14 | I Série - Número: 071 | 13 de Abril de 2007
O Sr. Presidente: — Está autorizada a não concluir no tempo regimental, Sr.ª Deputada.
A Oradora: — Mas chegou a altura — e tenho isto aqui escrito — de pôr termo a esta intervenção e, consequentemente, a uma actividade política, que não de profissão, de mais de 26 anos. Já sinto, por sobre o meu ombro, o olhar vigilante do Sr. Presidente,…
Risos.
… sempre atento aos papéis que daqui vamos desfolhando ou ao improviso que se desenrola construindo uma frase, sempre «a última frase à Saramago» — como dizia, com uma fina ironia, o Presidente Dr. Almeida Santos —, ou sempre uma última frase, que ficava por vezes suspensa e entupida na garganta pelo rigoroso cumprimento dos acordos regimentais por parte do Presidente Mota Amaral.
Se vou ter saudades deste trabalho, Sr. Deputado Manuel Alegre, mesmo dos violentos debates em que me vi envolvida não raras vezes? As áreas que ocuparam a minha actividade — os direitos das mulheres, ainda há pouco referidos, os direitos dos trabalhadores e a justiça — são aquelas que suscitam debates apaixonados e acesos. É claro que vou sentir saudades, sobretudo da aprendizagem que iniciei no já remoto mês de Novembro de 1980!! E não hei-de chorar a pensar na minha juventude nessa época!
Risos.
Mas tenho também saudades do futuro, para usar uma expressão de um cientista, que foi levada para a poesia por José Gomes Ferreira e divulgada na música de Os Trovante e na voz de Luís Represas. As saudades do futuro nascem da necessidade de transformar o mundo e na antevisão desse mundo futuro a partir das realidades que conhecemos, das utopias de hoje, que serão as realidades de amanhã.
E seria bem pobre a intervenção humana nessa transformação, se ela se limitasse à política institucional.
Um vastíssimo rio de intervenção política corre lá fora, nas horas empolgadas de vitórias, como aconteceu na luta pela despenalização do aborto, mas também nas horas amargas, que, como disse António Aleixo, nos dão lições de filosofia. Melhor do que eu também o diria o nosso poeta que levou a canção para a praça…! Por isso, esta é uma despedida que o não é; é um até sempre, mesmo que em barricadas opostas, e estaremos em barricadas opostas, com certeza.
Permitam-me que, agora sim, a terminar, me dirija de uma forma especial ao meu grupo parlamentar, ao meu partido, a quem devo os meus mandatos e a aprendizagem de mais de 26 anos: até amanhã, Camaradas!!
Aplausos gerais, de pé.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, sendo hoje a sua última intervenção neste Plenário, não podia V. Ex.ª ter deixado de falar, como falou, na sua causa de sempre, que foi a causa da justiça. Deixe-me lembrar-lhe, e a todos também, que, quando aqui cheguei em 1999, muitos anos depois da Sr.ª Deputada, fui logo para a 1.ª Comissão, onde travei com V. Ex.ª dezenas e dezenas de debates acalorados. Mas não apenas na 1.ª Comissão — a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias —, também neste Plenário, por esse País fora, nos meios de comunicação social e noutros fóruns travámos muitos e muitos debates.
Há — permitam-me que o diga — três características essenciais que quero referir neste momento, características que demonstram e definem a estrutura e a sensibilidade de V. Ex.ª A primeira característica é a de uma verdadeira juventude irreverente. V. Ex.ª, ao contrário do que disse, não era jovem em 1980, quando aqui chegou, ainda é jovem, tem uma verdadeira juventude irreverente e vai continuar a tê-la.
A segunda característica, que não posso deixar de salientar, é o seu permanente inconformismo contra tudo aquilo com que V. Ex.ª não concorda. A Sr.ª Deputada Odete Santos habituou esta Câmara e o País a ser inconformada, lutando sempre contra aquilo em que não acredita, com todos aqueles argumentos que a sua raça lhe dá sistematicamente.
Por último, a terceira característica: deixe-me dizer-lhe, ainda que em bancadas bem opostas, V. Ex.ª foi sempre de uma franqueza e de uma lealdade políticas que têm de ser salientadas e manteve sempre todos os debates com muita elevação.
A imagem que V. Ex.ª deixa hoje aqui, Sr.ª Deputada Odete Santos, é uma imagem de grande fronta-