador televisivo pelas suas categóricas análises sobre os arsenais iraquianos. Menos conhecido é o seu percurso no mundo dos negócios. Até Outubro de 2002, Kay foi vice-presidente da SAIC (Science Applications Internacional Corporation), uma prestadora de serviços ao Governo norte-americano nas áreas da defesa e segurança. A guerra do Iraque foi uma oportunidade de negócios para a SAIC. Depois da invasão, recebeu a concessão de A Voz do Novo Iraque, a estação de rádio instalada pelos americanos em Umm Qasr, a 15 de Abril. A escolha não espanta: um mês antes do ataque a Bagdade, outro vice-presidente da SAIC, Christopher Henry, "saltava" para adjunto do Subsecretário da Defesa, Paul Wolfowitz. Mas já bem antes da guerra David Kay fazia do Iraque o seu assunto: a SAIC era a entidade empregadora oficial de um bom lote de exilados iraquianos, sustentados por Washington durante anos para apoiar a formação de um governo "tecnocrático" pós-Saddam.
Ora, neste elenco de "oposicionistas", o Conselho para a Reconstrução e Desenvolvimento do Iraque, estão alguns dos mais exemplares inventores de justificações para a guerra, as famosas fontes iraquianas dos serviços secretos do Pentágono. É caso de Khidhir Haamza, um cientista nuclear que fugiu em 1994 com a ajuda do partido de Ahmed Chalabi, exilando-se em Washington e tornando-se no principal propagandista do suposto programa nuclear iraquiano.
Consumidos nove meses de buscas e um orçamento de 600 milhões de dólares, David Kay, o fazedor de gambuzinos, anunciava o seu abandono do Iraque: "Não acredito que existissem armas de destruição massiva no Iraque (…) Do que se falava era de arsenais armazenados, produzidos depois da anterior guerra do Golfo, e não acredito que houvesse sequer um programa de produção em larga escala nos anos 90." É uma citação de David Kay. Mas ele disse, ainda: "Esta administração empolou as informações que nos meteram no Iraque. O presidente ainda não admitiu, no discurso do Estado da União, que não há armas destruição massiva". David Kay sabe bem do que fala, mas podia ter dito mais.
Ainda agora, Collin Powell veio, ambiguamente, admitir que era falsa a posição da possibilidade de existirem armas de destruição massiva no Iraque!
O que faltava dizer disse-o Paul O'Neill. Nos mesmos dias de Janeiro, o antigo secretário do Tesouro de George Bush confirmava que o Presidente tomou posse com a firme intenção de invadir o Iraque. Em Janeiro e Fevereiro de 2001, nas primeiras reuniões do Conselho de Segurança Nacional, Bush pediu aos seus conselheiros para encontrarem um pretexto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, termino, dizendo que a mentira acabou. A fraude