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3921 | I Série - Número 072 | 02 de Abril de 2004

 

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, disse que o combate ao terrorismo unia todos nesta Câmara, mas, como é habitual, o CDS-PP mais excessivo entendeu descortinar alguma ambiguidade do Bloco de Esquerda no combate ao terrorismo.
Devo dizer-lhe, para que sobre isso não fique qualquer sombra de dúvida, que o BE condena inequivocamente o terrorismo. Conheci de perto, coisa que não sei se alguém da bancada do CDS-PP conheceu, a morte, por atentado à bomba, de três amigos e camaradas desde 1976, e por isso não tenho qualquer ambiguidade no combate ao terrorismo, venha ele de onde vier.
Mas, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, o debate é mesmo sobre o cinismo em política externa. Aquilo que depreendemos é que o Governo não tem princípios mas, sim, conveniências, e são essas conveniências do Governo que estamos aqui a discutir. Reparamos que, primeiro, o Sr. Primeiro-Ministro e, agora, a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros nada nos disseram sobre a pergunta tão simples do contrato militar com a Arábia Saudita. Mas essa é uma conveniência, não é um princípio! Isso é que é o verdadeiro retrato do cinismo político internacional!
Dou-lhe ainda um outro exemplo: a Sr.ª Ministra falou, na sua intervenção, sobre a Líbia. Ora a Líbia, que tinha decidido, há mais de nove meses, propor a ida de inspectores da Agência Internacional de Energia Atómica para as fiscalizações, decidiu, por razões económicas, "reingressar" na comunidade internacional e o que gostaríamos de saber, se é que a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros pode esclarecer-nos, porque já o seu antecessor não esclareceu, era o que foi o então Sr. Ministro fazer à Líbia neste transcurso…
Como foi público e notório - saiu nas primeiras páginas dos jornais -, reuniu com o Sr. Coronel Kadafi e, uns meses depois, há sinais de incentivo do Reino Unido e dos Estados Unidos em relação ao regime da Líbia, que não se preza de ser uma democracia e que continua assumidamente responsável pelo atentado terrorista de Lockerby.
Tudo isso foi rapidamente esquecido - lá estão as tais conveniências e não os princípios… A troco de quê? A troco de um acordo para a Shell, que foi celebrado no dia seguinte ao do encontro do Primeiro-Ministro português com o Primeiro-Ministro britânico, Tony Blair, em Tripoli! E diz-nos o insuspeito ministro de Tony Blair Michael Mitchor, em artigo recente no The Guardian, que os contratos celebrados no exacto de dia em que houve o aperto de mão entre Tony Blair e Kadafi valem centenas de milhões de libras para a Shell.
Portanto, a pergunta não é ofensiva e é óbvia: o que é que o seu antecessor foi fazer à Líbia, que mensagem levava ele do nosso Governo e sobre o quê? Ou foi "carteiro de terceiros"?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Esta outra pergunta, sem ofensa, é também óbvia: será que o Governo português também está a trabalhar para a Shell? Por princípios ou por conveniências?...

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, no passado mês de Março, um Subsecretário de Estado norte-americano, de nome John Bolton, anunciou, em Lisboa, que Portugal vai organizar uma reunião com países africanos para discutir o seu envolvimento na luta contra a proliferação de armas de destruição massiva. Sublinho que este Subsecretário de Estado norte-americano não anunciou qualquer iniciativa norte-americana mas, sim, uma iniciativa do Governo português proposta, segundo foi noticiado pela comunicação social, numa reunião realizada precisamente em Portugal contra a proliferação.
Esta notícia confronta-nos com o facto insólito de uma iniciativa portuguesa ser anunciada, em Portugal, por um responsável pela Administração norte-americana. É, no mínimo, insólito!!
Chamamos a atenção para a própria iniciativa e para o facto de não ter sido dada qualquer informação, nem a esta Assembleia nem ao País, sobre que iniciativa é, afinal, esta.
Pelas notícias vindas a público, sabemos que não é uma iniciativa tomada no âmbito da NATO, mas que envolve apenas 14 países; sabemos também que não decorre ao abrigo de qualquer tratado internacional que tenha sido celebrado por Portugal, porque, nesse caso, a Assembleia da República teria sido chamada a aprovar para ratificação esse tratado internacional; e sabemos ainda que o Sr. Ministro da Defesa, questionado pelo PCP na Comissão Parlamentar de Defesa Nacional sobre que iniciativa era esta, também disse nada saber dado que esta iniciativa decorria apenas a nível diplomático e sob a tutela do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Portanto, não sabemos que iniciativa é esta, nem para dizer bem nem para dizer mal. A iniciativa poderá ter os seus méritos, que ignoramos.